Qual a escola mais antiga de Belo Horizonte? A resposta para esta pergunta depende do tipo de escola que procuramos. Por exemplo, se falarmos da primeira a ser instalada na cidade, a resposta é simples: o Colégio Santa Maria, instituto particular fundado em 1903 e vinculado à Arquidiocese de Belo Horizonte.
Mas se depender do ano de fundação, podemos ter como resposta a Escola Estadual Milton Campos – também conhecida como Estadual Central – que, apesar de ter sido transferida para Belo Horizonte apenas em 1956, foi fundada em 1854 (mas em Ouro Preto, na Região Central de Minas Gerais).
E não para por aí, porque se falarmos de grupo escolar – modelo de educação que marca o início da República e o rompimento com o passado educacional herdado pela Monarquia no Brasil –, o primeiro de BH foi fundado em 1906 e foi chamado de Primeiro Grupo Escolar, mas mudou de nome e veio a se tornar a Escola Estadual Barão do Rio Branco.
Ainda fica mais complexo se tratarmos de escolas de administração municipal, afinal a primeira da capital mineira – chamada, na época, de Ginásio Municipal de Belo Horizonte – só foi fundada em 1948. Essa, ainda, foi a primeira a oferecer o Ginásio (atual Ensino Fundamental 2) de forma gratuita na capital, porque mesmo as escolas estaduais cobravam mensalidade.
Educação para as elites
A questão é que praticamente todas as primeiras escolas de Belo Horizonte eram destinadas à elite, já que até o Ginásio Municipal tinha provas de seleção e pouquíssimos alunos se formavam.
Em seu livro “Colégio Municipal”, José Alberto Barreto conta que, no primeiro ano de funcionamento, o então Ginásio Municipal de Belo Horizonte aceitou matrículas para todas as quatro séries do ginásio, totalizando 370 alunos. Dos 17 alunos da 4ª série ginasial do turno da noite, apenas 13 chegaram às provas finais, e houve somente três aprovações, das quais apenas um aluno passou direto, sem recuperação.
“O curso funcionou por um tempo com um grande número de alunos de condições social e econômica muito modestas e que tinham dificuldade, inclusive, na obtenção de material escolar, alimentação e vestuário. Por isso, o aproveitamento escolar foi baixo e com muitas reprovações”, explica o diretor da Escola Municipal Belo Horizonte, Daniel Pinheiro Chagas.
No Primeiro Grupo Escolar não era muito diferente. Apesar de ter sido pensado no início da República, quando se discutia a possibilidade de ensino público e aberto – e quando Belo Horizonte começava a receber trabalhadores para construir a cidade e vinham com seus filhos em idade escolar –, ainda era difícil se tornar um estudante.
“Antigamente, tinha um processo seletivo para ingressar, então mesmo sendo público, aquele estudante que não tivesse tanta facilidade, não conseguia estudar nessas escolas, apenas pessoas que ainda tinham uma condição financeira melhor”, conta Valéria Medeiros Severo, diretora da Escola Estadual Barão do Rio Branco.
Educação para todos
Somente em 1988, com a Constituição Federal, foram estabelecidas bases para uma educação de qualidade para todos. E somente com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), posteriormente substituído pelo Fundeb, foram criadas as condições iniciais para garantir o acesso a esse direito.
“Daquela primeira escola para hoje, a Educação evoluiu muito, mas sabemos que ainda tem muito a melhorar. A gente visa uma educação pública de qualidade. Escutamos muito que escolas públicas fazem o trabalho de qualquer jeito, mas a gente entende que, justamente por ser público, temos que oferecer algo melhor”, declara Valéria.
“O acesso gratuito à Educação é sensacional. Minha trajetória acadêmica, desde os anos iniciais do Ensino Fundamental até o Mestrado, se deu por meio da educação pública. Se eu tivesse que pagar a escola, não teria condições; se tivesse que pagar a faculdade, não teria concluído o Ensino Superior, talvez nem começado”, acrescenta Daniel.
“Um dos grandes avanços da educação foi ofertar uma escola gratuita, e agora temos que lutar cada vez mais pela sua qualidade”, afirma ele.
“Educação é tudo. Parece até clichê falar isso, mas a Educação transforma o mundo. Hoje, não se constrói nada sem estudo, e vemos isso avançar cada vez mais. Até mesmo para trabalhar como faxineiro é preciso saber ler e escrever. Não entra se não tiver, pelo menos, Ensino Fundamental incompleto”, complementa Valéria.
Para Daniel, a importância do ensino público também passa por necessidades básicas, principalmente de comunidades mais vulneráveis.
“Foi só mais recentemente que o Estado entendeu que algumas condições afastam as pessoas da Educação, e começou a ceder mais, fornecendo material, uniforme, refeições. Porque numa comunidade vulnerável, se o Estado, a Prefeitura não oferecem as condições necessárias, não tem como manter os jovens nas escolas”, explica o diretor.
Mas escolas públicas também podem ser atrativas para outros públicos.
“Muitas pessoas que passam pela escola acham que é uma instituição particular, porque é um prédio tombado muito bonito, mas a maioria do nosso público são alunos de comunidades como Taquaril, Morro do Papagaio, Serra, Jardim Canadá, Olhos d’Água. Famílias que se sacrificam para pagar um pouco mais no transporte porque querem o filho numa escola boa”, relata a diretora Valéria.
“A gente recebeu muitos alunos que eram da rede privada que, com a pandemia, acabaram perdendo um pouco da condição financeira que tinham”, continua.
Ainda assim, ela relembra que “hoje, seja pobre ou seja rico, todos têm a oportunidade de estar em uma escola pública e o aluno pode escolher onde quer estudar”.
Conheça as escolas
Escola Estadual Barão do Rio Branco
A diretora Valéria entregou à reportagem do Estado de Minas o livro comemorativo de 100 anos da Escola Estadual Barão do Rio Branco, que conta parte da história da instituição. Ela nem sempre esteve na Avenida Getúlio Vargas, Bairro Funcionários, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, com sua construção de estilo neoclássico.
“Ela começou lá na João Pinheiro, antiga Avenida Liberdade, e depois pensaram em algo mais majestoso e grandioso. Assim, foi construído o prédio definitivo na antiga Avenida Paraúna, agora Avenida Getúlio Vargas e, em 1914, começaram as atividades aqui”, afirma.
O prédio, que é tombado pelo IEPHA-MG desde 1988, passou por uma grande reforma entre 2011 e 2018 que custou quase R$ 10 milhões.
Além das obras na estrutura, substituições de pisos – que passaram por processo de envelhecimento artificial para se parecerem ao máximo com os originais – e restauração de pinturas nas paredes, a escola recebeu quadra e cantina mais modernas, além de um elevador para pessoas com deficiência (PcD).
Em 2023, a escola foi cenário da campanha do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, do governo federal. A diretora conta que as gravações ocorreram em dias letivos normais, enquanto os alunos mantinham suas aulas normais nas salas que não estavam ocupadas pelos atores e equipe de gravação.
Hoje, a instituição conta com mais de 900 alunos do Ensino Fundamental 2 divididos nos turnos da manhã e da tarde, além de 88 funcionários.
Escola Municipal Belo Horizonte
O diretor Daniel entregou ao EM um documento de mais de dez páginas escritas à mão contando um pouco da história da Escola Municipal Belo Horizonte. Ele relembra que, em 1947, o então candidato à PBH Otacílio Negrão de Lima prometeu fundar um educandário para adolescentes pobres ou de poucos recursos de BH, e cumpriu. Em 1948, já prefeito, sancionou a lei que criava o Ginásio Municipal de Belo Horizonte.
Seus primeiros professores eram convidados a trabalhar sem concurso, nomeação ou contrato escrito, e apesar de receberem cerca de oito vezes mais que docentes dos demais colégios da cidade, não tinham férias, repouso remunerado ou quaisquer outras vantagens da lei trabalhista.
Um dos primeiros docentes do Ginásio Municipal foi o Delegado Geral Oswaldo Machado, que cedeu o espaço da Delegacia Geral – onde hoje é o porão do Palácio das Artes – para as primeiras aulas da instituição. A escola também chegou a funcionar em um casarão no Parque Municipal, que tinha abrigado a comissão construtora da capital no início do século XX e foi reformado para se tornar a primeira sede do Ginásio.
Em 1954, o prefeito Américo Renné Giannetti transferiu a instituição para o Bairro da Lagoinha, na Região Noroeste e, posteriormente, teve o nome alterado para Colégio Municipal de Belo Horizonte. Mais tarde foi transferido para o prédio do ex-Colégio Marconi, no Bairro Gutierrez (Oeste da capital), e voltou para a Região Noroeste, desta vez para o Bairro São Cristóvão, onde está até hoje com uma grande estrutura e com o nome Escola Municipal Belo Horizonte.
Com cerca de 600 alunos, a escola tem um ginásio poliesportivo considerado “invejável” e tem diversas oficinas – como Circo, Dança, Informática, Jiu Jitsu, Rádio e Redes Sociais, Música, Esportes e Artesanato –, além de ser um polo de educação inclusiva em Belo Horizonte, com uma sala sensorial para alunos neurodivergentes – que pode ser utilizada por alunos de outras instituições da rede municipal – e aulas de Libras.
A escola funciona próxima ao Conjunto IAPI (na Avenida José Bonifácio, Bairro São Cristóvão, Região Noroeste de BH), e Daniel explica que, nos dois anos em que está como diretor da escola, a parceria que construiu com a comunidade foi um dos maiores ganhos da instituição.
“É uma comunidade que, embora vulnerável, é extremamente trabalhadora, composta por pessoas sérias que têm a escola como principal fonte de lazer. Então, as pessoas utilizam o ginásio da escola, frequentam as aulas abertas”, explica ele.
A instituição também conta com três parcerias com a PMMG: Proerd, Patrulha Escolar e Banda Militar.