Na Alemanha, um projeto que tem à frente a embaixada brasileira, em Berlim, chama a atenção de toda a Europa, a tal ponto que outros países se interessaram e a Bélgica deve adotá-lo, em parceria com o Brasil. É o amparo à mulher brasileira vítima de violência física, psicológica ou financeira. E à frente deste está uma mineira, Alexandra Buchetmann, de 55 anos, natural de Itaobim, no Vale do Jequitinhonha.

Funcionária pública aposentada, Alexandra é casada com o engenheiro mecânico Florian Buchetmann, com quem tem duas filhas. Eles se conheceram no Brasil, onde o marido trabalhava. Mas, há 14 anos, ele foi chamado para trabalhar em seu país, e ela esperou até se aposentar para poder ir viver na Alemanha.
“Antes de me aposentar, ficava indo e vindo para a Alemanha. E quando estava aqui, além de trabalhar, fazia cursos de análise comportamental e sobre as situações e as agruras pelas quais as mulheres vivem”, diz Alexandra.


O destino, no entanto, nada planejado, a colocou em contato com a modelo e atriz Luíza Brunet, que tem ações como empreendedorismo e trabalhos sociais, tendo a mulher como foco principal.


“Num evento, eu conheci a embaixada brasileira em Berlim. Foi no maior evento realizado na Alemanha sobre empreendedorismo feminino, que era coordenado pela Luíza Brunet. O corpo consular se interessou pela ação que estávamos desenvolvendo, sobre a violência contra a mulher. Aí, conversamos e começamos a desenvolver um projeto nesse sentido, sempre tendo como alvo a mulher brasileira na Alemanha”, conta.


Era um curso gratuito, pela internet, que teve acessos do Japão. O curso ganhou notoriedade por mostrar um tripé de ações preventivas contra a violência contra a mulher. “A violência contra a mulher é um problema muito grande aqui no Brasil, e acontece com muita frequência no exterior”, explica Alexandra.


Ela conta que muitas vezes a mulher brasileira conhece um alemão e se muda para casar, indo viver naquele país. Nosso projeto é dar autonomia, liberdade para a mulher trabalhar, empreender. “Ela precisa ter liberdade financeira”.


Do sonho ao martírio

A mineira fala que a mulher sai do Brasil com uma promessa, com um sonho. “É como ela chega à Europa, mas a realidade, aos poucos, vai mudando e o sonho se torna pesadelo”. A vida da mulher brasileira, que, na maioria das vezes, sequer aprende o idioma, se torna um martírio. “Muitas vezes, ela não pode sequer sair de casa, ter o convívio com outras brasileiras, que poderiam ser suas amigas, e nem sequer tem dinheiro para andar de ônibus”.


Até hoje, foram registrados na embaixada brasileira 250 casos de acolhimento. Existe, ainda, por falta de amparo, segundo ela, o medo. A mulher não consegue sequer denunciar que está sendo vítima de abuso. “Legalizada ou não, a mulher brasileira terá sempre o nosso apoio, desse projeto. Algumas acabam sendo deportadas, outras conseguem a regularização, mas isso acontece pelo fato dela ter sido abusada.


Muitas mulheres sequer têm registro na Alemanha, mesmo sendo casada com um alemão. Um dos casos que chama a atenção e que foi atendido na embaixada foi o de uma mulher que tinha dois filhos, frutos de seu casamento, mas que ela sequer tinha seu nome escrito na certidão de nascimento dos meninos.


“Tem um caso em que a moça tinha uma filha e o pai tomou-lhe o passaporte, assim como o da criança. Ela foi deportada para o Brasil, sem a filha”, diz. “Um outro caso foi o de uma mulher que era maltratada pelo marido. Ela conseguiu sair da Alemanha e trouxe o filho para o Brasil. Mas o marido deu queixa e ela virou raptora. Nesse caso, o pai pede a guarda do filho e consegue. Ela não tem mais direitos”, relembra.
Houve uma situação, segundo Alexandra, na qual a mãe não teve direito sequer de amamentar o filho, que tinha apenas oito meses. “Ela perdeu a guarda da criança”, revelou.


Desconhecimento

Muitos desses casos, segundo ela, acontecem por desconhecimento da mulher. Elas são vítimas de violência e não sabem. Não é exigido, por exemplo, que a mulher fale alemão. Assim, ela está à mercê do marido. Não consegue emprego. Está privada de ter uma vida própria, de ter amigas. Ou seja, vive exclusivamente para o lar e para o marido. Faz todas as suas vontades, temendo por perder os filhos. “Elas viram empregadas domésticas”. conta Alexandra.


São muitos os casos, também, segundo ela, de alemães e alemãs que levam brasileiras para lá com falsas promessas e que, na verdade, são obrigadas a se prostituir. E as mulheres, em qualquer dessas situações, segundo ela, têm medo de denunciar e serem deportadas, sem qualquer direito.


“Muitas das brasileiras que foram levadas para a Alemanha saíram da favela no Brasil, e preferem ficar lá, passando por tudo isso, a voltar para o Brasil, para a miséria. Lá, estão comendo”, afirma ela.


Apoio do governo

O projeto, segundo Alexandra, tem total apoio do governo alemão, que quer combater esse tipo de crime. “O grande problema é que as alemãs não querem, em sua maioria, ter filhos. Além disso, lá, todos têm direito à escola. Não existem colégios particulares, ao contrário do Brasil. Cada casal tem o direito de receber 300 euros mensais (cerca de R$ 1.855, na cotação atual), por cada filho”, diz.


Alexandra faz esse trabalho voluntário. Sua profissão é de analista comportamental. O trabalho é reconhecido em toda a Europa e já existe, atualmente, um pedido do governo Belga para que o trabalho realizado na Alemanha, pela embaixada, seja implantado também naquele país. “Este será o próximo passo”, afirma Alexandra. 

 

 

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