Em abril deste ano, a travesti Marcinha Ribeiro, de 27 anos, foi socorrida inconsciente depois de ser agredida no bairro Jardim Colonial, em Ribeirão das Neves, na Grande BH. Ela faleceu dois dias depois em decorrência de dois tiros disparados contra a sua cabeça. Os responsáveis foram presos preventivamente em maio, respondendo por crime de homicídio qualificado por motivo fútil e por meio que impossibilitou a defesa da vítima, segundo a Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), que concluiu o inquérito do caso.
O delegado Marcus Rios, responsável pelo caso, da Delegacia de Homicídios de Ribeirão das Neves, afirma que a principal motivação foi relacionada ao tráfico de drogas. Dois dos três autores do crime foram presos e um foi assassinado no dia em que a PCMG executou os mandados de prisão.
“A vítima era usuária e teria buscado adquirir uma porção, mas no lugar da droga entregaram um pedaço de tijolo de barro. Isso gerou uma discussão inicialmente, depois um espancamento da vítima e, posteriormente, a execução dela”, explica.
De acordo com o delegado, o assassinato de um dos autores do crime, apesar de relacionado com a morte de Marcinha, teve várias motivações. “Ele estava ‘tirando onda’ da morte da travesti e, querendo ou não, dando nomes de quem participou, o que gerou insatisfação por parte de seus comparsas”, afirma.
Eles estariam envolvidos em outros delitos na região, incluindo tráfico de drogas e outros crimes de violência. “É um grupo criminoso que atua no tráfico de drogas e outros crimes na região de Ribeirão das Neves. Alguns líderes são presidiários, mas não nos pareceu que essa execução tenha sido algo com envolvimento do alto escalão da organização”, complementa o delegado.
Dos dois autores que foram presos, um confessou ser o executor do crime, mas o partícipe negou os fatos. As prisões aconteceram temporariamente em maio e, na segunda semana de julho, preventivamente, concluindo o inquérito. Se condenados, podem pegar até 30 anos de prisão.
Investigações
Rios também conta que, no dia em que Marcinha foi resgatada, uma testemunha foi ouvida. Seu relato guiou os primeiros passos da investigação, mas os fatos se mostraram diferentes dos narrados.
Na época, militares percorreram o lote onde a vítima foi achada e encontraram um homem de 20 anos com uma faca, que relatou estar com a vítima quando uma terceira pessoa chegou procurando por ele. Sua versão foi desmentida por vizinhos e ele foi conduzido para a delegacia, mas liberado pouco depois.
“Essa testemunha acreditou que era ela o alvo dos autores, mas durante a investigação conseguimos apurar que os autores sequer chegaram a ver essa testemunha no local. O alvo era, realmente, essa vítima, mas a testemunha provavelmente ficou muito assustado pela dinâmica dos fatos e, talvez sob efeito de drogas, acabou interpretando erroneamente”, declara.
Denúncia do Cellos-MG
O caso ganhou maior repercussão em abril deste ano após uma denúncia do Cellos-MG (Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais) sobre o tratamento que a vítima recebeu do Hospital Risoleta Neves, para onde foi encaminhada depois de resgatada, e da Polícia Civil de Minas Gerais.
Em nota, o centro afirmou que, “ao dar entrada no hospital, a companheira foi identificada no sexo masculino, tendo seu prontuário preenchido com o seu ‘nome morto’ – nome de registro com o qual pessoa não se identifica mais.”
Ainda de acordo com o Cellos, o caso da vítima, depois do falecimento, não foi encaminhado com notificação compulsória de casos de violência contra a mulher. “Não suficiente a violência cometida pelo hospital, no REDS, a Polícia Civil também registra com o nome e sexo diferente de sua identidade, além de fazer não constar nada no campo dedicado à identidade de gênero.”
Em nota, a PCMG informou que os campos referentes à orientação sexual e identidade de gênero de envolvidos em ocorrências só são preenchidos por meio de autodeclaração, ou seja, dependem da manifestação da pessoa envolvida – e não são campos de preenchimento obrigatório.