Seca e assoreamento provocam reduçao do volume do Rio Sao Francisco, inviabilizando navegação -  (crédito: Romenig Barbosa/divulgação)

Bolsões de areia aparecem em vários trechos do Rio São Francisco e até barcos menores têm dificuldade de navegar

crédito: Romenig Barbosa/divulgação

Há mais de 10 anos o vapor Benjamim Guimarães está parado em Pirapora, no Norte de Minas, com a expectativa de ser reformado. Se a restauração da embarcação fosse concluída hoje, ela conseguiria navegar nas águas do Rio São Francisco? Pelo visto, não!

 

 

A estiagem, os danos ambientais e o assoreamento provocaram a redução de volume do Velho Chico, comprometendo a navegação até mesmo dos barquinhos movidos a motor de popa, conhecidos como “rabetas”.

 

 

“Nunca vi o São Francisco numa situação dessa. O nível do rio está tão baixo que está difícil para gente navegar até mesmo com pequenos barcos”. O testemunho é dado pela pescadora e agricultora familiar Geraci Francisca Mota da Silva, que mora, literalmente, no meio do rio.

 

 

Ela reside em uma das ilhas do Velho Chico, no município de São Francisco. Geraci percorre o rio diariamente, pescando com seu pequeno barco (uma espécie de canoa) movido por motor de popa. “Mesmo com a 'rabeta', a gente precisa ficar procurando lugar mais fundo para passar. Se não tomar cuidado, o barquinho encalha. O rio está muito raso, com muitos bancos de areia”, afirma a pescadora e agricultora.

 

O baixo do nível do Velho Chico gerou um sério problema para a travessia de balsa em São Francisco, na MG-402, que liga a cidade aos municípios de Pintópolis e Urucuia. O coordenador de Defesa Civil de São Francisco, Rumenig Barbosa Martins, afirma que, devido ao baixo volume do manancial, a balsa está encalhando muito. “Se não chover logo, a travessia da balsa vai ficar ainda mais complicada”, alarma-se Rumenig.

 

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Ele também disse que “nunca” viu o rio da Unidade Nacional com um nível tão baixo. “Realmente, embarcações grandes com o Vapor Benjamim Guimarães não consegue navegar no São Francisco agora, pois até barcos pequenos e lanchas estão encalhando no rio”, afirma o coordenador. “Acho que essa situação é consequência dos fenômenos das mudanças climáticas”, completa.

 

A secretária municipal de Turismo de Januária, Solange Mota, faz coro com Romenig e afirma estar assustada em ver o Rio São Francisco tão baixo. Na região de Januária, as veredas que alimentam afluentes do Velho Chico como o Rio Pandeiros e o Rio Peruaçu, mesmo situadas em preservação, secaram completamente por conta da seca e das mudanças climáticas.

 

As veredas que ajudam a formar outros importantes afluentes do Rio São Francisco, como os rios Paracatu, Velhas, Janeiro e Urucuia, também sofrem com a devastação ambiental, conforme mostrou o Estado de Minas na série de reportagens “Veredas Mortas”, publicada entre 14 a 30 de julho deste ano.

 

O comprometimento da navegação no Velho Chico por conta do seu “secamento” também é percebido em Pirapora, onde o vapor Benjamim Guimarães está parado há mais de 10 anos, fora d'água. “Realmente, do jeito que o Rio São Francisco está hoje, muito baixo e cheio e bancos de areia, não teria como como o Benjamin Guimarães navegar”, afirma o ambientalista Roberto Mac Donald, de Pirapora.

 

No final de agosto e início de setembro, ele comandou uma expedição científica Amigos das Águas, que contou com a participação de condutores de cerca de 120 pequenos barcos e caiaques, percorrendo 160 quilômetros entre Três Marias e Pirapora.

 

“Não teria como usar embarcação maior porque o rio está muito. Nas corredeiras, como o nível da água baixou muito, as pedras estão superficiais”, relata o ambientalista, salientando que vários participantes da expedição tiveram prejuízos em seus pequenos barcos e caiaques por conta do baixo nível do rio.

 

O Velho Chico é navegável – considerando embarcações de maior porte no trecho que vai de Pirapora a Juazeiro (BA), de 1.371 quilômetros. Mas, Roberto Mac Donald afirma que o “trecho navegável” também está cheio de bancos de areia, que já aparecem em grande número no percurso entre Pirapora e Barra do Guaicuí – de 15 quilômetros.

 

Por décadas, a embarcação movida a vapor transportou mercadorias e turistas pelo Velho Chico entre Pirapora e Juazeiro.

 

Reforma do Vapor Benjamim Guimarães

Depois de mais de 10 anos parado em Pirapora, o lendário Vapor Benjamim Guimarães, finalmente, será reformado e voltará a navegar no Rio São Francisco. A reforma será bancada pela Eletrobras. Segundo a Prefeitura de Pirapora, os serviços serão iniciados nos próximos dias, com previsão de conclusão até janeiro de 2025, quando a embarcação deverá retornar às águas do Velho Chico.

 

Segundo a prefeitura da cidade ribeirinha, a restauração do vapor Benjamim Guimarães está orçada em R$ 5,8 milhões, que serão disponibilizados pela Eletrobras.

 

O Benjamim Guimarães é a única embarcação movida a vapor à lenha ainda em operação no mundo. O Vapor foi construído em 1913, nos Estados Unidos, onde foi usado no Rio Mississipi. Posteriormente, veio para o Brasil e navegou em rios da Bacia Amazônica. Na segunda metade da década de 1920, foi levado para o Rio São Francisco em Pirapora.

 

 

 

O vapor foi tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Histórico de Minas Gerais (Iepha-MG) em 1985. A embarcação está parada, com problemas na caldeira e na sua estrutura, desde 2013. De lá para cá, se arrasta o processo de restauração do patrimônio, sem a conclusão dos serviços. Enquanto isso, a embarcação permanece fora d'água, em um local perto do cais do porto de Pirapora.

 

Em janeiro deste ano, o Iepha-MG informou que “já realizou a entrega do projeto completo de restauração, flutuabilidade e navegabilidade do Vapor Benjamim Guimarães. E a sua execução se encontra a cargo da Prefeitura Municipal de Pirapora, que é sua proprietária e responsável pela execução da restauração”.

 

Segundo a Prefeitura de Pirapora, inicialmente a reforma seria custeada com recursos do Executivo Municipal, por meio de financiamento do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). Agora, no entanto, por meio de um acordo com o Ministério de Minas e Energia, a Eletrobras assumiu a empreitada do projeto de restauração.

 

“Era para as reformas terem começado há trinta dias, a equipe do restauro já está na cidade. Foi a própria Eletrobras e o Ministério de Minas e Energia que aconselharam o prefeito a fazer um edital e contratar uma consultoria para fiscalizar a verba”, afirma o diretor de Patrimônio Histórico e Cultural de Pirapora, Adélio Brasil.