policiais trabalham em Local de assassinato em Passos, no Sul de Minas, na região militar do estado com pior desempenho em relação à meta de contenção de homicídios em 2023 -  (crédito: Helder Almeida/Divulgação)

policiais trabalham em Local de assassinato em Passos, no Sul de Minas, na região militar do estado com pior desempenho em relação à meta de contenção de homicídios em 2023

crédito: Helder Almeida/Divulgação

Com uma faca, um adolescente de 14 anos investe contra colegas na saída da escola e mata um deles, de 15 anos, ferindo três gravemente, em Poços de Caldas. Em Passos, durante o aniversário da namorada, um rapaz de 24 anos é morto a tiros por um homem, que foge de moto. Dois dias depois, o corpo de um suspeito do crime, de 31 anos, é encontrado fuzilado em estrada vicinal do município. Em Santo Antônio do Monte, um homem de 36 anos envolvido com tráfico é morto na rua de casa com 15 facadas, deixando esposa grávida... O somatório de ocorrências como essas transformou o Sul de Minas na mais problemática região para a Polícia Militar em termos de controle de homicídios em 2023, como aponta o Relatório da Gestão de Desempenho Operacional da corporação, ao qual o Estado de Minas teve acesso

 

Embora seja uma área de números mais críticos, não é uma situação isolada. A realidade afetou a maior parte das 19 regiões de Polícia Militar (RPMs) nas quais a corporação dividiu o estado. São áreas onde não foram atingidas as metas de redução dos homicídios, considerados o mais violento dos crimes e um dos principais termômetros para a sensação de segurança social.

 

Um total de 14 RPMs (73,6%) apresentou resultados piores que as metas de planejamento de taxas de homicídios por 100 mil habitantes, sendo que nove (47,4%) se encontram no pior conceito, avaliado como “insatisfatório”, registrado quando a área ultrapassa em mais de 10% o indicador de controle almejado para os assassinatos. Os cinco fora da meta estipulada, mas com até 10% além dela, entram em uma zona de tolerância, no conceito “requer atenção”. Outras cinco RPMs baixaram as metas, incluindo a de Belo Horizonte (veja tabela na págian 39).

 

O Relatório da Gestão de Desempenho Operacional (GDO) da Polícia Militar, segundo a corporação, tem a finalidade de “acompanhamento da criminalidade e da produtividade operacional”. Para tanto, foram definidos Indicadores de Resultado, Indicadores de Esforço e Indicadores Táticos. Com base nesses dados, adotou-se a metodologia estabelecida pelo Comando-Geral, para mensuração e acompanhamento do resultado obtido nas ações de enfrentamento à criminalidade pela corporação – que não comenta suas metas internas.


As regiões mais preocupantes

A Região de Polícia Militar (RPM) mais distante das metas de contenção dos crimes de homicídio segundo o relatório de 2023 foi a 18ª, com sede em Poços de Caldas, no Sul de Minas, mas responsável por 55 municípios do Sul e Sudeste mineiros, onde a taxa de assassinatos por 100 mil habitantes chegou a ser 69,7% mais alta do que o patamar objetivado para controle do crime.

A segunda pior marca ocorreu na 13ª RPM, com sede em Barbacena (+57,5%), responsável por 61 municípios do Campo das Vertentes, Zona da Mata, Zona Metalúrgica e Sudoeste mineiro. A terceira área com maior crescimento de crimes é a 6ª RPM, sediada Lavras (40,82%) e coordenadora do policiamento de 44 municípios do Centro-Sul do estado.

 

No comparativo entre 2022 e 2023, 12 RPMs (63,1%) tiveram aumento nas taxas de ocorrências de homicídios por 100 mil habitantes. Em Minas Gerais, considerado o estado como um todo, essa ampliação foi de 4,79%. Entre as regiões com aumento de homicídios, nove chegaram a 2023 com o pior índice, o de conceito “insatisfatório”, enquanto três ainda que tenham registrado piora de situação de um ano para o outro, foram consideradas dentro do indicador “requer atenção”.

 

Conseguiram baixar os registros de assassinatos no período oito regiões militares, com destaque para a 19ª RPM (Sete Lagoas), com queda de 19,4%; a 10ª RPM (Patos de Minas), com redução de 16,42%; a 5ª RPM (Uberaba), com recuo de 15,15%; a 1ª RPM (Belo Horizonte), com baixa de 6,07%; e a 3ª RPM (Santa Luzia), com menos 4,19%.

 

BH registra melhor desempenho médio

Em Belo Horizonte como um todo, a variação da taxa de homicídios por 100 mil habitantes medida pelos indicadores da Polícia Militar caiu tanto no comparativo de 2022 para 2023, registrando recuo de 9,62%, quanto em relação à meta traçada para 2023 para controle dos assassinatos, com redução de 6,07%.

 

As unidades que mais se destacaram na capital foram o 5º Batalhão da Polícia Militar (BPM), responsável pelo policiamento da Região Oeste, com redução de 30,88%. Em seguida, o 22º BPM, da Região Centro-Sul além da Avenida do Contorno (-28,41%); o 41º BPM, do Barreiro (-26,84%); o 13º BPM, da Região Norte (-12,89%); e o 34º BPM, das regiões Nordeste, Noroeste e Pampulha (-1,12%).

 

Ainda em BH, as áreas de três batalhões registraram taxas de homicídios que escaparam ao pretendido para o controle desse crime. A pior delas foi a do 49º BPM, de Venda Nova, com taxa de assassinatos por 100 mil habitantes 39,46% acima da meta de controle traçada. Em seguida, vem a área do 1º BPM (Região Centro-Sul de BH, dentro da Avenida do Contorno), onde a meta foi ultrapassada em 28,57%. Nesse caso, a alta expectativa de contenção dos assassinatos pode ajudar a explicar o desempenho, uma vez que houve nove homicídios em todo o ano, menos de um por mês. A terceira pior área foi a do 16º BPM, da Região Leste, com alta de 20,77%.


Maioria das unidades abaixo da expectativa

No estado, as metas de controle de homicídios em parte dos 89 batalhões (BPMs) e companhias independentes que formam as 19 regiões da Polícia Militar (RPMs) também estão abaixo da média. Quando avaliada a situação das metas de homicídios estipuladas pelo Comando-Geral para essas subdivisões em 2023, chega-se a 50 (56,1%) aquém da meta e 39 (43,8%) cumprindo satisfatoriamente o esperado para controle dos assassinatos, segundo informações do Relatório da Gestão de Desempenho Operacional (GDO) de 2023, ao qual o Estado de Minas teve acesso.

 

Quando se avalia o desempenho das subdivisões com resultado insatisfatório, algumas apresentaram piores índices. Na 6ª RPM de Lavras, por exemplo, todas são de conceito insatisfatório – os dois batalhões (8º e 24º BPMs) e a 16ª Companhia Independente. O mesmo ocorreu na 13ª RPM de Barbacena, onde os três batalhões (9º, 31º e 38º BPMs) também falharam nas metas de controle dos índices de homicídios.

 

Na listagem das unidades em áreas de piores desempenhos, com 75% dos batalhões e companhias independentes abaixo da meta de controle, aparecem a 2ª RPM de Contagem e a 18ª RPM de Poços de Caldas (Poços de Caldas, Passos, São Sebastião do Paraíso), seguidas do desempenho da 12ª RPM de Ipatinga, com 71,4% das frações com contenção de homicídios aquém do esperado.

 

Para chegar a um parâmetro de quais seriam unidades teriam desempenho mais crítico no controle de homicídios, a equipe do EM separou apenas os batalhões e companhias independentes que tivessem taxas de mortes por 100 mil habitantes acima das de Minas Gerais, para evitar que uma mudança percentual em índices extremamente baixos distorcesse a realidade (um aumento de um homicídio para dois, que levaria a variação de 100%, por exemplo).

 

Por esse critério, a unidade mineira que apresentou os piores índices em relação às metas de controle de homicídios foi o 52º BPM de Ouro Preto (parte da 3ª RPM de Santa Luzia), com taxa de ocorrências 94% acima da meta de controle. Na sequência, obedecendo aos mesmos parâmetros, vêm a 19ª Companhia Independente de Pará de Minas (da 7ª RPM de Divinópolis), com 76,87%; a 7ª Companhia Independente de Igarapé (da 2ª RPM de Contagem), com 68%; o 14º BPM de Ipatinga (da 12ª RPM de Ipatinga), com 59,86%; e a 11ª Cia Independente de Pedro Leopoldo (na 19ª RPM de Sete Lagoas), com 59,44%.

 

Procurada, a PMMG não comentou os desempenhos das unidades militares e respondeu à reportagem por meio de nota. “A Gestão de Desempenho Operacional (GDO) é uma ferramenta interna utilizada pela corporação, a partir de metas estipuladas ano a ano, conforme a dinâmica criminal. Por meio dessa gestão de desempenho cirúrgica, a PMMG tem contribuído para a redução contínua da criminalidade violenta em Minas Gerais. Destaca-se, ainda, que o combate ao crime violento envolve todas as forças de segurança pública, inclusive por meio de ações integradas operacionais, preventivas e de inteligência.” 

 

A conexão carcerária

O choque entre o crime organizado de influência nacional sobre áreas de antigos arranjos criminosos locais em Minas, além da grande articulação carcerária nessa dinâmica explicam em parte a perda do controle de metas de taxas de homicídios em regiões de Polícia Militar como as de Poços de Caldas e de Barbacena, avalia o coronel Carlos Júnior, especialista em inteligência de Estado e segurança pública. “As metas estão sendo exauridas com os recursos atuais. Para se avançar, seria necessário uma ampliação urgente de efetivo, maior valorização da segurança pública e uma forte vigilância nos presídios”, observa. Para ele, práticas como a integração de sistemas de segurança pública ajudam na prevenção. “As dinâmicas mudaram. Grande parte das vítimas têm prontuários por tráfico e são mortas em ambientes fechados: em casa, sítios ou quando deixam o sistema prisional. A prevenção, com a polícia antecipando áreas de conflito, evita homicídios.”

 

Boletim de ocorrências

  • 19 regiões de Polícia Militar tem o estado, segundo divisão administrativa feita pela corporação

 

  • 14 das RPMs (73,6%) apresentaram resultados piores no controle de assassinatos do que as metas estabelecidas

 

  • 9 das RPMs (47,4%) apresentaram resultados mais críticos, com taxas mais de 10% piores que as metas de controle

 

  • 5 das RPMs (26,3%) apresentaram taxas piores que as metas de controle, mas em nível considerado de “atenção”

 

  • 5 das RPMs (26,3%) apresentaram resultados melhores que as metas de controle estipuladas internamente