Além da vaquinha, mulheres da PRF escreveram uma carta aberta para manifestar indignação e preocupação diante do resultado do processo -  (crédito: Reprodução PRF gov.br)

Além da vaquinha, mulheres da PRF escreveram uma carta aberta para manifestar indignação e preocupação diante do resultado do processo

crédito: Reprodução PRF gov.br

Mulheres da Superintendência da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Minas Gerais criaram uma vaquinha on-line, desde 16 de junho, para arrecadar dinheiro que arcaria com os custos de processos movidos contra outras quatro funcionárias e ex-funcionárias, que são alvo de um pedido de indenização por danos morais, movido por um policial e ex-chefe de Gabinete da Superintendência da PRF em Minas. Acusado de assédio moral e sexual por elas e outras duas mulheres, ele foi inocentado.

 


O policial foi alvo de um processo administrativo disciplinar (PAD) em 2018, arquivado em 2023 pelo corregedor-geral Vinicius Behrmann, que reconheceu a inocência do servidor acusado. Após o fim dessa tramitação, com duração de cinco anos, houve uma reviravolta: em maio deste ano, o policial entrou com pedido de indenização por danos morais contra quatro das seis mulheres que o denunciaram. 


A defesa dele justifica que o pedido foi feito porque o PAD gerou “um dispendioso processo, além de vários transtornos, inclusive familiares, uma vez que colocou em risco sua vida matrimonial e a estabilidade financeira e familiar de sua esposa e filhos, manchando, notoriamente, sua honra". Izabella Cristina, advogada do então acusado, afirma que seu cliente foi vítima de calúnias e difamações.

 

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De acordo com a advogada Ana Paula Silva, que representa duas das mulheres, para uma de suas clientes, que foi a primeira a denunciar o policial, o valor do pedido de indenização é de R$ 500 mil. Para as outras três, a quantia é de R$ 56.460. Diante dos custos envolvidos para responder ao processo, descrito na vaquinha como parte de “tamanha injustiça”, servidoras da PRF decidiram promover uma arrecadação coletiva. 


“Algumas das mulheres que estão respondendo pelo processo por dano moral não têm condição de pagar advogado”, diz Ana Paula Silva, que avalia o resultado do PAD como incoerente, uma vez que as denúncias foram feitas por seis mulheres, em anos diferentes, e que exerciam funções distintas — duas policiais, duas servidoras administrativas, uma estagiária (menor de idade) e uma terceirizada.

 

Três mulheres serão apoiadas pelo valor arrecado na vaquinha realizada por servidoras da PRF

Três mulheres serão apoiadas pelo valor arrecado na vaquinha realizada por servidoras da PRF

Reprodução


Das quatro mulheres alvo da indenização, uma delas optou por não ser apoiada pelo dinheiro da arrecadação e custeará os gastos por conta própria. 

 

Policial rodoviário federal, o marido de uma das mulheres afirma que “não é só responder a um processo, é reviver um trauma”. Em denúncia ao Ministério Público Federal (MPF), solicitou análise do PAD quanto a possíveis vícios, abusos, ilegalidades e indícios de ilícitos penais. 


Além disso, ele fez uma denúncia junto à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), ouvidoria da mulher, pela anexação do PAD, que continha informações da identidade das mulheres, no processo de indenização de danos morais, de acesso público. Para ele, isso expôs e afetou “de maneira significativa a imagem e a honra de minha esposa, bem como das demais mulheres supostamente vítimas de assédio sexual e moral”.


Carta aberta


Além da vaquinha, mulheres da PRF escreveram uma carta aberta ao diretor-geral, ao corregedor, à coordenadora-geral de direitos humanos e ao superintendente da PRF em Minas para manifestar indignação e preocupação diante do resultado do processo. “É com grande consternação que observamos um cenário onde as vítimas de assédio, ao buscar justiça, frequentemente se veem em uma posição de vulnerabilidade ainda maior. Em vez de encontrar apoio e proteção, muitas de nós enfrentam processos jurídicos que se voltam contra as próprias vítimas, gerando um ambiente de medo e desamparo”, diz a carta, com mais de 500 assinaturas. 


O policial diz que a carta aberta é uma ação muito importante e com uma dimensão de adesão sem precedentes. “Foram muito significativas as assinaturas porque, no ambiente policial, as pessoas têm medo de se manifestar e sofrer represália”, afirma. Foi ele quem trouxe o caso à tona em suas redes sociais após o pedido de indenização. “Imediatamente manifestei minha indignação. A iniciativa foi minha porque elas estão bem debilitadas, o quadro é de muito sofrimento.”

 

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Na carta, as servidoras requisitaram medidas para proporcionar um sistema de apoio às mulheres, como divulgação dos canais de denúncia, capacitação de treinamentos regulares e realização de eventos sobre o tema, para que os agentes públicos saibam como identificar e reportar situações de assédio. 


Em resposta, em 14 de junho, o diretor-executivo da PRF disse que “é compromisso da corporação estar alinhada às diretrizes governamentais e avançar na luta contra as desigualdades. Evidências disso são o patrocínio de contratações de especialistas no tema, a capacitação de gestores e servidores, bem como as ações de conscientização realizadas”.


*Estagiária sob supervisão do subeditor Thiago Prata