A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) indiciou o presidente e fundador do Grupo Farroupilha, Inácio Carlos Urban, e o mecânico Rogério Dalla Santa por homicídio culposo após a morte do então funcionário Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos. Visando à pulverização de agrotóxicos, a vítima pilotava uma aeronave, que caiu na pista de pouso da Fazenda São Francisco, no município de Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais, em 7 de fevereiro de 2020.

 

O Estado de Minas teve acesso ao inquérito policial encerrado em 12 de abril e remetido ao Ministério Público quatro dias depois. O documento aponta que o líder do Grupo Farroupilha — conglomerado ligado ao agronegócio com sede em Patos de Minas — contratou Dalla “para prestar clandestinamente” serviços de manutenção na aeronave envolvida no acidente. O mecânico não tinha a devida habilitação na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e realizava as manutenções habitualmente, conforme evidenciam mensagens trocadas entre ele e o piloto.

 



 

 

No documento assinado pelo delegado Leandro Fernandes Araújo consta que a aeronave pilotada por Rodrigo e destinada à atividade aeroagrícola estava com defeitos “gravíssimos”, como, por exemplo, superaquecimento, vazamento de óleo do motor, corte de combustível e panes elétrica e termostática.

 

Queda dez minutos após decolagem

Ao executar o serviço, Rogério Dalla utilizou peças que não eram originais, conforme destacado em trecho do despacho de indiciamento. No primeiro voo depois da conclusão da manutenção, a aeronave caiu na cabeceira da pista da fazenda dez minutos após a decolagem no aeródromo de Coromandel. “Se ele [o mecânico] era incapaz de identificar uma peça original da aeronave, não poderia ser capaz de dar manutenção segura na máquina”, diz a perícia. 

 

O piloto, apontado como “experiente” pela Polícia Civil, chegou a ser retirado com vida dos destroços, mas morreu a caminho do pronto-socorro do município. Rodrigo Carlos Pereira deixou uma mulher e dois filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos. 

 

A Polícia Civil disse que o dono do avião e também proprietário da fazenda, Inácio Carlos Urban, “deixou de observar a cautela necessária para evitar o acidente de trabalho, assumindo culpa consciente ao negligenciar a contratação de um mecânico habilitado, bem como ao determinar que o piloto de sua aeronave e funcionário seguisse voando em precárias condições de segurança”. Logo, a instituição policial concluiu que Inácio explorava, em tese, de forma irregular a atividade aeroagrícola.

 

Grupo Farroupilha se manifesta

Em nota à reportagem, o departamento jurídico do Grupo Farroupilha disse que o avião caiu porque houve falta de combustível, o que “configura responsabilidade exclusiva do piloto”.

 

Em relação ao indiciamento do presidente do conglomerado por homicídio culposo, o grupo informou que “ainda não teve conhecimento formal” a respeito. “O devido processo legal será atendido quando houver regular intimação”, finalizou.

 

Defeitos crônicos nas bombas de combustível

Relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) revelou que os tanques de combustíveis estavam íntegros, mas completamente vazios. Além disso, os “demais componentes do motor apresentavam ausência de combustível residual”. Também ficou constatado pelas marcas no solo que a aproximação da aeronave teve um “grande ângulo de descida”.

 

No laudo pericial judicial apresentado nos autos de reclamação trabalhista, o perito concluiu que o piloto não considerava a possibilidade de pane seca — ou seja, quando o sistema não é capaz de fornecer combustível suficiente para permitir o correto funcionamento do motor. O documento revelou que o piloto solicitou o abastecimento do avião mais que suficiente para o trajeto de ida e volta. 

 

Os defeitos crônicos nas bombas de combustível, bem como a posição ruim de leitura dos indicadores de nível e sua imprecisão, contribuíram para o atraso na decisão do piloto no momento de emergência, narra trecho do inquérito. Ainda de acordo com a perícia, o mecânico usou bomba não original, o que “poderia levar à perda ou consumo excessivo de combustível em voo”. 

 

Ao EM, a assessoria da Polícia Civil de Minas Gerais confirmou a autenticidade do despacho de indiciamento a que a reportagem teve acesso. O Estado de Minas também procurou o Ministério Público para saber sobre o andamento das diligências, mas não houve retorno até o fechamento desta publicação.

 

A defesa do mecânico Rogério Dalla Santa não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestações.

 

 

 

 

compartilhe