Crânio e fragmentos de ossos encontrados em 1939, em Sete Lagoas, e expostos em Ouro Preto há 70 anos, podem  ser de contemporâneo de

Crânio e fragmentos de ossos encontrados em 1939, em Sete Lagoas, e expostos em Ouro Preto há 70 anos, podem ser de contemporâneo de "Luzia", considerada a primeira brasileira

crédito: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A PRESS

Ouro Preto – A coluna “Nossa História, Nosso Patrimônio” de hoje vai um pouco mais longe no tempo... aliás bem mais longe. Vamos até cerca de 12 mil anos atrás, a pré-história de Minas, lá no tempo de “Luzia”, o fóssil humano com datação mais antiga do país. Chamada de a primeira brasileira, “Luzia”, cujo crânio foi encontrado em 1975 na região cárstica de Lagoa Santa, na Grande BH, quase sumiu por completo durante o trágico incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro (RJ), em 2 de setembro de 2018. Mas boas surpresas existem, e uma delas se encontra no Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop): a ossada de um homem que pode ter sido contemporâneo de “Luzia”.

 

O crânio masculino e os fragmentos ósseos se encontram no setor de História Natural do museu, localizado no antigo Palácio dos Governadores, na Praça Tiradentes, no Centro de Ouro Preto, Região Central de Minas Gerais. O ‘personagem’ ilustre da instituição é apresentado pelo geólogo Anderson Vital Sales, curador das exposições. De acordo com Anderson, ‘a ossada’ foi encontrada em 1939 por integrantes da Sociedade Excursionista e Espeleológica, fundada dois anos antes por alunos da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (SEE/EM). “Tudo indica que o indivíduo viveu entre 10 mil e 12 mil anos atrás, embora sejam necessárias investigações adicionais para obtermos mais informações”, destaca.

 

Encontrado 36 anos antes de “Luzia” – fóssil que veio à superfície em escavações na Lapa Vermelha IV, pela arqueóloga Annette Laming Emperaire (1917-1977), então chefiando uma missão franco-brasileira –, o crânio do homem ficou no laboratório de Paleontologia da Escola de Minas até ser levado à sala de exposição, onde passou a integrar a coleção após a abertura do setor de História Natural. “Não se sabe se todos os fragmentos que compõem o esqueleto são do mesmo homem pré-histórico”, observa o geólogo. Ao lado da vice-coordenadora do museu, Daniela de Oliveira Pereira, ele explica que o crânio e demais ossos foram localizados na entrada da Lapa da Pontinha, em Sete Lagoas, na Região Central do estado.

 

 


DESCRIÇÃO

 

Em 1983, a professora de paleontologia do Departamento de Geologia da Escola de Minas da Ufop, Áurea Duarte Pereira Pinto, fez a descrição de “um dos exemplares fósseis que temos em nosso Laboratório de Paleontologia”, embora com ressalva: “Por se tratar de um tema polêmico, uma vez que é fácil apontar falhas nas teorias que objetivam explicar fatos que ocorreram em um passado distante, deixamos claro que as nossas conclusões, longe de serem definitivas, servem para mostrar que o tema em foco é realmente apaixonante.”

 

A professora explicou que os primeiros fósseis coletados na região de Lagoa Santa foram estudados por P. Lund (o dinamarquês Peter Lund), no século passado (século 19), e por J. A. Padberg-Drenkpol, H. Walter, C. Paula Couto e F.L. Souza Cunha, neste século (20). Áurea jogou mais luz sobre o achado de 1939. “Apesar de ter sido encontrado com alguns ossos quebrados, o crânio foi restaurado com cera de abelha.”

O crânio é dolicocéfalo, ou seja, apresenta uma forma alongada com um comprimento maior em relação à largura, e se encontra em um avançado estado de fossilização. Os ossos frontais revelaram que a testa era alta e pouco fugidia; as cavidades orbitárias medem 3 centímetros de largura por 3,5cm de altura; arcadas supraciliares pouco proeminentes; narinas estreitas e longas.

 

Além disso, segundo a descrição de Áurea, “os dentes estavam em perfeito estado de conservação, e o desgaste na arcada dentária sugere que o indivíduo consumia muitos grãos”. A arcada apresenta uma conformação parabólica, característica do gênero ‘Homo’. Já segundo a professora aposentada do Departamento de Geologia da Universidade Federal de Ouro Preto e ex-diretora do museu, Maria Paula Delicio, trata-se “de um indivíduo jovem, evidenciado mínimos sinais de desgaste nos dentes”. Observando os crânios de perto, percebe-se uma camada avermelhada, resultado da cera utilizada.

 

A cera de abelha é usada na restauração de fósseis principalmente devido à sua composição natural e maleabilidade. “Aquecida levemente, é aplicada em fissuras e áreas danificadas dos fósseis, ocorrendo como uma espécie de adesivo temporário e reversível. Isso permite preencher lacunas sem danificar uma peça original, além de proteger o fóssil contra o ressecamento e pequenas variações de temperatura. A cera também é fácil de remover, garantindo que futuras restaurações possam ser feitas”, explica Anderson. Ele acrescenta que, embora a técnica seja adequada neste fóssil específico, como já foi feito há algum tempo, o restauro não está mais em boas condições.

 

 

TESOURO CULTURAL

 

Em 2026, a Escola de Minas vai completar 150 anos. Foi fundada em 12 de outubro de 1876 pelo cientista francês Claude Henri Gorceix (1842-1919), a pedido do imperador dom Pedro II (1825-1891). Desde 1995, o prédio colonial Ufop abriga o Museu de Ciência e Técnica, com um acervo de mais de 30 mil exemplares nos setores de história natural (fósseis, materiais líticos, coleções de conchas, vestígios da pré-história e outros), mineração, mineralogia (um mais completos do mundo em minerais, é referência internacional), metalurgia, química, física, desenho, topografia, astronomia, siderurgia e transporte ferroviário. Outros destaques: observatório astronômico, centro de memória da Escola de Minas, biblioteca de obras raras e arquivo permanente da Escola de Minas. O museu se encontra fechado há quatro anos, e passa atualmente por obras para emissão do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). A expectativa é de que seja reaberto em 2026 para as festividades dos 150 anos de fundação

 

ALERTA GERAL CONTRA OS...

Alvo de ladrões durante décadas, o patrimônio cultural de Minas volta a sofrer ameaças. A Arquidiocese de BH divulgou comunicado alertando para a ação de falsos restauradores. Eles agem assim: procuram pessoas que trabalham em igrejas, capelas e mosteiros e oferecem seus serviços. Falam da sua “experiência” na área de restauro e até apresentam documentos.

 

 

...FALSOS RESTAURADORES

Por isso, tome nota: processo de restauração de um bem histórico-cultural envolve processos legais e técnicos específicos. O trabalho precisa ser assessorado e acompanhado, em todas as etapas, pela equipe do Memorial Arquidiocesano, que também auxilia as comunidades na salvaguarda do patrimônio. Qualquer dúvida, entre em contato com o memorial, que fica na Rua Mármore, 500, Bairro Santa Tereza, na capital. Mais informações pelos telefones (31) 3465-6202 e 3465-6200 ou pelosemails: memorialcoordenacao@arquidiocesebh.org.br e memorialsecretaria@arquidiocesebh.org.br

 

PAREDE DA MEMÓRIA

A Escola de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a “Vetusta Casa de Afonso Pena”, completa 132 anos em 10 de dezembro reafirmando sua excelência como instituição de ensino das leis, templo da memória de Minas e celeiro na formação de profissionais. Fundada em Ouro Preto com o nome de Escola Livre de Direito, a escola migrou para BH um ano após a inauguração da capital, sendo o primeiro curso de ensino superior da cidade. Instalou-se num imponente prédio neoclássico (foto) na Praça Afonso Arinos, no Centro. Mas em 1958 a edificação foi demolida, erguendo-se em seu lugar o edifício Villas-Boas, e, mais tarde, o Valle-Ferreira e a biblioteca.

 

DIÁLOGO NOBRE

Três séculos de intercâmbio cultural, arquitetônico e urbanístico unem a França e o Brasil. Estudos a respeito desses laços estão no livro “Civilização e Liberdade” (Editora Autêntica), organizado pelo arquiteto e professor Flávio de Lemos Carsalade. A obra detalha o impacto francês na arquitetura mineira do período colonial à atualidade, passando pelo Barroco, o neoclássico e o art déco até chegar ao modernismo. Participam da coletânea Angelo Oswaldo de Araújo Santos, Carlos Alberto Maciel, Carlos Antônio Leite Brandão, Celina Borges Lemos, Danilo Matoso Macedo, Esther Aparecida Cervini de Melo, Jean-Pierre Blay e Roberto Luís Monte-Mór. O livro pode ser adquirido nas livrarias físicas e on-line.

 

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CARAÇA DA HUMANIDADE

Continua firme e forte a campanha da ACMinas para reconhecimento do Santuário do Caraça como patrimônio documental da humanidade, pela Unesco. A candidatura tem o objetivo de fomentar o turismo e fortalecer a preservação do espetacular monumento arquitetônico e paisagístico. O mais novo passo para a conquista do título está no longa-metragem “Caraça 250 anos”, em fase de captação de recursos para início da pré-produção.