Rodrigo Carlos Pereira ao lado da esposa Patrícia Cristina da Silva Pereira e dos filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos -  (crédito: Arquivo pessoal)

Rodrigo Carlos Pereira ao lado da esposa, Patrícia Cristina da Silva Pereira, e dos filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos

crédito: Arquivo pessoal

O presidente e fundador do Grupo Farroupilha, Inácio Carlos Urban, indiciado por homicídio culposo devido à morte do então funcionário e piloto de avião Rodrigo Carlos Pereira, aos 39 anos, pede na Justiça pouco mais de R$ 932 mil à viúva a título de danos materiais. O valor seria para cobrir o prejuízo decorrente das avarias na aeronave do empresário, que era pilotada por Rodrigo e caiu na pista de pouso da Fazenda São Francisco, em Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais, em 2020.

 

Para justificar o requerimento de indenização, os advogados do dono do Grupo Farroupilha — conglomerado ligado ao agronegócio com sede em Patos de Minas — alegaram que “a culpa pelo acidente fatal que vitimou o trabalhador foi exclusivamente dele”. Com isso, eles pedem que sejam acrescidos juros de 1% ao mês até a data do efetivo pagamento.

 

 

A defesa do empresário remeteu o pedido ao juiz da Vara Única do Trabalho da comarca de Patrocínio em abril de 2022, quando citou o entendimento do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) na ocasião: “Com base nos indícios apresentados, é possível que o piloto tenha planejado incorretamente o combustível necessário para realizar o voo” — parecer que acabou ganhando novos contornos com o indiciamento de Inácio.

 

O requerimento da defesa do empresário foi apresentado à Justiça em resposta à ação movida no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) pela viúva após a morte do marido. Ela requer à Justiça trabalhista o reconhecimento de que cerca de 80% do salário era pago ao companheiro sem recolhimento de impostos. Com isso seria possível obter a revisão da pensão. Entre outros pontos, a ação visa ao pagamento de indenizações por danos morais e materiais em decorrência da morte de Rodrigo.

 

 

“O grupo empresarial e o seu presidente se negam a reparar os danos provenientes do acidente que resultou na morte do piloto e, ainda, cobram na Justiça das duas crianças órfãs e da viúva uma quantia que, em valores atualizados, ficaria em aproximadamente R$ 1,3 milhão”, pontuou o advogado da família, Rodrigo Marra, em nota enviada ao Estado de Minas. A viúva optou por não conceder entrevista.

 

Dois anos após pedir indenização à família da vítima, o empresário acabou indiciado pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) por homicídio culposo. O inquérito foi encerrado em 12 de abril deste ano e remetido ao Ministério Público quatro dias depois.

 

Nesse documento, assinado pelo delegado Leandro Fernandes Araújo, consta que a aeronave, pilotada por Rodrigo no dia do acidente e destinada à atividade aeroagrícola, estava com defeitos “gravíssimos”, como, por exemplo, superaquecimento, vazamento de óleo do motor, corte de combustível e panes elétrica e termostática, o que teria causado a queda do avião.

 

 

Além disso, no laudo pericial judicial apresentado nos autos da reclamação trabalhista, o perito concluiu que o piloto não considerava a possibilidade de pane seca — ou seja, quando o sistema não é capaz de fornecer combustível suficiente para permitir o correto funcionamento do motor. O documento revelou também que Rodrigo solicitou o abastecimento do avião mais que suficiente.

 

A reportagem procurou a assessoria de comunicação do Grupo Farroupilha e o advogado de Inácio Carlos Urban para saber se o empresário pretende manter o pedido de indenização mesmo após o indiciamento dele por homicídio culposo, mas não houve retorno até o fechamento desta publicação.

 

Queda dez minutos após decolagem

 

Visando à pulverização de agrotóxicos, Rodrigo Carlos Pereira saiu em 7 de fevereiro de 2020 com a aeronave do aeródromo de Coromandel e caiu na cabeceira da pista de pouso da Fazenda São Francisco, perto de uma lavoura de milho, dez minutos após a decolagem.

 

O acidente aconteceu no primeiro voo depois dos reparos feitos pelo mecânico Rogério Dalla Santa contratado por Inácio. Esse profissional, porém, não tinha a devida habilitação na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Dalla também foi indiciado por homicídio culposo. A defesa dele não foi localizada pelo EM. O espaço segue aberto para manifestações.

 

 

O piloto, apontado como “experiente” pela Polícia Civil, chegou a ser retirado com vida dos destroços, mas morreu a caminho do pronto-socorro do município. Rodrigo deixou uma mulher e dois filhos, que, à época do acidente, tinham 3 e 5 anos.

 

A Polícia Civil afirmou que o empresário deixou de observar a cautela necessária para evitar o acidente de trabalho, “assumindo culpa consciente ao negligenciar a contratação de um mecânico habilitado, bem como ao determinar que o piloto de sua aeronave e funcionário seguisse voando em precárias condições de segurança”. Logo, a instituição policial concluiu que Inácio explorava, em tese, de forma irregular a atividade aeroagrícola.

 

Defeitos crônicos nas bombas de combustível

 

Relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) revelou que os tanques de combustíveis estavam íntegros, mas completamente vazios. Além disso, os “demais componentes do motor apresentavam ausência de combustível residual”. Ainda ficou constatado pelas marcas no solo que a aproximação da aeronave teve um “grande ângulo de descida”.

 

Os defeitos crônicos nas bombas de combustível, bem como a posição ruim de leitura dos indicadores de nível e sua imprecisão, contribuíram para o atraso na decisão do piloto no momento de emergência, narra trecho do inquérito. De acordo com a perícia, o mecânico usou bomba não original, o que “poderia levar à perda ou consumo excessivo de combustível em voo”.