"Eu nunca imaginei que pudesse construir uma casa." O relato é de D.A., uma das 26 reeducandas da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) feminina de Belo Horizonte, que se formaram nesta sexta-feira (29/11) no curso de pedreira de alvenaria. A formatura integra uma iniciativa de reintegração social que capacitou 600 detentos de 22 Apacs e do Complexo Penitenciário Público-Privado, em Minas Gerais, em cursos profissionalizantes.

 

 

O movimento resulta da parceria entre a construtora MRV e o Instituto Minas pela Paz. O objetivo é oferecer aos reeducandos a chance de adquirir novas habilidades e aumentar suas oportunidades de inserção no mercado de trabalho. "Desde 2009, o instituto mantém um programa que mobiliza a sociedade para a ressocialização de detentos, com foco na inserção profissional de pessoas em cumprimento de pena ou egressos do sistema prisional", afirma o gerente de projetos do Instituto Minas pela Paz, Enéas Melo.

 

Para isso, o Senai e o Senar MG foram mobilizados para ministrar as aulas dentro das próprias Apacs. Os cursos abrangem áreas como construção civil, mecânica, gastronomia e administração, todas escolhidas com base na demanda do mercado local.

 

 


 

"Esses cursos consideraram as unidades produtivas existentes dentro das associações, as parcerias com empresas que necessitam de mão de obra qualificada e a demanda do mercado. Em Belo Horizonte, o curso de pedreira de alvenaria foi um pedido das próprias recuperandas, que perceberam sua importância para a reinserção no mercado de trabalho. Hoje, elas estão aptas a atuar na construção civil", afirma Melo.

 

A parceria com a MRV termina em dezembro deste ano, mas, segundo Enéas, o Minas pela Paz segue mobilizando parceiros para dar continuidade à qualificação, considerando que uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos reeducandos é encontrar trabalho após saírem do sistema prisional.

 

 

Em consonância, o diretor executivo de Relações Internacionais da MRV&CO, Raphael Rocha Lafetá, destaca que o papel da empresa é apoiar e oferecer capacitação. "As 26 mulheres que se formaram estão se recuperando para se reinserir na sociedade, agora com uma chance a mais de seguir uma vida tranquila e próspera fora da unidade prisional", ressalta.

 

Lafetá também enfatiza a relevância do curso de pedreira de alvenaria. "É um mercado de trabalho extremamente pujante, com alta demanda por mão de obra, além de oferecer um dos melhores salários de entrada. É uma excelente oportunidade para elas recomeçarem a vida", comenta.

 

 

O portfólio de cursos inclui opções como panificação, confeitaria, panificação sem glúten e lactose, elétrica predial, mecânica de motos e automóveis, costura industrial, pedreiro de alvenaria, assistente administrativo e operadora de computadores.

 

As cidades atendidas pelo projeto este ano foram Almenara, Araxá, Belo Horizonte, Conselheiro Lafaiete, Frutal, Governador Valadares, Inhapim, Itabira, Itaúna, Januária, Manhuaçu, Manhumirim, Nepomuceno, Paracatu, Patos de Minas, Patrocínio, Pedra Azul, Rio Piracicaba, Ribeirão das Neves, Santa Luzia e São João del-Rei.

 

Transformação

 

"É o terceiro curso que faço, e achei que não iria dar conta. Ficava pensando que sou mulher, o serviço é pesado, não iria aguentar", compartilha a reeducanda L.C. Apesar das limitações que impunha a si mesma, ela alcançou seu objetivo. "Deu tudo certo, e hoje, se for para eu levantar minha casa, já consigo", comemora.

 

 

Após três meses de curso, o sentimento é de gratidão. "A formatura foi muito boa, ainda me deram a oportunidade de falar em público, mesmo sendo muito tímida. Estavam várias pessoas presentes. É ótimo estar com pessoas do bem, isso nos ajuda. Espero que venham outros", afirma.

 

 

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Da mesma forma, D.A relata que a oportunidade de participar do curso e chegar à formatura foi indescritível. "Foi esplêndido. Nunca imaginei que fosse construir uma casa. Cheguei a perguntar ao professor no início se daria para eu construir minha casa; era só o que eu queria fazer", diz. Mesmo com a resposta positiva, a recuperanda continuou desacreditada.

 

"No decorrer do curso, as teorias foram me relembrando coisas que havia estudado há muitos anos, mas não fixei na memória. Na prática, conseguimos levantar uma casa, e isso foi de suma importância para minha autoestima. É algo que eu nunca imaginei. Percebi que tudo que eu me dedicar e fizer com carinho, eu consigo. Vi que sou capaz de realizar qualquer coisa se me dispuser e tiver gratidão", alega D.A.

 

Com o curso concluído, D.A espera recomeçar sua história. "Vou precisar de condição financeira para isso, e nada melhor do que estar trabalhando", acredita.

 

*As iniciais foram utilizadas para preservar a identidade das pessoas envolvidas


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