Aquarela -  (crédito: Larissa Kümpel e Maria Lúcia Passos / EM / DA Press)

Aquarela

crédito: Larissa Kümpel e Maria Lúcia Passos / EM / DA Press

Com Maria Lúcia Passos

 

É num cantinho do quarto de Arthur Santos, de 27 anos, que Aquarela vai surgindo. Entre camadas de maquiagens, a drag queen vai tomando o lugar. Até que o quarto ficou pequeno. Entre festas, despedidas de solteiro e discotecagem, de repente, BH já não era mais o suficiente. Aquarela participou do “Drag race Brasil”, versão brasileira de “RuPaul’s drag race”, versão original do reality show que inspirou Arthur a se montar. 


 

Aquarela surgiu em 2018. “Parece muito tempo, mas para uma carreira drag não é muita coisa. É como se eu fosse adolescente”, explicou à reportagem do Estado de Minas. Quando a drag surgiu, Arthur era estudante de publicidade da PUC. Ele abandonou a faculdade, mas chegou a trabalhar na área. Mais recentemente, ele passou a se dedicar exclusivamente à arte. 


Além de contrato de eventos, Aquarela organiza as próprias festas. No momento, ela trabalha com a realização da Aqua Party Pré-Parada, balada realizada nas vésperas da Parada LGBT de BH. 

 

‘Me senti bonita pela primeira vez’

 

Essa história de sucesso começou de forma bem despretensiosa. Arthur estava em uma aula de História da Arte, quando a professora citou a palavra “aquarela” . Foi o estalo necessário que ele precisava para criar sua drag, dando vida ao que começou a fazer nos laboratórios da faculdade, quando explorava as cores e as texturas.

 

 

“Eu sempre admirei as drags, assistia a ‘RuPauls drag race’, eu gostava desse universo. Era aquela coisa ‘viadinho’ assim quando a Aquarela entrou na minha vida de querer se montar, por uma peruca. Eu queria viver a fantasia. Tinha disponível lá os laboratórios, então eu me jogava aproveitava mesmo e a Aquarela acabou entrando na vida do Arthur de uma forma que eu não imaginava”, resumiu. 


Aquarela foi fundamental para que Arthur passasse a gostar mais de si mesmo. “A primeira vez que eu me montei – na verdade eu nem me montei, foi uma amiga quem me maquiou, com uma make super leve –, quando eu me olhei no espelho e comecei a chorar, porque eu tenho muitos problemas com autoestima. E eu me senti bonita pela primeira vez, parece que eu tinha me achado ali”, revelou.


Aquarela então passou a ser uma válvula de escape para a falta de confiança. “A Aquarela é meio que a materialização de tudo que eu penso, de tudo que eu imagino, do que eu gosto e do que eu não gosto. A Aquarela se tornou um refúgio assim na vida do Arthur. É onde ele consegue se expressar”, afirmou.


“Eu acho que a Aquarela se tornou um refúgio para mim. É uma válvula de escape também que às vezes a gente tá com problema. Acho que vestir essa essa Skin da Aquarela dá um um poder. Eu tenho a mais plena consciência da minha pessoa”, acrescentou. 


Mesmo nesse lugar de conforto, Aquarela passou a se cobrar demais para se encaixar na cena drag. Foi então que veio a pandemia. Confinada, Aquarela começou a fazer experimentações ali, dentro de seu quarto. “Comecei a explorar minha criatividade e cheguei nisso aqui”, disse, apontando para si mesma, orgulhosa de si. 

 

 

O que vem depois do sucesso?

 

Após encontrar sua estética, Aquarela tinha certeza de que era boa. Foi então que ela passou a sonhar em participar da versão brasileira de “RuPaul’s drag race”, que ainda não existia. Quando finalmente o reality show saiu do papel, ela era uma das 12 drags da disputa. Aquarela não ganhou o programa: foi eliminada no quinto episódio. Mesmo assim, conquistou o público e levou a faixa de miss simpatia para casa. 


Com a projeção do programa, Aquarela vivia um novo momento. Mas com o sonho realizado, ela precisava de novos objetivos. “Eu participei do ‘Drag race Brasil’ que era um sonho. Quais são as minhas outras ambições? Quais são as minhas opções? Então é isso a Aquarela minha vida se tornou um propósito assim um objetivo de carreira, né? Porque no Brasil viver de arte é muito complicado.  Mas eu tenho plena certeza da minha drag, da minha arte e é muito difícil alguém me tombar”, ponderou.  


Se hoje existe a possibilidade de viver da arte, antes, Arthur tinha outros trabalhos em agências de publicidade e lojas de shopping. Os trabalhos permitiam não só pagar as contas, mas também conseguir investir na Aquarela. Mas com “Drag race” tudo mudou.


“Eu vivo atualmente somente da minha drag. Eu também faço peruca, maquio outras pessoas. A renda gira em torno da arte. Eu fico muito feliz de conseguir sobreviver da minha arte, era um sonho que eu tinha. Claro que eu não fiquei rica com o programa, infelizmente, muitas portas se abrem, muitas oportunidades aparecem, o valor do cachê mudou totalmente. É outra realidade, outro patamar”, comemorou. 

 

‘Aquarela foi uma psicóloga muito boa’

 

Além do sucesso profissional, Aquarela também comemora seu crescimento pessoal. Desde a criação da drag, Arthur superou diversos medos que sentia. “Eu vejo o Arthur como uma pessoa muito mais confiante de si, muito mais confiante nas ideias, muito mais confiante artisticamente. Fez total diferença na vida do Arthur”, afirmou, acrescentando que ainda tem inseguranças com o formato do seu corpo e ainda trabalha essa questão. 


Ao mesmo tempo, Aquarela passou a se cobrar mais. “Tive que criar um sistema de ir na academia que funciona para mim para eu conseguir me sentir à vontade com isso do corpo da Aquarela, porque eu me senti incomodado. O Arthur não tem problema, mas quando eu me via de Aquarela eu falava assim ‘não tá encaixando’. É a única coisa que tem um resquício ainda hoje”, garantiu.