Indígenas e outros atingidos do rompimento de Mariana fazem manifestação por justiça em frente ao edifício Rolls da Royal Courts of Justice em Londres -  (crédito: Mateus Parreiras/EM/D.A.Press)

Indígenas e outros atingidos do rompimento de Mariana fazem manifestação por justiça em frente ao edifício Rolls da Royal Courts of Justice em Londres

crédito: Mateus Parreiras/EM/D.A.Press

Londres - Entre acordos e repactuações, os atingidos pelo rompimento da Barragem do Fundão consideram que o processo que começou nesta segunda-feira (21/10) e segue até 5 de março de 2025 (confira o calendário abaixo) contra a mineradora BHP, em Londres, seja o único em que ainda há chance de uma das empresas responsáveis pelo rompimento da Barragem do Fundão ter sua culpa respaldada por uma condenação judicial. O barramento era operado pela Samarco, mineradora controlada pela BHP e a Vale.

 

 

 

"Eu quero a condenação. Espero muito que a Corte bata o martelo e condene os culpados. É muito fácil matar 19 pessoas, matar o rio e ficar impune por aí. Não é tanto a indenização, o dinheiro. Prometi para a minha família que quem matou o meu marido iria pagar. E é só aqui (em Londres) que podem ser condenados", desabafa Ana Paula Auxiliadora Alexandre, de 49 anos, viúva de Edinaldo Oliveira de Assis, um dos funcionários terceirizados da Samarco morto pelo rompimento.

 

 

 

"Um bom final para este julgamento seria um final rápido. Falo com as vítimas sobre as quantias vultosas, a compensação, mas para ser honesto, ninguém quer nada menos do que a responsabilização dessas companhias. Ninguém vai ser preso por esse crime. Os procedimentos criminais no Brasil já prescreveram. O julgamento (em Londres) será a chance de examinar as provas, interrogar e saber o que os executivos da BHP sabiam e que sejam responsabilizados", afirma Tom Goodhead, sócio-diretor global e presidente executivo do escritório Pogust Goodhead que representa os atingidos na Inglaterra.

 

A BHP alega não ter o nível de controle da Samarco - empresa que operava a barragem - capaz de impedir o rompimento.

 

 

O valor da indenização é estimado em R$ 248 bilhões (U$44 bilhões). São representados pelo Pogust Goodhead 620 mil atingidos, 46 municípios e 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas.

 

Nesta primeira semana, os advogados dos atingidos e da BHP vão expôr o caso oralmente na Royal Courts of Justice - que é o tribunal de última instância na Inglaterra, mas sem atribuições constitucionais como o Supremo Tribunal Federal, no Brasil.

 

 

Nos dois primeiros dias os advogados dos atingidos tentarão demonstrar que a BHP sabia dos riscos de um rompimento da Barragem do Fundão. Nos dois dias seguintes, até a quinta-feira (24/10), o papel dos advogados da empresa será o de refutar esse conhecimento e poder de decisão.

 

Ana Paula Auxiliadora Alexandre perdeu o seu marido no rompimento. Edinaldo era trabalhador tercerizado da Samarco

Ana Paula Auxiliadora Alexandre perdeu o seu marido no rompimento. Edinaldo era trabalhador tercerizado da Samarco

Mateus Parreiras/EM/D.A.Press

 

O julgamento ocorre em um dos edifícios da Royal Courts of Justice, o chamado edifício Rolls, onde funciona a Vara de Negócios e Propriedades das Cortes da Inglaterra e do País de Gales. No interior, além dos defensores, procuradores e representantes de municípios como Ouro Preto, Barra Longa, Baixo Guandu (ES) e Marilândia (ES) também compareceram como representados pelo Pogust Goodhead.

 

Em frente ao moderno edifício de aço e vidros, indígenas Krenak e Pataxó com cocares, adereços e pinturas típicas entoaram seus cânticos tradicionais enquanto pediam por justiça. Atingidos expunham cartazes para as pessoas que entravam na corte com roupas formais, mostrando a água suja e escura de lama do Rio Doce em garrafas.

 

O rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, a 120 km de Belo Horizonte, lançou cerca de 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e lama na bacia hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e o mar entre o Espírito Santo e o sul da Bahia.

 


Ao todo foram 46 municípios e 700 mil pessoas atingidas. Morreram 19 pessoas, sendo que um corpo jamais foi recuperado e uma grávida perdeu o filho. A linha de poluição segue por 675 quilômetros só nas calhas dos rios Gualaxo do norte, do carmo e Doce. Foram recolhidas 11 toneladas de peixes mortos e devastados 800 hectares de mata atlântica.

 

Há uma expectativa sobre um acordo brasileiro de cerca de R$ 170 bilhões para indenizar entes de governo, municípios, vítimas e familiares pelo rompimento em Minas gerais e no Espírito Santo. A negociação é entre a Samarco, que é a mineradora que operava a barragem rompida, a BHP Billiton e a Vale - controladoras da Samarco - os governos de Minas Gerais, Espírito Santo, mas segue em segredo de Justiça.

 

A BHP afirma que não tinha o nível de controle em relação à Samarco para evitar o rompimento, afirmando que empresa controlada pela mineradora e a Vale "sempre foi uma empresa com operação e gestão independentes".

 

Tom Goodhead, sócio-diretor global e presidente executivo do escritório Pogust Goodhead que representa os atingidos na Inglaterra

Tom Goodhead, sócio-diretor global e presidente executivo do escritório Pogust Goodhead que representa os atingidos na Inglaterra

Mateus Parreiras/EM/D.A.Press
 

 

"Continuamos a trabalhar em estreita colaboração com a Samarco e a Vale para apoiar o processo contínuo de reparação e compensação em andamento no Brasil. O rompimento da barragem de Fundão da Samarco foi uma tragédia e nossa profunda solidariedade permanece com as famílias e as comunidades atingidas", informou.

 

"A Fundação Renova, criada em 2016 como parte do primeiro acordo com as autoridades públicas brasileiras, já destinou mais de R$ 37 bilhões em auxílio financeiro emergencial, indenizações, reparação do meio ambiente e infraestruturas para aproximadamente 430 mil pessoas, empresas locais e comunidades indígenas e quilombolas", informou a BHP.

 

"A BHP Brasil está trabalhando coletivamente com as autoridades brasileiras e outras partes buscando soluções para finalizar um processo de compensação e reparação justo e abrangente, que mantenha os recursos no Brasil para as pessoas e o meio ambiente brasileiro atingidos. A BHP continua com sua defesa na ação judicial no Reino Unido, que duplica e prejudica os esforços em andamento no Brasil", afirma a empresa.


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JULGAMENTO EM LONDRES


Programação do julgamento dos atingidos contra a BHP na Ingaterra


- 14 a 17 de outubro de 2024

Estudo dos autos pela juíza, sem audiência em corte

 

- 21 a 24 de outubro de 2024

O julgamento começará com as declarações iniciais da BHP e dos advogados dos atingidos


- 21 a 22 de outubro de 2024

Os advogados dos atingidos expõem o caso e cobram da BHP indenização pela tragédia

 

- 23 a 24 de outubro de 2024

É a vez de a BHP se defender das acusações

 

- 28 a 14 de novembro de 2024

Interrogatório pelos advogados dos atingidos e defensores da empresa à diretores da BHP, agentes de governança indicados para a Samarco entre outros


- Dia 18 de novembro de 2024

Oitiva dos especialistas em direito brasileiro. Serão três escolhidos pela BHP e três pelo Pogust Goodhead para nortear a corte sobre o direito brasileiro ambiental, civil e corporativo

 

- 13 a 16 de janeiro de 2025


Depoimento de especialistas de geotecnia (para falar das condições das barragens, métodos de segurança, prevenção, causas do rompimento entre outros). Possivelmente poderão ser ouvidos também especialistas em licenciamento.

 

- 5 de março de 2025

 

Fim do julgamento e a sentença de inocência ou culpa para a BHP. Serão cerca de três meses para a apresentação dos valores a serem indenizados em caso de condenação