O trem da preservação apita com força, na noite desta terça-feira (1/10), em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Construído em 1909, o prédio da antiga estação abre as portas à comunidade como Centro Cultural Estação Ferroviária, com destaque para uma escola de música em homenagem ao maior compositor da cidade no período colonial, Miguel Teodoro Ferreira (1788-1818), autor de peças barrocas apresentadas em vários países.

 

 

De acordo com a Prefeitura de Caeté, responsável pelo projeto e execução da obra de restauro do imóvel, a escola de música atenderá 120 alunos, em três turnos. Na estação resgatada da total degradação, haverá ainda biblioteca de estudos históricos contendo documentos centenários da cidade nascida da Vila Nova da Rainha (fundada em 1714), uma das sete vilas do ouro de Minas.

 

O imponente equipamento cultural ficará sob administração da Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e Patrimônio e da Fundação Casa da Cultura de Caeté, a qual foi proponente do projeto de restauro que, após aprovado, teve patrocínio da empresa AngloGold Ashanti, com recursos no valor de R$ 942 mil, via Lei Federal de Incentivo à Cultura. “A restauração da estação ferroviária deixa claro que nosso governo cuidou de todas as áreas, da saúde, da educação, da cultura e do nosso patrimônio. Agradecemos à AngloGold Ashanti, que fez o aporte de recursos para que essa obra se concretizasse e pudéssemos devolver o prédio ao povo, após quase 40 anos desativado”, afirmou, durante a cerimônia de reabertura, o prefeito Lucas Coelho.

 



 

As intervenções na edificação doada ao município pela União e tombada pelo patrimônio local começaram no ano passado, com atraso de três anos devido, segundo nota da prefeitura local, “a burocracias do governo federal e aos aumentos sucessivos nos valores dos materiais da obra”. O projeto contemplou ainda a parte estrutural e estética e paisagismo, com novo jardim.

 

A inauguração nesta terça-feira tem exibição do documentário "Trilhos de arte e memória", sobre a história do transporte ferroviário em Caeté, produzido pelo Museu Regional de Caeté, e apresentação de “Músicas que andam nos trilhos”, coordenada pelo Maestro Henrique Reis, professor responsável pela escola de música.

 

Degradação

 

Em 10 de janeiro de 2021 e em 9 de maio de 2023, o Estado de Minas mostrou a situação de penúria da centenária estação ferroviária de Caeté que cumpriu, por muito tempo, o papel de porta de entrada e saída para mercadorias e embarque-desembarque para moradores e viajantes.

 

Conforme destacou a reportagem do EM, a decadência da estação e do transporte ferroviário permitiram que os terrenos das imediações fossem invadidos, cedendo espaço a diversas edificações irregulares no entorno. O bem histórico se tornou alvo de vandalismo, depredação e invasão, situação que cresceu com a saída do posto da Polícia Militar do local.

 

 

Localizado do Centro da cidade, quase no limite com o bairro Bonsucesso, o bem histórico ficou mais de duas décadas desocupado e se encontrava muito degradado, em clima de abandono, não mostrando nem a sombra da movimentação de tempos atrás, pelo que se vê nas fotografias e se ouve nos relatos.No passado, o ramal ferroviário ligava a capital a Santa Bárbara, Barão de Cocais e Nova Era, recebendo os primeiros passageiros em 1908.

 

Para os moradores, a nova estação é um presente. Proprietário da Farmácia Ideal, onde há um museu, e pesquisador da história da terra natal, Antônio Maria Claret Chagas, de 78 anos, se lembra de outros tempos da estação ferroviária, tanto que transformou essa memória em poesia, hoje na página do livro “Caeté, em história & poesia”. Assim escreveu: “Quando te vejo de longe/Dos primórdios da minha vida/Toda esguia, imponente/Quanta vontade hoje eu sinto/De dar-te vida novamente”.

 

Estação Ferroviária de Caeté antes da reforma

Prefeitura de Caeté/divulgação

 

“Minha estação esquecida/Depredada, maltratada/Hoje somente tua torre/Pede clemência “pros céus”/Teu entorno poluído/Favela de “céu aberto”/Onde o errado que é certo/Desafia a quem quiser (...) E eu que sonhei contigo outro dia/Que estavas toda imponente/Toda sorriso pra gente/À espera do trem que não vem”.

 

Plataforma do tempo

 

Segundo pesquisas, o ramal de São José da Lagoa (atual Nova Era), que atenderia à estação de Caeté, foi construído por uma empresa particular de capital estrangeiro, a Companhia Estrada de Ferro Espírito Santo a Minas. Documentos encontrados esclarecem que, naquele fim do século 19, onze anos antes da inauguração de Belo Horizonte (1897), a linha já estava adiantada na região de Sabará, restando somente a finalização da ponte sobre o Rio das Velhas para se ligar à Central do Brasil. Em 1908, a companhia já se chamava Estrada de Ferro Sabará a Santa Bárbara."

 

Com a chegada da linha férrea e das antigas locomotivas maria-fumaça, o comércio existente no Centro de Caeté foi favorecido "pela entrada de uma diversificada mercadoria que chegava, e hospedarias e pensões na cidade também se fizeram necessárias à medida que passaram a receber visitantes".



Com a estação ferroviária chegou a luz elétrica na cidade, em 1915, e "os postes de iluminação, inicialmente de madeira retorcida, foram espalhados no entorno da estação". Na década de 1990, foram substituídos pelos de concreto.

 

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No prédio para embarque-desembarque de carga e passageiros trabalhava o chefe da estação – o chefe tinha como função gerenciar todo o funcionamento da estação, comandando uma equipe formada por auxiliares e encarregados das manobras. Toda essa memória se torna mais vida com o resgate, das sombras, do agora reluzente prédio da estação.

 

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