Rebeca Nicholls*

 

Os casos de coqueluche continuam a crescer em Belo Horizonte e em apenas seis dias registraram alta de 44,4%. O número acende um alerta para os índices de vacinação, principalmente nas crianças de até 4 anos de idade. O ideal é que a cobertura vacinal para a Tríplice Bacteriana (dTp) chegue em 95% do público-alvo, mas em Belo Horizonte, de acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA-BH), o índice é agora de 74% para as crianças de até 1 ano, a parcela mais suscetível a casos graves da doença. O esquema vacinal primário nos bebês é composto por três doses, aos 2, 4 e 6 meses. No resto do país, o cenário da doença também preocupa e depois de três anos sem óbitos, o Brasil confirmou, em 25 de julho, a primeira morte por coqueluche – um bebê de 6 meses, de Londrina, no Paraná.

 

Até 16 de julho, a capital mineira tinha 27 casos de coqueluche confirmados neste ano. Seis dias depois, os casos saltaram para 39, batendo o recorde desde 2017 (veja quadro). Nos últimos 10 anos, o pior cenário foi registrado em 2014, com 81 casos, ainda conforme dados da SMSA. Naquele ano, o Brasil viveu seu último pico epidêmico de coqueluche, com 8.614 casos, segundo o Ministério da Saúde.

 

De acordo com o médico infectologista cooperado da Unimed-BH Estevão Urbano, a coqueluche era “extremamente comum” até os anos 1970 e início da década de 1980, “quando a vacinação em massa reduziu drasticamente a incidência da doença”. Atualmente, os casos sobem no país e no mundo. A reportagem solicitou os dados de coqueluche em Minas Gerais para a Secretaria de Estado de Saúde, mas não obteve retorno.

 

A vacinação é a principal forma de se proteger contra a coqueluche. Neste momento, o sistema de saúde pública de Belo Horizonte conta com dois imunizantes contra a doença, direcionados para diferentes públicos: a vacina Tríplice Bacteriana Acelular Infantil ou dTp, aplicada até os 4 anos de idade; e a versão adulta do imunizante, conhecida como dTp-A. Os dois imunizantes protegem contra a coqueluche, difteria e tétano e estão no Calendário Nacional de Vacinação do Programa Nacional de Imunização do Ministério da Saúde (PNI/MS).



MEDIDA EMERGENCIAL

O diretor de Promoção à Saúde e Vigilância Epidemiológica da Prefeitura de Belo Horizonte, Paulo Correa, explica que a aplicação desse segundo imunizante é uma medida emergencial em relação ao aumento de casos. “Essa vacina especificamente que o ministério liberou agora, que é a dTp-A, vem em uma ação extraordinária e temporária do Ministério da Saúde, considerando essa questão do aumento dos casos de coqueluche no Brasil. Então, ela é específica para alguns grupos mais vulneráveis”, detalha.

 

O grupo prioritário para a vacina Tríplice Bacteriana Acelular Adulta inclui profissionais da saúde que atuam em atendimentos de ginecologia, obstetrícia, pediatria, além de doulas e trabalhadores de berçários e creches com crianças de até 4 anos. Paulo Correa ainda ressalta a importância de as crianças e as gestantes serem vacinadas.

 

“É importante que principalmente crianças que são o grupo de risco de maior adoecimento e de desenvolvimento de formas graves estejam vacinadas. Então, esse grupo de crianças, principalmente de até 4 anos, precisa estar muito vacinado, além das gestantes também, porque assim a gente protege o bebê dentro da barriga e, principalmente, quando nascer, pela passagem de anticorpos da mãe para a criança.”

 

De acordo com a Secretaria de Saúde de Belo Horizonte, os dois imunizantes estão disponíveis nos 152 centros de saúde da cidade e no Serviço de Atenção à Saúde do Viajante, de segunda a sexta-feira. Para se vacinar é necessário apresentar um documento de identificação com foto, cadastro de pessoa física (CPF) e o cartão de vacina. Até o momento, conforme dados da pasta da saúde da capital, foram aplicadas 23 mil doses da vacina emergencial contra a coqueluche, a dTp-A. De acordo com a secretaria, o estoque atual é de aproximadamente 24 mil doses.

 

Já a cobertura vacinal da Tríplice Viral Acelular Infantil nas crianças de até 1 ano está em 74%, índice considerado baixo, já que a porcentagem recomendada pelo Ministério da Saúde é 95%. Em relação ao aumento dos casos de coqueluche, o diretor de promoção à saúde e vigilância epidemiológica da Prefeitura de Belo Horizonte, Paulo Correa, explica que o número acende um alerta.

 

 

“A coqueluche é uma doença altamente transmissível e ela tem tido registros no Brasil inteiro. São Paulo, Distrito Federal e Belo Horizonte começaram também a observar este ano o aumento no número de casos, principalmente em adolescentes de 10 a 19 anos de idade. É uma situação preocupante, por isso começamos a fazer uma investigação desses casos, a avaliar, confirmar em laboratório, fazer avaliação das pessoas que tiveram contato para adotarmos medidas de controle”, explica Correa.

 

Ele destaca que é essencial verificar o cartão de vacina e testar pacientes com sintoma da doença. “Nos casos suspeitos, a gente tem que coletar amostras para confirmar ou descartar a coqueluche. E também avaliar o cartão de vacina, porque é uma doença prevenível. Então a gente faz a avaliação e atualiza o cartão daquelas pessoas que estão com atraso vacinal”, ressalta.


ALTO CONTÁGIO

Também conhecida como “tosse comprida”, a coqueluche é causada pela bactéria Bordetella pertussis. A doença é infecciosa e altamente contagiosa. Qualquer pessoa pode ser infectada e a transmissão ocorre pelo contato direto do doente com uma pessoa não vacinada por meio de gotículas eliminadas por tosse, espirro ou até mesmo ao falar. Febre, mal-estar, coriza e tosse seca são os principais sintomas.

 

O infectologista Estevão Urbano explica que a transmissão ocorre no período em que as tosses ficam mais recorrentes. “Durante a fase inicial de muita tosse é que há a transmissão. Ela ocorre por meio do contato com as gotículas expelidas durante a tosse. É extremamente contagiosa, então, boa parte das pessoas que entram em contato com quem está tossindo acaba adquirindo a doença. Portanto, a proteção é sempre a vacina, que praticamente zera a possibilidade de adquirir a doença e principalmente os casos graves”, detalha.

 

Para o médico, a principal causa do aumento dos casos de coqueluche é a queda da vacinação. “Essa queda nos índices de vacinação tem afetado outras doenças também. O sarampo e outras doenças têm aumentado também. A alta é um alerta importantíssimo para a possibilidade de retorno da coqueluche, que pode ser fatal. Essa baixa de vacinação também tem permitido um risco muito grande de várias outras doenças que tinham praticamente sido eliminadas voltarem,” salienta.

 

Na segunda-feira, a ministra da Saúde, Nísia Andrade, reforçou a orientação para que grávidas e crianças sejam vacinadas contra a coqueluche. A orientação foi dada após a confirmação da morte de um bebê de 6 meses, em Londrina, no Paraná, na semana passada. Segundo a ministra, o caso “não liga um alerta”, mas reforça “uma vigilância permanente em relação a qualquer agravo de saúde”. Nísia Trindade lamentou a morte do bebê no Paraná. O estado investiga ainda se a morte de um bebê de 3 meses, em Irati, pode ser atribuída à coqueluche.


ONDAS

“A coqueluche tem a sua gravidade focada quase que exclusivamente na criança pequena, no bebê no primeiro ano de vida. Justamente a idade em que ele ainda não completou o seu esquema vacinal”, reforça o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri.

 

Segundo Kfouri, no Brasil e no mundo, a doença costuma ter ondas de picos de prevalência, que acontecem, geralmente, dentro de cinco a sete anos. Desta vez, o período ficou mais espaçado por causa da pandemia de covid-19, quando o distanciamento social e medidas de proteção, como o uso de máscaras, contribuíram para que houvesse menos infecções.

 

Ele detalha que o surgimento de ondas acontece porque a infecção e a vacinação não causam uma imunidade duradoura, fazendo com que, de tempos em tempos, haja mais pessoas suscetíveis à infecção. O infectologista acrescenta como motivos do aumento recente no número de casos a cobertura vacinal infantil não ideal e mutações na cepa da bactéria Bordetella pertussis. (Colaborou Izabella Caixeta)


O SALTO DOS CASOS

 

Confira os registros de coqueluche em BH:


2024


De 1º/1 a 16/7: 27

De 16/7 a 22/7: 39

 

44,4%

Elevação de casos em seis dias


Ano a ano

2017/36
2018/25
2019/34
2020/5
2021/3
2022/0
2023/0
2024/39*

*Até 22/7

 

A doença e seus sintomas

A coqueluche é uma doença infecciosa aguda respiratória altamente contagiosa, causada pela bactéria Bordetella pertussis.

 

A transmissão ocorre, principalmente, pelo contato direto do doente com uma pessoa não vacinada, por meio de gotículas eliminadas por tosse, espirro ou até mesmo ao falar.

 

Os principais sintomas são febre, mal-estar, coriza e tosse seca, às vezes, intensa.


Esquema vacinal


As vacinas contra coqueluche integram o Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde. Além de bebês, gestantes e puérperas (mulher no período de seis a oito semanas após o parto) podem receber o imunizante.

 

O esquema vacinal primário nos bebês é composto por três doses, aos 2, 4 e 6 meses, com a vacina pentavalente, que protege contra difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e Haemophilus influenzae tipo b.

 

As doses de reforço com a vacina dTp (contra difteria, tétano e coqueluche), conhecida como tríplice bacteriana, são aplicadas com 15 meses e 4 anos.

 

Emergencialmente, a dTp-A (para adultos) está sendo aplicada também em profissionais de saúde, especialmente ginecologistas e doulas.

 

Fonte: Sinannet/GVIGE/DPSV/SMSA/PBH/Ministério da Saúde

 

 

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