A mãe de um menino autista diz que está sendo processada depois de denunciar a suposta recusa da matrícula do filho nas redes sociais  -  (crédito: Reprodução/Google Street View)

A mãe de um menino autista diz que está sendo processada depois de denunciar a suposta recusa da matrícula do filho nas redes sociais

crédito: Reprodução/Google Street View

A mãe de um menino autista denuncia estar sendo vítima de coação por parte de uma escola particular de Belo Horizonte. A instituição de ensino ajuizou uma ação contra ela, depois da mãe relatar a recusa da escola em matricular seu filho, por discriminação. 

 


A advogada Consuelo Prates, mãe de Davi, de 13 anos, disse que precisou mudar o filho de escola em julho do ano passado. O motivo, segundo ela, é que o menino vinha sofrendo bullying dos colegas e era vítima de perseguição da coordenadora. A situação ficou insustentável depois que o filho foi agredido fisicamente por colegas. Ele estudava no Coleguium, unidade Gutierrez, na Região Oeste de Belo Horizonte. 


A mãe procurou, então, o Colégio ICJ (Instituto Coração de Jesus), localizado no Bairro Nova Suíça, também na Região Oeste, além de uma outra escola, onde o menino estuda atualmente. Consuelo conta que foi apresentada à estrutura física da instituição de ensino e conversou com a coordenadora. A funcionária quis saber a razão da mudança de escola. 

 

 

“Expliquei que ele vinha sofrendo bullying, que ele era autista, tinha TDAH e que eu precisava de uma escola que tivesse condições de atendê-lo, no que ele precisa. Não omiti nenhuma informação da escola”, relata. 


A mãe diz ainda que quis saber sobre a proposta pedagógica, mas a coordenadora já não passava mais nenhuma informação do tipo. “Ela disse que já tinham cumprido a cota de pessoas autistas na sala porque já tinha um autista. A partir disso, tudo o que eu questionava, ela voltava para a questão de cotas. Não falou que a matrícula ia ser recusada, mas alegava que já tinham cumprido a cota”, ressalta.


'Situação grave e revoltante'

Na época, a mãe chegou a fazer uma denúncia na Secretaria Estadual de Educação. A escola negou que tivesse recusado a matrícula e a pasta alegou que não poderia fazer nada. Consuelo afirma que ficou muito abalada psicologicamente na época e, por isso, não tomou nenhuma atitude. 


“Agora que estou retomando esse assunto. Sou ativista na causa da pessoa com deficiência. Tive relatos de várias mães que passaram por problemas semelhantes em outras escolas de Belo Horizonte, inclusive. Decidi denunciar. Coloquei isso nas redes sociais e eles ajuizaram uma ação pedindo indenização por danos morais contra mim. Ou seja, a mãe não pode denunciar e ainda usam o Judiciário para coagir uma mãe atípica”, desabafa. 

 


Segundo ela, o Colégio ICJ não entrou em contato para tentar entender o que havia acontecido. Porém, agora, diante da ação, ela diz que pretende procurar o Ministério Público e denunciar. “Meu interesse não é nem uma indenização. Eu quero que isso não aconteça com mais ninguém. Não quero que ninguém passe pelo que eu e meu filho passamos. É uma situação muito grave e revoltante”.


A mãe procurou uma advogada e foi orientada a fazer um boletim de ocorrência, já que, na época, não o fez. “Fiquei sabendo disso (ação) hoje. Se eu não fizer nada, qual a mensagem que eu passo para as outras mães? Que nós temos que ficar caladas porque se denunciarmos vamos sofrer uma retaliação na Justiça”.


Ela pretende procurar a Delegacia de Defesa da Pessoa com Deficiência e registrar um boletim de ocorrência ainda hoje. A intenção é acionar a coordenadora também criminalmente, já que ela teria praticado crime de descriminação contra seu filho. Consuelo também manifestou a vontade de acionar judicialmente o antigo colégio, onde o menino teria sofrido bullying.


Em nota, o Colégio ICJ afirma que a “suposta denúncia de recusa de matrícula é inverídica, infundada e tem somente a intenção de denegrir a imagem do colégio. Nunca houve recusa de matrícula de criança autista ou com qualquer outra deficiência”.

 


A instituição confirma que Consuelo Prates procurou a escola em julho de 2023, foi atendida e orientada sobre o processo para a matrícula de seu filho. “Como era véspera do início do recesso escolar de julho, foi orientada a retornar no começo das aulas para que pudesse dar andamento ao processo. Em nenhum outro momento retornou ou procurou a escola. Mais de um ano após, a Sra. Consuelo publicou em suas redes sociais mensagem difamatória da imagem do Colégio, sugerindo que o mesmo teria infringido a lei, o que é uma absoluta inverdade”.


A escola afirma ainda que tem em seu quadro diversos alunos com deficiência e necessidades educacionais especiais. “O Colégio ICJ reafirma que nunca negou matrícula ao filho da Sra. Consuelo e coloca-se à disposição para quaisquer outros esclarecimentos”.


Já a Secretaria de Estado de Educação explicou que não tem caráter punitivo em casos como este, na rede privada. “Como se trata de um crime, a família deve judicializar a questão com os órgãos competentes, MPMG e polícia”.


Bullying e agressões

A advogada deixa claro que a intenção é denunciar a coação feita pelo Colégio ICJ, mas também pretende tomar providências em relação à antiga escola do filho, o Coleguium. O menino começou a estudar lá durante a pandemia.  


Ela conta que no primeiro ano, as aulas eram on-line por causa das restrições impostas pela COVID. “Desde que começou o presencial sempre teve alguma coisa, mas a situação piorou muito depois que a professora falou na frente da sala toda que ele era autista e que as crianças tinham que ter paciência com ele”.

 


Segundo a mãe, a partir daí, o menino começou a ser alvo de uma implicância que chegou a um nível insustentável. “Foram várias situações. A professora de português disse, uma vez, que ele fazia questão de ser chato e que colocavam a culpa em doença”. A mãe afirma que a coordenadora sempre dizia que a culpa era do menino e não tinha interesse em apurar o que, de fato, estava acontecendo, quando ia reclamar.

 

“Ela chegou a falar na frente da neuropedagoga que acompanhava o meu filho na época, quando eu exigi que ele fosse transferido para o turno da tarde: ‘Vou tirar o problema da manhã e passar para a tarde. Chegou a um ponto que não tinha como ele continuar lá”, desabafa.


A situação causou tanto estresse que o filho não queria mais ir para a escola, nem sair de casa. “Eu pedi para a psicóloga e para a neuropedagoga que acompanhavam o Davi, na época, para ir comigo nas reuniões nas escolas e me ajudar nesse processo. Eu estava sem rumo”, relembra.


Ela disse que ficou sabendo da situação pela mãe de um colega do filho. “Ele disse que a professora não tinha nenhuma paciência com o Davi, gritava com ele o tempo todo. O Coleguium tem essa prática. Toda criança que é considerada ‘indesejada’, neuro divergente, eles fazem de tudo para a mãe tirar da escola”.


Segundo a mãe, o menino tinha uma solicitação para fazer prova em sala separada, mas o colocavam para fazer prova na biblioteca. “A neuropedagoga acompanhou ele em duas provas e me relatou isso, que toda hora entrava alguém, abria a porta. Como você espera que uma criança, que tem uma dificuldade de concentração, faça uma boa prova em um ambiente de entra e sai toda hora?”.


Em nota, o Coleguium “agradece a oportunidade de se posicionar sobre o relato recebido, pois considera fundamental esclarecer essa situação”. 


Ressalta que tem como pilares o respeito e o acolhimento, valores que estão no centro de todas as ações e práticas pedagógicas. “Portanto, todos os casos reportados são avaliados e apurados com a máxima cautela. Ao longo do tempo em que o aluno mencionado esteve no colégio, foi mantido um diálogo aberto com sua família, realizando diversos atendimentos (registrados em nosso Portal), sempre buscando apoiar o aluno e oferecer um ambiente escolar acolhedor”.


A escola diz ainda que desenvolve continuamente projetos e ações contra o bullying, “visando criar uma cultura de respeito e empatia entre todos os alunos. Esse trabalho envolve tanto ações preventivas quanto educativas, nas quais os educadores e equipe de apoio se dedicam para oferecer um ambiente seguro e inclusivo para todos”. 

 

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“O colégio reforça que os atendimentos feitos aos alunos e familiares envolvidos não podem ser repassados a outros responsáveis, por questões éticas, mas assegura que todas as medidas necessárias são sempre tomadas e se coloca à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais”.