Minas Gerais registrou uma queda de 24% no número de feminicídios de janeiro a setembro deste ano, em comparação com o mesmo período de 2023. Por outro lado, apesar da redução, as tentativas de assassinato de mulheres por questões de gênero tiveram um aumento expressivo de 62,18% no mesmo período – casos que poderiam ter inflado a primeira estatística.


Segundo a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), o total de crimes que acabaram com a morte da vítima caiu de 142 em 2023 para 108 este ano. No entanto, 193 mulheres sofreram atentados contra suas vidas até setembro, em comparação a 119 tentativas de feminicídio no mesmo período do ano passado.


“O grande valor que vamos proteger é a vida, e essa redução do homicídio consumado reflete 34 vidas que foram poupadas. Número que nos interessaria se fosse de uma, que é uma mulher que deixa de morrer no estado de Minas Gerais”, afirma a subsecretária de Prevenção à Criminalidade da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Christiana Dornas, durante coletiva de imprensa realizada na Cidade Administrativa nessa quarta-feira (16/10).

 




Quanto ao aumento das tentativas de feminicídio, Christiana Dornas explica que isso se dá por um conjunto de circunstâncias, como a conscientização das vítimas e da população como um todo, que acionam a polícia quando identificam uma situação de violência contra a mulher, evitando que se torne homicídio consumado.

Outro possível fator, conforme ela, é a melhoria do entendimento das forças policiais para identificar crimes motivados por gênero, diferenciando-os de outros tipos de violência, e até mesmo a reação do agressor, que pode tentar matar a mesma mulher mais de uma vez, quando interrompido na primeira tentativa.


“Nós temos uma mulher que denuncia mais, que aciona mais a PM, e uma comunidade que se mobiliza para proteger essa mulher e denunciar o que está acontecendo. Talvez isso reflita até na redução do homicídio consumado, porque o homem tenta mais, e a gente precisa intervir uma segunda ou terceira vez”, explica Christiana.

 


A conscientização das mulheres, segundo ela, também pode ser notada no número de pedidos de medidas protetivas, que aumentaram 4,9%, de 39.640 registros entre janeiro e agosto de 2023 para 41.596 no mesmo período deste ano.


Algo a se comemorar?

 

“Comemoramos que o consumado diminuiu, mas temos que pensar que o tentado ainda está em alta. Não é porque reduziu a consumação que as violências têm diminuído. A tentativa ainda é uma violência; se o agressor tentou, é porque queria matá-la”, afirma Ariane Martins Moreira, vice-presidente da Comissão de Enfrentamento à Violência Contra Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais (OAB-MG).


Ela explica que o aumento de atentados normalmente são crimes passionais. “Nesses crimes, a mulher consegue, às vezes, evitar que seja consumado, porque o agressor já demonstra sinais como um ciúme patológico e doentio, e normalmente vê a vítima como propriedade dele, tanto que a maioria dos casos se dá no fim do relacionamento, quando o acusado não aceita o término.”


A consumação caiu, mas as tentativas aumentaram, ou seja, as mulheres ainda estão correndo risco de vida da mesma forma, conforme analisa a especialista. “Precisamos trabalhar na prevenção, levando informações às mulheres para que elas consigam romper desde o início e não dar sequência a esse tipo de relacionamento, porque o feminicídio é a última violência, quando o homem literalmente cala a mulher”, orienta Ariane.


Além disso, a vice-presidente da comissão aponta a falta de denúncia. “Grande parte das mulheres tem medo e vergonha, e sofre com a falta de apoio das pessoas ao redor para sair do ciclo de violência”, ressalta a advogada.

 


Ela destaca ainda que a dependência emocional e financeira também é um fator da sociedade machista e patriarcal, que inibe as acusações ao fazer com que a mulher normalize as violências sofridas no relacionamento, . “A vítima não consegue identificar que o agressor está tentando dominá-la. É um ciclo vicioso. A menina vê a mãe aceitando abusos do pai e reproduz na própria vida, ou o filho que vê o pai sendo violento e autoritário, e se torna uma pessoa também agressiva.”

 

Segundo Ariane, a melhor forma de prevenir as tentativas é a educação. “Precisamos introduzir isso na educação das crianças. É preciso ensinar as meninas a se empoderar e os meninos a respeitar. Não basta falar para as mulheres, temos que nos direcionar aos homens, em todos os setores, até porque elas estão morrendo na mão deles”, ressalta.


Entendendo que a prevenção da violência contra a mulher deve ser abordada por várias frentes, os programas ‘Mediação de Conflitos’ e ‘Central de Acompanhamento de Alternativas Penais’, do governo de Minas, visam trabalhar a conscientização de homens que cometeram agressões contra mulheres. O objetivo, segundo Christiana Dornas, é quebrar o ciclo de violência e desconstruir comportamentos machistas.


Segundo os dados da Sejusp, até outubro deste ano, 2.747 homens foram encaminhados para o cumprimento de alternativa penal em grupos de responsabilização e foram realizadas 1.301 intervenções por meio da mediação de conflitos.

 


Outra medida é o monitoramento de agressores por meio de tornozeleiras eletrônicas 24 horas por dia pela Policia Penal. Minas é o primeiro estado a implantar o sistema, que é coordenado pela Secretaria de Justiça. Quando uma tornozeleira é instalada, um dispositivo móvel pode ser retirado pela mulher que solicitou a medida protetiva.


Se o agressor se aproximar, o aparelho da vítima vibra e uma luz muda de cor. A Polícia Penal, então, entra em contato com ela, para dar orientações, e com a Polícia Militar para mantê-la segura. O dispositivo também conta com um botão de emergência, que pode ser acionado a qualquer momento que a mulher se sentir ameaçada. Atualmente, são 1.153 monitorados, sendo 695 agressores e 458 vítimas.


Além disso, a major Layla, porta-voz da Polícia Militar, informou durante a coletiva que a corporação realizou uma força-tarefa para prender pessoas com mandados de prisão em aberto e que tinham passagem por violência contra a mulher. Foram 116 presos no mês de agosto e outros 14 em setembro. Os militares também registraram cerca de 4 mil prisões em flagrante por violência doméstica nos últimos 45 dias.

 

 


Pedido de socorro

 

A major Layla ainda ressalta a importância da denúncia, uma vez que mais de 90% das vítimas de feminicídio não fizeram o pedido de medida protetiva na justiça. “É importante que essa mulher entenda que desde a primeira violência, mesmo que verbal, moral ou psicológica, ela deve procurar a delegacia de atendimento à mulher e solicitar as medidas protetivas. Isso vai desembocar de fato na diminuição do feminicídio.”


A Sejusp também anunciou a expansão do Emergência MG, que permite acionamento da Polícia Militar, Polícia Civil e Corpo de Bombeiros pela internet. O serviço, que está disponível para todos, tem o foco em situações nas quais as mulheres vítimas de agressão estão no mesmo ambiente que o agressor.


A denúncia pode ser feita por chat, de forma silenciosa, com a possibilidade de enviar fotos, vídeos e geolocalização. “É uma ferramenta de fato inovadora que veio transformar a forma de acessar as forças policiais nas emergências e que mostra mais uma vez a integração das forças de segurança do estado”, declarou Christiana Dornas. A iniciativa passou a funcionar ontem em mais 46 cidades mineiras, totalizando 107 municípios atendidos pela ferramenta.

 

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Outro canal de denúncia é o Chame a Frida, chatbot via WhatsApp da Polícia Civil que está disponível em 90 cidades mineiras. Também é possível fazer o registro de ocorrências de ameaça, agressão e descumprimento de medidas protetivas pelo site: delegaciavirtual.sids.mg.gov.br/sxgn

 

Os canais tradicionais seguem à disposição. Em caso de emergência, ligue:
190 - Polícia Militar
197 - Polícia Civil
193 - Corpo de Bombeiros
181 - Disque Denúncia 

 

*Estagiária sob supervisão da editora Vera Schmitz

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