Cruzamento com a Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários: o trecho soma 31 ocorrências de trânsito desde 2020, segundo painel do governo estadual -  (crédito: Leandro Couri/EM/DA Press)

Cruzamento com a Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários: o trecho soma 31 ocorrências de trânsito desde 2020, segundo painel do governo estadual

crédito: Leandro Couri/EM/DA Press

 

Quando foi construída no século 19, a Avenida do Contorno tinha o objetivo de delimitar o que seria a zona urbana de Belo Horizonte. Em tese, a então denominada Avenida 17 de Dezembro seria o limite da área mais desenvolvida da capital mineira. Na prática, porém, a explosão da população brasileira no século seguinte fez com que a área urbanizada de BH fosse muito maior do que o previsto pelo perímetro da via. Se o curso da história indica desenvolvimento por um lado, também significa aumento dos riscos: o vai e vem intenso de veículos faz da Contorno o terceiro corredor mais perigoso da cidade, atrás apenas do Anel Rodoviário e da Avenida Cristiano Machado em número de acidentes.

Um trecho de 500 metros da Avenida do Contorno, no Centro de BH, nas proximidades do Complexo da Lagoinha, concentra quatro pontos com acidentes fatais nos últimos sete anos, como mostra o mapa abaixo:

 


Em sua terceira publicação, a série de reportagens “Risco sobre Rodas”, feita pelo Núcleo de Dados do Estado de Minas, mostra que a Contorno registra 20.545 acidentes nos últimos 10 anos, considerando o período entre janeiro de 2014 e abril deste ano. Os números do Observatório de Segurança Pública do governo estadual evidenciam um total de 5,4 ocorrências por dia na avenida, ou seja, um registro a cada quatro horas aproximadamente.

 


O professor de educação e segurança no trânsito do Cefet-MG, Agmar Bento Teodoro, destaca uma diferença da Contorno para a Cristiano Machado e para o Anel Rodoviário, analisados em reportagens anteriores da série do EM. “Eu faço o paralelo dela com a Afonso Pena. São vias com muitos acidentes, mas raramente eles são graves. A maioria não resulta em morte. Isso acontece por conta da característica do tráfego, que tem uma velocidade menor por causa da presença de semáforos e do volume muito intenso de veículos”, diz.

Até mesmo os casos de atropelamentos, que geralmente resultam em ocorrências graves, costumam ser menos problemáticos na Contorno, segundo o professor Agmar Bento Teodoro. “São atropelamentos com velocidade baixa. Acontece muito de atingir o pedestre na arrancada do semáforo, quando a pessoa tenta atravessar no limite do tempo do sinal (de pedestres) aberto. Mas, o carro nessa situação ainda está ganhando velocidade, então o dano tende a ser menor. Por outro lado, em alguns trechos, é uma avenida muito larga, como acontece também com a Afonso Pena. Então, muitas vezes, o sinal abre no meio da travessia, o que faz o números de acidentes aumentar”, afirma.


Os números ilustram as explicações dadas pelo especialista do Cefet de Minas Gerais. Um acidente grave acontece na Contorno a cada 19 dias em média, enquanto os índices do Anel Rodoviário (uma ocorrência grave a cada cinco dias) e da Cristiano Machado (uma a cada oito dias) são bem maiores. Em 10 anos, a Contorno computa 196 registros com vítimas graves, o quinto maior consolidado da cidade, atrás da Antônio Carlos e da Amazonas, além da Cristiano Machado e do Anel.


A menor proporção de acidentes graves, mesmo ante um número alto de ocorrências em geral, também resulta num total de mortes mais baixo na Contorno, em relação a outras vias de grande fluxo de veículos em BH. Nos últimos 10 anos, foram 19 mortes na avenida, o 10º maior consolidado da cidade. Para se ter uma ideia, a Rua Padre Pedro Pinto, em Venda Nova, registra mais vidas perdidas no trânsito do que a Contorno, com 20 óbitos em igual período, mesma quantidade da Avenida Waldir Soeiro Emrich, a popular Via do Minério, no Barreiro.


Cruzamento problemático

Em termos de localização, os acidentes estão espalhados por toda extensão da Avenida do Contorno. Apesar disso, alguns trechos em especial representam maior dor de cabeça para os condutores e para as autoridades. O manobrista André Luiz da Silva, que trabalha em um estacionamento na esquina do cruzamento da via com a Avenida Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários, Centro-Sul de BH, relata que as batidas são frequentes, sobretudo em horários de pico. Os arredores do local computam 31 ocorrências do tipo nos últimos cinco anos. “Já presenciei mais de 10 acidentes por aqui somente neste ano. De Samu pegando a vítima até carro e moto batendo juntos, ainda mais quando acaba tendo a junção dos dois sinais abrindo ao mesmo tempo. Um cliente já chegou aqui falando que um motoqueiro esbarrou nele”, diz.


Se pudesse alterar o trânsito na região, André diminuiria o tempo em que o sinal no sentido Centro fica fechado para veículos, visto que, segundo o manobrista, a estratégia atual resulta em uma grande fila de carros no trecho. “Colocaria um tempo menor para o trânsito fluir mais. Tentaria coincidir o tempo dos dois semáforos (que abrem ao mesmo tempo), para não embolar os fluxos na hora de partir”, afirma.


Vendedor de uma loja de bicicletas no mesmo local, Jonathan Carvalho também relata que já viu mais de 10 acidentes somente neste ano no cruzamento entre a Contorno e a Getúlio Vargas. O trabalhador afirma que todas as ocorrências que viu envolvem carro e moto. “Nunca vi atropelamento ou batida de ônibus aqui. Os acidentes são causados pela desatenção dos motoristas, principalmente aqueles que ficam de olho nos celulares, em vez de estarem atentos ao trânsito”, diz.