"Dos cafezais aos hospitais". A frase não só define, em poucas palavras, a trajetória de José Reinaldo Rosa Lopes, como também nomeia o primeiro livro lançado pelo lavrador que superou a baixa escolaridade e a falta de dinheiro, conseguindo se alfabetizar aos 19 anos e conquistar, aos 38, o sonho de ser médico.

 

Agora, aos 46, José se prepara para contar sobre sua história e sua segunda obra, "Dos cafezais à Medicina do Trabalho", em um congresso internacional em Belo Horizonte.

 

 

Natural de Monte Belo, no Sul de Minas Gerais, o médico deixou a escola aos 14 anos para trabalhar na roça. "Nunca frequentei a escola como deveria. Meus pais saíam para trabalhar, eram cortadores de cana-de-açúcar, tinham muitos filhos para criar. Eu ia para a escola para comer, tomava uma sopa e ia para a rua até meus pais voltarem", relembra. 

 



 

O médico, então, parou de estudar para começar a trabalhar. "Fui plantar e colher café, cortar cana para fazer cachaça e cuidar do gado. Saí sem saber ler e escrever direito, analfabeto funcional", diz. Em um dado momento, no entanto, José Reinaldo precisou acompanhar uma irmã no hospital, que ficou dois meses internada. "Lá eu me apaixonei pela medicina. Depois da alta, saí com o desejo de me tornar médico. Resolvi 'arregaçar as mangas' e voltar aos estudos", conta. 

 

Caminho até a medicina

 

 

Na época, José realizou o supletivo com auxílio do programa Telecurso 2000 para concluir o ensino médio. "Assisti às aulas noturnas, comprei todas as apostilas e acordava sempre nos horários que passavam as aulas. Ao mesmo tempo continuei trabalhando na roça". 

 

Aos 22 anos, o médico foi aprovado no curso profissionalizante de enfermagem. "Eu era muito inocente, não sabia que medicina era tão concorrido, que precisava de uma boa formação básica e prestar vestibular. Não tinha noção dessas coisas. Conversei com uma das médicas que cuidou da minha irmã na internação e ela me explicou algumas coisas, mas grande parte fui descobrindo sozinho", recorda. Assim, José Reinaldo conquistou seus primeiros estágios como auxiliar de enfermagem, em dois hospitais. 

  

Dez anos depois, o médico deu mais um passo em direção ao sonho e se tornou o primeiro da família a chegar à faculdade. "Passei em uma universidade particular de Ribeirão Preto, em São Paulo. A reitora da instituição ficou sabendo da minha batalha desde os 19 (anos) e me ofereceu uma bolsa de estudos de 100%", recorda. 

 

 

Durante o curso, ele comenta que sentiu a "sequela" dos estudos e que precisou se esforçar mais do que aqueles que possuíam uma base escolar. "Fiquei mais tempo na biblioteca, comecei a ler mais, principalmente Guimarães Rosa, e tomei gosto pela literatura. Mas nunca me deixei pensar que era inferior aos outros, eu estava ali de igual para igual", afirma José.

 

Seu pensamento o impulsionou ao longo dos seis anos de curso, até concretizar seu desejo e chegar à tão esperada formatura, e finalmente conquistar o diploma. 

 

Medicina do Trabalho 

Hoje, José Reinaldo atua na Santa Casa de Areado, onde reside, no Sul de Minas, como diretor-técnico. Além disso, é médico reconhecido pela Associação Brasileira de Medicina do Trabalho (ABMT), especialidade que lida com as relações entre a saúde dos homens e mulheres trabalhadores e seu trabalho, especialmente nos cafezais, visando não somente a prevenção das doenças e dos acidentes do trabalho, mas a promoção da saúde e da qualidade de vida. 

 

Obras literárias

José Reinaldo já lançou dois livros, sendo o primeiro "Dos cafezais aos hospitais", uma espécie de autobiografia que narra as dificuldades superadas até conseguir realizar o sonho. A verba da obra foi toda destinada à Santa Casa. 

 

Já o último, intitulado "Dos cafezais à Medicina do Trabalho", discorre sobre a trajetória como médico. "Os dois são uma forma de inspirar outras pessoas que não tiveram oportunidade de estudar, ou que acham que não dá tempo", ressalta. 

 

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Congresso Internacional

José Reinaldo se prepara agora para participar do 1º Congresso Internacional da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais (I CIEL), que ocorre nos dias 21 e 22 de outubro de 2024 no Teatro Feluma, em Belo Horizonte. "Vou contar um pouco da minha história, embora eu não seja um palestrante, o intuito é passar um incentivo para o público", conclui.

 

*Estagiária sob supervisão do subeditor Gabriel Felice

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