O morador da Serra do Cipó Dilceu Moreira, 54 anos, é guardião da estátua de Juquinha e trabalha em uma lanchonete nas proximidades da rodovia MG-10. No último domingo (18/8), o homem, que mora sozinho no local, viu seu horizonte se transformar em “fogo e fumaça”. “Em toda minha vida, nunca vi algo assim. Para mim, foi a maior queimada da Serra do Cipó”, lamenta.

 

 



 

Ele percebeu o fogo às 14h em uma propriedade vizinha, enquanto jogava cartas com um amigo. “Eu percebi a fumaça, mas continuei de costas. Quando me virei novamente, vi chamas de cerca de 10 metros de altura”, relata Dilceu. Para proteger sua casa, ele jogou água sobre as folhagens seca.

 

 

“Sabe o que é uma terra arrasada? Aqui está como um cenário de guerra, parece que não sobrou nada. A mata, se chover, volta, mas a fauna não. A natureza vai dar um jeito de se recuperar”, pontua o morador.

 

 

A chefe do Núcleo de Gestão Integrada Cipó-Pedreira do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Romina Belloni, conta que múltiplos focos de incêndio foram localizados próximos ao km 120 da rodovia MG-010 e se espalharam ao longo da Serra do Espinhaço, inclusive em unidades de conservação como a Área de Proteção Ambiental Morro da Pedreira e Parque Nacional da Serra do Cipó.

 

 

 

A área atingida, segundo o Instituto, é de 478 hectares. Esse dado, no entanto, ainda será atualizado ao fim das queimadas. Otimista, Belloni relata que a situação está controlada, mas ainda é preciso monitoramento para que os focos não voltem a queimar. “Estamos em uma força-tarefa com a Polícia Militar de Minas Gerais e o Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, além de brigadistas voluntários do Guardiões da Serra do Cipó”, detalha.

 

 

 

A ocorrência levou ao fechamento preventivo do Parque Nacional da Serra do Cipó a partir dessa segunda-feira (19/8).

 

 

Ainda de acordo com a representante do ICMBio, cerca de 75 pessoas atuam por dia no local, divididas entre trabalho em campo e logística. O helicóptero do Instituto Estadual de Florestas (IEF) também está trabalhando no combate às chamas. 

 

 

O brigadista voluntário Cris Reis conta que está na Serra do Cipó desde segunda-feira (19/8). “Minha equipe está na região de Mãe d'água, da nascente da cachoeira do Véu da Noiva. Lá ainda tem muitos focos de incêndio e eu não diria que estão controlados, mas sob controle, porque se virarmos as costas o incêndio pode voltar e nosso trabalho se perder”, relata.

 


 

 

 

Reis destaca que o clima seco dificulta o controle das chamas. “Estamos nos revezando, uma equipe fica durante o dia, outra passa a noite. Quando dá, descansamos”, explica.

 

 

 

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Serra da Moeda

 

Além do combate na Serra do Cipó, os bombeiros estão trabalhando na Serra da Moeda, na altura de Itabirito, Região Metropolitana de Belo Horizonte, em um incêndio que começou no domingo (18/8). Treze bombeiros, incluindo uma equipe especializada em incêndios florestais, estão no local e atuam em focos que avançam em direção à cidade de Moeda, na Região Central, e podem causar riscos para residências.

 

 

O posto de comando da operação foi estabelecido na antiga base da Polícia Rodoviária Federal (PRF) da BR-040, com heliponto. O local conta com estrutura de hidrantes para captação de água.

 

 

 

Além das guarnições dos bombeiros, 20 brigadistas ajudaram no combate. A força tarefa de apoio atua em pontos estratégicos, reforçando o combate às chamas nos diversos focos.
O tenente Henrique Barcelos afirmou que todos os focos de incêndio na Serra da Moeda estão controlados, mas a equipe permanece no local para monitorar e evitar a reincidência.

 

 


Minas em chamas

 

De acordo com o CBMMG, além de Serra da Moeda e Serra do Cipó, estão em chamas sete das 95 unidades de conservação do estado, situadas na Região Central e na Grande BH: Monumento Natural Peter Lund (Cordisburgo); Monumento Natural Itatiaia (Ouro Preto); Parque Estadual Serra do Brigadeiro (Araponga); Monumento Natural Serra da Moeda (Moeda); APA Sul RMBH (Nova Lima); Refúgio de Vida Silvestre Libélulas da Serra de São José (Tiradentes); e Parque Estadual Serra do Papagaio (Baependi). 

 

 

 

“O Corpo de Bombeiros Militar permanece em contato com os órgãos estaduais e municipais envolvidos e, até o momento, tanto no entorno da Serra do Cipó quanto nos demais incêndios florestais do Estado não há orientação para que as pessoas deixem suas casas”, afirmou a corporação, em nota.

 

 


Alerta de calor

 

Ao menos 187 cidades de Minas Gerais vêm sendo atingidas por uma onda de calor, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). As cidades ficam localizadas nas regiões do Triângulo Mineiro, Sul, Sudoeste e Zona da Mata de Minas e devem ficar ao menos 5°C acima da média até esta quarta-feira (21/8).

 

 

De acordo com a meteorologista do Inmet Anete Fernandes, o motivo por trás da onda de calor é um bloqueio atmosférico. “Um bloqueio vem impedindo que as frentes frias avancem sobre o país nesses últimos dias, o que mantém predomínio de céu claro, baixos índices de umidade e favorecendo para que as temperaturas máximas se situem muito acima da média”, ressalta.

 

 


Risco de doenças

 

Segundo o professor Bernardo Gontijo, do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as áreas verdes se não são bem cuidadas estão mais vulneráveis. Os parques nacionais e estaduais que fazem limites com manchas urbanas estão cercados de mineração e loteamentos, isso é mais difícil de controlar.

 

 

Gontijo lembra que os incêndios emitem dióxido de carbono e contribuem com o efeito estufa. “O ano passado foi o ano mais quente da história e em 2024 pode superar (o recorde).” Ele acrescentou que, além de um gradativo aumento das temperaturas, os incêndios florestais em áreas urbanas ampliam o risco de propagação de doenças. “A área verde na cidade é o refúgio da fauna. No caso de aumento desses incêndios, esses espaços podem ser comprometidos. A presença de fauna nos centros urbanos ajuda no controle de insetos e agentes transmissores de doenças, como o mosquito aedes aegypti, transmissor da dengue e chikungunya", explica.

 

 

 

Essa busca da fauna por um refúgio, no entanto, é natural, assim como as mudanças climáticas. “É do clima mudar, se não, não seria clima. Se há um processo contínuo de aquecimento, os seres vivos tendem a migrar para ambientes mais frescos e vão se adaptando à medida que os fatores ecológicos vão se alterando”, pontua Gontijo.

 

 

*Estagiária sob a supervisão do subeditor Fábio Corrêa

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