As linhas do tempo se entrelaçam às cordas do instrumento e tocam os corações em ritmo de sensibilidade, esperança, beleza. Nesse tom, a harmonia musical esteve presente, na manhã de ontem, numa maternidade de Belo Horizonte, pelas mãos da mineira Ana Luíza Cicarini. Unindo duas pontas de sua jovem história, a harpista de 18 anos e reconhecimento nacional se apresentou para 35 recém-nascidos, com o objetivo de, além de encantar, confortar as famílias com filhos e filhas na UTI neonatal do hospital Neocenter, onde ela passou seus primeiros 40 dias de vida.

 


O ambiente não é o mais indicado para um concerto, mas a emoção tomou conta da plateia silenciosa. E soou mais alto. Ana Luíza, que fez aniversário no último dia 6, e pensou inicialmente em se apresentar naquela data, disse que era uma oportunidade de levar esperança aos pais, que passam por momentos difíceis, e contar um pouco da sua história.

 



 


Para a manhã de ontem, a jovem artista escolheu números gospel e clássicos. Curiosamente, não se ouvia choro de neném - o silêncio era quebrado apenas pelos ruídos dos monitores indicando frequência cardíaca e saturação. Pouco antes de entrar em cena com sua harpa, instrumento com 47 cordas que a fascinou desde a infância, Ana Luíza explicou sua relação com o universo dos sons: "A musicalização, desde meus primeiros dias, é essencial na minha vida, e quero que essa apresentação ofereça um alento ao coração das famílias que passam por situações parecidas com as que vivi.”

 


Acompanhando há 102 dias o filho Danilo, que nasceu prematuro (24 semanas), a dona de casa Ariadne Hosken gostou do que viu e ouviu: "Muito emocionante. A música traz conforto ao coração. Meu primeiro filho, Pedro, agora com um ano e seis meses, também nasceu prematuro, e gostaria de ter vivido essa mesma experiência".

 


O baixista Luigi Pasquarelli, pai de um menino nascido havia 36 horas, ficou emocionado. "Estamos num ambiente tenso, então a música acalma um pouco. A harpa é um dos instrumentos mais difíceis de se aprender", destacou. A apresentação foi para bebês prematuros pesando acima de um quilo.

 


SONS DA VIDA

 


Segundo a direção do Neocenter, todas as medidas de higiene hospitalar foram adotadas para garantir a comunhão dos benefícios, música e segurança necessária aos pacientes. “O Neocenter é pioneiro na implantação de diversas modalidades terapêuticas usadas na assistência intensiva aos recém-nascidos e crianças”, disse a pediatra e diretora técnica do Neocenter Maternidade, Tilza Tavares. "Música alimenta a alma, e a alma é sua essência ", ressaltou.

 


A diretora explicou ainda que, por meio da música, ocorre a redução da frequência cardíaca e respiratória, estimulando o sistema auditivo dos bebês. “Iniciativas como essa são importantes para proporcionar mais tranquilidade, conforto e acolhimento tanto aos recém-nascidos internados na UTI quanto às famílias, que conseguem relaxar e diminuir a ansiedade. Além disso, também contribui para que os colaboradores atuem em um ambiente que fique mais prazeroso.”

 

 

Ana Luiza Cicarini e a mãe Renata Júlia Cicarini se emocionam durante a visita

Telmo Ferreira/Divulgação


ARTE E ESPERANÇA


Criada em ambiente musical, Ana Luíza viveu imersa no universo da música desde seus primeiros tempos. Após o fim de complexos 40 dias de internação na UTI neonatal do Hospital Neocenter, a família dela logo procurou cursos de musicalização para bebês a fim de ajudá-la a se desenvolver social e cognitivamente. Uma homenagem surpreendeu a jovem: a leitura de uma carta escrita pela técnica de enfermagem Cláudia Cândida, que cuidou de Ana Luíza, trabalha no Neocenter e não pôde estar presente.

 


A mãe da jovem harpista, Renata Júlia Cicarini, revelou que a música criou uma forte ligação entre as duas. “Durante a internação, sempre cantava para ela, tocava em seu corpo no ritmo da música, a colocava em meu colo, enquanto cantava para que ela sentisse as vibrações da música em meu corpo”, lembrou a mamãe, que é pianista e professora de música.

 


Assim, Renata disse ter encontrado na musicalização para bebês uma forma de se conectar e fortalecer o vínculo amoroso com a filha, mesmo em um período difícil. Com o apoio da família para que se expressasse artisticamente, Ana Luíza, aos seis anos, desenvolveu grande interesse pela harpa. Hoje, harpista mais jovem do Brasil, a belo-horizontina, filha única, vem se preparando para começar o curso de graduação em música, na Universidade de Parma, na Itália. Sorridente, o papai Maurício Ferraz Torres, servidor público federal, encontra na palavra "orgulho" a melhor para definir os sentimentos em relação à trajetória de Ana Luíza.

 

 


TEMPO DE INTERNAÇÃO

 


A direção do Neocenter informa que a música contribui para o fortalecimento dos vínculos emocionais entre bebês prematuros e seus pais, e outra vantagem é que essa conexão também melhora a resposta ao ambiente hospitalar. Dessa forma, a integração da musicalização pode melhorar a qualidade de vida e o desenvolvimento dos pequenos. “Bebês prematuros, que muitas vezes passam por diversas intervenções médicas e necessitam de monitoramento constante, se beneficiam das interações sensoriais proporcionadas pela musicalização.”

 


Novamente com a palavra, Tilza Tavares: ”O uso da música e dos ritmos juntos ao suporte do tratamento médico proporciona também um alívio emocional durante procedimentos dolorosos. As técnicas de musicalização para bebês podem acelerar a recuperação e reduzir o tempo de internação.”

 

 

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