O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) aceitou a denúncia contra a madrasta de Magna Laurinda Ferreira Pimentel, de 42 anos, encontrada dentro de uma cisterna em 27 de agosto deste ano, no Bairro Candelária, na Região de Venda Nova, em Belo Horizonte. A vítima havia sido dada como desaparecida quatro dias antes de seu corpo ser encontrado. Na ocasião, cinco pessoas foram presas, suspeitas de cometer o crime: a madrasta de Magna e os quatro filhos dela - dois homens e duas mulheres.

 

Conforme o documento assinado pelo juiz Roberto Oliveira Araújo Silva, do 2º Tribunal do Júri da capital, Marluce Pereira dos Santos, a madrasta, e três de seus filhos — Gilmar Pereira Calmos, Paloma Ferreira de Jesus e Paola Pereira de Jesus — se tornaram réus pelo crime. Eles foram detidos por homicídio qualificado e ocultação de cadáver.

 

As investigações da Polícia Civil de Minas Gerais apontam que o homicídio teria sido motivado por desavenças financeiras, já que a madrasta da vítima havia feito recentemente um empréstimo em nome do marido no valor de R$ 40 mil. O valor, segundo a Polícia Civil de Minas Gerais, foi gasto com jogos de apostas ilegais, celulares e outros bens.




 

O quarto filho de Marluce chegou a ser preso no dia em que o corpo de Magna foi encontrado. No entanto, um mês depois, em setembro, o desembargador Agostinho Gomes de Azevedo determinou sua soltura. Em sua decisão, o magistrado alegou que o investigado foi indiciado por ocultação de cadáver e que a decisão que decretou sua prisão preventiva “se mostra ilegal”, uma vez que “não se encontram presentes os requisitos autorizadores”.

 

Durante a liberdade provisória, o réu deverá seguir medidas cautelares, como: comparecer em juízo a cada 30 dias para informar suas atividades; proibição de ausentar-se da comarca em que reside por mais de oito dias; e a proibição de entrar em contato com familiares da vítima e possíveis testemunhas.


 

Um mês depois do homicídio de Magna, o marido dela, Tiago Arley Alves, afirmou ao Estado de Minas que, desde que o caso foi descoberto, o sogro está mais lúcido e a par dos fatos. Durante o velório, em 30 de agosto, uma amiga da família da vítima, que não quis se identificar, afirmou que os suspeitos estariam dopando o pai de Magna.

 

De acordo com ela, depois que os suspeitos foram presos, o homem, que aparentava estar com demência, se mostrou mais lúcido. “Ele está sem medicamentos. Está sabendo da situação e, inclusive, contou que chegou a ver o rapaz com a faca na mão e pensou no que ele iria fazer com isso. A gente espera justiça. Que eles fiquem lá e paguem pelo que fizeram.”


 

Relembre o caso

 

Alertada sobre o desaparecimento de Magna, a Polícia Civil acompanhou seu rastro digital. O celular mostrava uma viagem de Uber para a residência do pai às 14h28 e o último acesso ao WhatsApp às 15h. Às 17h27, foi registrada a última localização do aparelho. Os investigadores acreditam que um dos autores do crime desbloqueou o celular da vítima, que já estava morta, e o aplicativo da Uber já estava aberto. As câmeras de segurança da rua mostram que Magna não saiu da casa em nenhum momento.

 

Nos primeiros dias, a família se mostrava preocupada com a falta de notícias sobre o paradeiro de Magna, tanto para a polícia quanto para o marido da vítima. Entretanto, dois dias depois, no domingo, o grupo organizou um churrasco, o que chamou a atenção dos vizinhos. A polícia acredita que estavam comemorando o crime.


 

“Recebemos a informação de que havia uma cisterna nesta casa e fomos até o imóvel ontem para verificar a situação. Conseguimos conversar com o dono da casa, que autorizou a entrada. Entramos na residência e entrevistamos todos os moradores enquanto a equipe realizava a perícia”, relatou o delegado.


Briga por dinheiro


Em março deste ano, Marluce levou o marido até uma agência bancária e contratou um empréstimo em nome dele no valor de cerca de R$ 40 mil. Ela também teria usado a aposentadoria do homem. De acordo com a PCMG, os gastos totais foram de R$ 50 mil, sendo R$ 5 mil com jogos de aposta e R$ 4 mil com celulares. O valor da dívida foi dividido em 84 parcelas de R$ 976,00, totalizando R$ 82 mil.

 

Em junho, Magna tomou conhecimento dos gastos e teria confrontado a madrasta e a irmã, que tinham acesso às contas do pai. Na mesma ocasião, teria descoberto uma união estável entre o pai e a madrasta. Outra irmã apaziguou a briga, e a vítima foi embora da residência. A polícia acredita que, desde então, a família planejava a morte da mulher.


 

A emboscada teria sido armada inicialmente para quinta-feira (22/8), quando uma das irmãs — a que acalmou a situação — enviou uma mensagem à vítima dizendo que tinham o dinheiro para ressarcir o que foi gasto, pedindo que ela fosse buscar a quantia. Essa primeira tentativa de atrair a vítima não foi bem-sucedida. Na sexta-feira, dia do desaparecimento, a mesma irmã ligou para Magna, dizendo que o pai estava passando mal e com febre, pedindo que ela fosse até a casa para levá-lo ao hospital. Depois de deixar a filha de 3 anos na escola, Magna foi até o local, de onde não saiu mais.

 

Tiago Arley Alves estranhou que a esposa não buscou a filha na escola e tomou conhecimento do desaparecimento. A criança ainda não compreende o que aconteceu, mas sente falta da mãe. “Eu estranhei porque ela era uma mãe muito atenciosa, zelosa e compromissada. Jamais deixaria a nossa filha. Aí eu pensei: ‘aconteceu alguma coisa’”, contou.

 

Ele ainda relata que ficou chocado ao descobrir os responsáveis pelo assassinato e que não havia nada de anormal na relação de Magna com a madrasta e os irmãos.

 

“Eu não achava que eles fossem capazes de uma coisa dessas, porque a minha filhinha convivia com eles e sabia que minha filha dependia demais da Magna”, conta. “Isso me deixou chocado, revoltado e com ódio”, completou.


 

O delegado da Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida, Alexandre Oliveira da Fonseca, declarou que, se o crime tivesse ocorrido na quinta-feira, possivelmente a menina estaria com a mãe.

 

"Conseguimos apurar que o terceiro filho, o executor, já estava na casa esperando Magna chegar para executá-la. Na quinta-feira, ela não foi. Se isso tivesse acontecido, nós teríamos duas vítimas, porque, se fosse na parte da manhã, possivelmente ela teria levado sua filha de 3 anos”, explicou Fonseca.

 

Busca pelo corpo

 

Autorizados pelo pai da vítima, policiais foram até a residência para realizar buscas na terça-feira (27/8). Em determinado momento, a madrasta estava em uma ligação telefônica e disse: “A polícia está apurando a morte da Magna.” A fala levantou suspeitas, uma vez que a mulher ainda era considerada desaparecida.

 

A madrasta e as filhas mantiveram a narrativa de que Magna havia ido até a casa no dia do desaparecimento, mas que depois teria ido embora. Afirmavam que não tinham ideia do que poderia ter acontecido.

 

 

A PCMG analisou uma área com cimento fresco, coberta com ripas de madeira, no fundo da propriedade. Ao abrir, descobriram uma cisterna de sete metros de profundidade e o corpo de Magna, já em estado de decomposição. O corpo foi içado por oficiais do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG).

 

“Até então, eles alegavam que estávamos cometendo abuso de autoridade e que iam nos processar. Após a notícia de que encontramos o corpo, o silêncio foi absoluto. Depois, uma das filhas disse: ‘Tá vendo, mãe, eu defendendo a senhora e olha o que a senhora arrumou para mim’”, narrou Fonseca.

 

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Segundo a Polícia Civil, acredita-se que Magna foi morta a facadas pelo irmão, que também aplicou golpes de machadinha na cabeça da vítima. Os sinais de violência no corpo indicam que o crime foi cometido com muita raiva por parte do autor, uma vez que a cabeça estava quase totalmente decepada.

 

“O que mais espanta é a forma como a madrasta se portou durante toda a investigação no interior da residência. Ela é uma pessoa muito fria, não demonstrou nenhum tipo de nervosismo, relatou os fatos e ainda indicou a arma utilizada no crime”, declarou Alessandra Wilker, chefe do Departamento de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).

 

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