Golpes digitais  -  (crédito: Stutterstock)

Golpes digitais

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Um levantamento realizado pelo Senado Federal indica que um em cada quatro mineiros (25%) perdeu dinheiro nos últimos 12 meses ao ser vítima de algum crime digital, como clonagem de cartão, fraude na internet ou invasão de contas bancárias. O número coloca o estado ligeiramente acima da média nacional, que ficou em 24%. Os resultados fazem parte da 21ª edição da Pesquisa Panorama Político, realizada pelo Instituto de Pesquisa DataSenado em parceria com a Nexus Pesquisa e Inteligência de Dados. Diferentemente da edição passada, nesta foram incluídas perguntas sobre golpes digitais que, conforme apontam outras pesquisas, se tornaram uma fonte maior para as quadrilhas nos últimos anos. Independentemente de faixa de renda, cor, idade e religião, todo mundo pode ser vítima, indica o estudo.

 

Outros dados, do Anuário de Segurança Pública, mostram que os crimes de estelionato, que incluem golpes praticados pela internet, ultrapassaram os registros de roubo durante a pandemia e mantiveram aumento nos anos seguintes, com um salto de 8,2% em 2023.

 


No ranking de golpes digitais, os estados que ficaram na dianteira na pesquisa do Senado foram São Paulo (30%) e Mato Grosso (28%), enquanto que os com melhores resultados foram Ceará (17%) e Piauí (18%). Os institutos de pesquisa consideram o levantamento "a maior pesquisa de opinião sobre o tema feita no Brasil". Foram entrevistados, por telefone, 21.808 brasileiros, entre 5 e 28 de junho. O nível de confiança é de 95% e a margem de erro para os dados nacionais é de 1,22 ponto percentual. O recorte desse relatório é "apostas esportivas, golpes digitais e endividamento". Em agosto foi publicado o levantamento anterior, intitulado "notícias falsas e democracia".

 

Uma observação destacada ao longo do relatório é de que a distribuição das pessoas que perderam dinheiro em algum golpe digital se assemelha à proporção da população brasileira aferida em outras pesquisas. Um exemplo está no recorte por renda. Entre aqueles que ganham até dois salários mínimos, 51% responderam ter sido vítima de golpe digital, número semelhante à proporção da população brasileira, já que 49% dos brasileiros declararam ter essa faixa de renda salarial. Em outras faixas, a situação é parecida, como entre os que ganham entre dois e seis salários mínimos (35% das vítimas, 28% da população) e entre os que ganham mais de cinco salários mínimos (14% das vítimas, 11% da população).

 

A conclusão apresentada pelo relatório é que não há um perfil específico de vítimas em golpes digitais. Uma das explicações para esse resultado pode estar na forma como os criminosos prospectam suas vítimas. "A tentativa de golpe é feita de forma indiscriminada. O golpista, de maneira geral, tem acesso a uma base de dados e tenta contato com todo mundo ali", explica Rafael Franco, programador e CEO da Alphacode, empresa de tecnologia da informação (TI).

 

Esses bancos de dados, explica Rafael, são vazados e vendidos na deepweb – espaço da internet mais difícil de ser rastreado do que as páginas comuns. Os vazamentos partem de dentro de empresas que têm grandes cadastros de usuários, seja por ataques de hackers ou por meio de pessoas com acesso aos bancos de dados. "Se você tem um número de telefone, você está suscetível a receber alguma mensagem de golpe", afirma Rafael Franco.

 

Um dos casos recentes de vazamento de dados envolveu o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), onde dados cadastrais de aposentados e pensionistas foram expostos por décadas. A fraude era feita a partir dos logins de servidores de órgãos externos ao INSS que se aposentaram, foram exonerados ou pediram demissão, mas que continuaram tendo acesso aos bancos de dados. Em junho, o INSS confirmou o vazamento e abriu investigação. A suspeita é de que dados tenham sido vendidos a financeiras que oferecem crédito consignado ou até mesmo que criminosos tenham usados as informações para fazer empréstimos em nome do segurado.


PRESAS E ROTEIROS


Grande parte dos golpes aplicados pela internet envolve a chamada engenharia social, que consiste em técnicas usadas pelos golpistas para convencer a vítima a passar dados sensíveis e confidenciais. O especialista em TI Rafael Franco detalha um golpe comum no qual criminosos entram em contato por telefone e dizem ser da central de atendimento de uma instituição bancária que a vítima tem conta. Após convencerem a pessoa do outro lado da linha de que se trata mesmo do banco, os golpistas dizem que precisam fazer uma atualização de segurança na conta.

 

"Nisso, os golpistas pedem sua senha e, no fim, você acaba dando todas as informações para a quadrilha. A dica é: recebeu a ligação? Desliga e ligue você para o banco. Até porque banco nenhum liga para pedir senha", explica Rafael.

 

Outra fraude em destaque no momento tem um roteiro parecido. No chamado "golpe do motoboy", criminosos dizem que o cartão de crédito da vítima foi clonado e que ela precisa cortar o cartão, mas guardar o chip. Utilizando engenharia social, os golpistas conseguem que a vítima informe dados sensíveis, como senha do cartão e endereço. Em seguida, um falso motoboy vai até a residência pegar o chip do cartão e, com o item mais os dados coletados, os criminosos conseguem fazer transações bancárias.

 

 

O advogado e professor Alexandre Atheniense acredita que os golpes digitais se tornaram mais frequentes durante e após a pandemia, momento em que muitas pessoas tiveram contato com a internet pela primeira vez. Para o professor, apesar de a Pesquisa Panorama Político indicar que não há um perfil específico de vítimas de golpes digitais, um grupo que deve ficar mais atento a esse tipo de crime é o de idosos. "As pessoas idosas tendem a acreditar mais em contatos que vêm por telefone. Elas têm menos meios para identificar se aquela pessoa é, de fato, quem ela alega ser", explica.


SEM CONVENCIMENTO

Para além da engenharia social, há golpes que envolvem outras técnicas para conseguir acesso aos dados sensíveis. Foi num desses casos que a jornalista Maria Fernanda, de 23 anos, teve o cartão clonado. Ela descobriu a situação ao fazer compras no caixa de um sacolão e não conseguir passar o cartão de crédito pois estava sem limite. Ao olhar no aplicativo do banco, não reconheceu 16 compras na sua fatura, feitas todas no mesmo lugar e divididas em três vezes. "Quando fui fazer o boletim de ocorrências, o policial pesquisou na internet o nome que estava na fatura e encontrou várias pessoas falando de golpes", conta.

 

Ao todo, Maria Fernanda calcula que os golpistas passaram mais de R$ 3 mil no seu cartão. O banco onde ocorreu a fraude ainda não estornou os valores, apenas os jogou na fatura do próximo mês. A jornalista acredita que os golpistas tiveram acesso aos dados do cartão por algum banco de dados. "Eu não costumo passar esse cartão com o chip dele em maquininhas, até por questão de segurança", relata.

 

Desde que teve o cartão clonado, e após conversar com um profissional de TI, a jornalista passou a utilizar cartões virtuais na hora de fazer compras online – que é onde acredita que a fraude começou. "Eu acredito que foi uma quadrilha que age dentro de comércio. Não costumo comprar em lojas desconhecidas pela internet, mas esses lugares não têm como controlar as pessoas que trabalham lá", conta.


COMO SE PROTEGER

Outra modalidade de golpe digital abordada pela pesquisa do DataSenado envolve as invasões bancárias, nas quais criminosos acessam os aplicativos de banco das vítimas e, assim, fazem transferências bancárias ou solicitam empréstimos. O especialista em TI Rafael Franco defende que a principal dica para se defender das invasões é utilizar os aplicativos dos bancos em vez de acessar o internet banking pelo computador.

 

"Ao baixar o app direto das lojas oficiais, você está contando com uma verificação a mais de que aquele aplicativo é válido e confiável. É diferente de colocar no Google o nome do seu banco e eventualmente cair numa página de fraude", explica. Mas acessar o banco pelo celular não significa, necessariamente, que o usuário estará livre de invasões. Pode acontecer de o aparelho estar com algum vírus que direcione o acesso para versão falsa do aplicativo.

 

 

"Outra dica importante é evitar clicar em links recebidos por mensagem estranhas, tanto por SMS quanto por WhatsApp e e-mail. Mensagens que geralmente têm ofertas boas demais para ser verdade, como a de que você vai receber pontos de promoção de que você nem participou, vagas de emprego com salários muito altos ou promoções absurdas", exemplifica Rafael Franco.


O QUE DIZEM OS BANCOS

A recomendação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) é que clientes que tenham sido vítimas de crime digital notifiquem imediatamente seus bancos para que medidas adicionais de segurança sejam adotadas, como bloqueio do app e senha de acesso, e que seja feito um boletim de ocorrência.

 

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Segundo a Febraban, o sistema bancário "possui robustas estruturas de monitoramento de seus sistemas e utiliza o que há de mais moderno em termos de tecnologia e segurança da informação". Ainda, que os bancos associados deverão investir quase R$ 48 bilhões em tecnologia e segurança da informação e 10% desse total serão voltados para prevenção a fraudes e para segurança.

 

"A Febraban assinou recentemente um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o Ministério da Justiça e Segurança Pública que possibilitará o intercâmbio de conhecimentos, tecnologias, metodologias, capacitação de pessoas e colaboração mútua para o desenvolvimento de projetos e atividades de interesse comum", acrescentou.