Quase três décadas após ser furtada em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a imagem barroca de Nossa Senhora do Carmo retornará em caráter definitivo à tricentenária cidade, no próximo dia 17, às 18h. A peça do século 18, com 38 centímetros de altura, desapareceu em 11 de janeiro de 1995 da Igreja Nossa Senhora do Carmo, no Centro Histórico, e foi agora resgatada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). O templo e o acervo sacro são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

 

O objeto de fé foi resgatado pela Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC/MPMG), após denúncia recebida via sistema Sondar (plataforma digital contendo bens mineiros desaparecidos, recuperados e restituídos), sendo, então, comunicado o anúncio de venda da peça sacra no site de uma casa de leilões, em Campinas (SP). A partir das informações, o MPMG instaurou procedimento investigatório para apurar a denúncia e adotar as providências necessárias para o resgate.


 

De acordo com o coordenador da CPPC/MPMG, o promotor de Justiça Marcelo Azevedo Maffra, o combate às subtrações e ao comércio ilegal de bens culturais é uma das principais linhas de atuação do MPMG. “Temos desenvolvido novas ferramentas de repressão aos crimes contra o patrimônio cultural, que permitam mais efetividade no trabalho de identificação dos criminosos e no resgate das obras de arte e antiguidades que foram indevidamente retirados dos seus locais de origem”.

 



 

FESTA NO CARMO


Após a confirmação técnica da autenticidade da imagem de Nossa Senhora do Carmo, pertencente ao templo da Ordem Terceira do Carmo, a comunidade de Sabará foi comunicada. Ea festa está sendo preparada. “É motivo de surpresa e alegria. Os sinos vão tocar, o coro está pronto para saudá-la, enfim, vamos celebrar o retorno da nossa imagem”, conta o diretor de Patrimônio da Ordem Terceira do Carmo, José Bouzas, pesquisador da história local. Lembrando que já se passaram quase três décadas do furto – o que tornaria o resgate mais difícil, embora não impossível – Bouzas explicou que o ladrão (ou ladrões) não levou a coroa e o Menino Jesus, que acompanham a imagem. “O Menino Jesus está com um dedinho quebrado, e vamos mandar restaurá-lo”, observou.

 

Em 27 de novembro de 2023, conforme documentou o Estado de Minas, Bouzas e outros integrantes da Ordem Terceira do Carmo (Maria Dalila Irrthum, priora da irmandade, e Luiz Gonzaga Barbosa Silva, conselheiro), renovaram as esperanças e rezaram para que a imagem voltasse. A peça ficava num altar colateral da nave, e, na ocasião, com as vestes da irmandade, os três apresentaram, como homenagem, uma imagem em gesso de Nossa Senhora do Carmo. “O roubo foi um golpe no nosso patrimônio, que perdeu outras peças. Na época, não havia a segurança que temos hoje”, disse Bouzas. “Felizmente, a padroeira continua no altar-mor”, acrescentou.

 

Com peça em gesso para homenagear a que estava desaparecida, José Bouzas, Dalila Irrthum e Luiz Barbosa, da Ordem Terceira do Carmo, rezam pelo retorno do patrimônio

Ramon Lisboa/EM/D.A Press – 27/11/23

 


ARTE E BELEZA

Com 38 centímetros de altura e 14cm de largura, a imagem em madeira esculpida e policromada e dourada, com coroa em filigrana de prata (não furtada), é atribuída ao português Francisco Vieira Servas (1720-1811), o qual trabalhou como entalhador e escultor em várias localidades mineiras no período colonial. Conforme inventário da peça elaborado pelo antigo Sphan (hoje Iphan), a peça tem cabelos em estrias grossas, braço direito flexionado e mão esquerda sustentando o Menino Jesus. A imagem está com uma túnica marrom e ouro, manto branco e véu curto em ângulo.

 

O parecer técnico da CPPC/MPMG destaca que as linhas e elementos de composição são equivalentes: “Associado a isso, ao confrontar as informações constantes da denúncia, do anúncio, da ficha de inventário, da ficha de desaparecimento do bem e dos dados constantes do Sondar constatou-se que a imagem anunciada possui convergências com a peça desaparecida”.

 

Ainda de acordo com o laudo, no site de leilões, a imagem foi descrita como oriunda de Minas Gerais e atribuída ao artista Vieira Servas.. Após as análises técnicas, confirmou-se que a imagem comercializada pertencia a Sabará, sendo adotadas as medidas legais para que o bem cultural retornasse ao seu local de procedência.

 

 

Tombada pelo Iphan em 1938, a Igreja do Carmo teve sua construção iniciada em 1763, graças ao empenho da Ordem Terceira do Carmo, que contratou as obras com o mestre Tiago Moreira. Considerado o “mestre do Barroco”, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814) trabalhou no templo, sendo atribuídas a ele as esculturas que ornamentam o frontispício (fachada principal), especialmente a portada. Aleijadinho e sua equipe foram responsáveis ainda pelo trabalho de escultura dos púlpitos, coro e balaustradas, conforme documentos datados de 1779 e 1781. São também de sua autoria as imagens de São João da Cruz e São Simão Stock, concluídas em 1779.

 

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