Alunos da Escola Estadual Professor Morais, na Região Noroeste de BH, participaram do registro feito sobre O espaço -  (crédito:  Marcus Desimoni/NITRO/DIVULGAÇÃO)

Alunos da Escola Estadual Professor Morais, na Região Noroeste de BH, participaram do registro feito sobre O espaço

crédito: Marcus Desimoni/NITRO/DIVULGAÇÃO

“Tudo começa dentro dos muros da escola”, diz Gabriella Mansur. A historiadora, de 36 anos, tem uma ligação com a Escola Estadual Professor Morais que vai além dos anos de ensino médio que cursou no local. Foi no colégio instalado no Bairro Padre Eustáquio, na Região Noroeste de Belo Horizonte, que a mãe dela estudou, que a filha fez estágios durante as licenciaturas e cujo pátio ela hoje vê da janela de casa. Histórias como a de Gabriella, que nutre uma relação afetiva com a instituição, norteiam o projeto Moradores Educação.

 


Em formato piloto, a iniciativa busca resgatar memórias e vivências de pessoas cujas trajetórias foram e são marcadas pelos espaços do aprender, com o objetivo de valorizar o pertencimento ao ambiente. As experiências serão contadas, atuando como fonte de inspiração a outros indivíduos.

 


O Moradores Educação nasceu e herdou o nome do projeto Moradores – A Humanidade do Patrimônio, que há 12 anos reúne, relata e preserva histórias de cidades pelo Brasil por meio de registros audiovisuais. “Entendemos que uma cidade só vive e tem alma quando a gente conta e preserva as nossas histórias. É um projeto que funciona como uma grande ação de valorização da memória individual das pessoas com uma dinâmica muito particular”, explica
Bruno Magalhães, um dos autores da proposta. Essa percepção também está por trás do Moradores Educação, que busca fazer o mesmo com as escolas mineiras.


A versão educacional do projeto foi idealizada pela Nitro Histórias Visuais e construída em parceria com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a Secretaria de Estado de Educação (SES). Oito escolas localizadas em Belo Horizonte, Governador Valadares, Januária, Juiz de Fora, Poços de Caldas, São João das Missões, Teófilo Otoni e Uberaba vão receber a iniciativa, que será realizada até o início de 2026.

 

DIVERSIDADE VALORIZADA

 

Lucas Magalhães diz que a diversidade territorial é um fator importante para o projeto, assim como a variedade nos perfis das instituições. “Escolas quilombolas, indígenas, de periferia... Tem toda uma curadoria prezando por essa diversidade para ter escolas das mais variadas facetas”, afirma. Os critérios obrigatórios para que uma instituição possa ser escolhida são: ser estadual e ofertar o ensino médio. Os oito colégios ainda não foram todos definidos.


A Escola Estadual Professor Morais, na capital mineira, foi a primeira a ser contemplada com a exibição dos registros audiovisuais. Para contar as histórias da instituição e sua comunidade, foram ouvidos alunos, ex-alunos, funcionários e ex-funcionários, além de pessoas ao redor do ambiente, como os vizinhos do local, explica Michelle Franciscani, diretora da Professor Morais desde dezembro de 2018. “É o resgate da nossa memória. É o sentimento de pertencimento”, avalia. Ela garante que a iniciativa foi bem recebida pelos alunos e pela comunidade.

 

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Ana Carolina Zambom, promotora de Justiça e coordenadora do Centro de Apoio às Promotorias de Justiça de Defesa da Educação, defende que “as escolas são mais do que locais de aprendizado, são territórios onde histórias se constroem e se perpetuam. Ao registrar e celebrar essas histórias, estamos não apenas resgatando memórias, mas também fortalecendo a identidade cultural e comunitária de toda a rede pública de ensino”.

 

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OFICINA CULTURAL

Para reunir as narrativas, foi montada a tenda de ouvir histórias, tradicional no projeto Moradores. Durante três dias, diversos personagens foram ouvidos pela equipe de fotógrafos, videomakers e jornalistas do projeto, acompanhados de alunos da escola Professor Morais. Antes da realização, os estudantes escolhidos participaram de uma oficina cultural sobre técnicas básicas de fotografia, filmagem, registro e documentação de histórias. Mais de 150 pessoas participaram do trabalho e o material audiovisual foi transformado em um documentário e uma exposição fotográfica.

 

Gabriella Mansur, ex-aluna do colégio Professor Morais, vê sua imagem retratada na exposição  que integra a iniciativa

Gabriella Mansur, ex-aluna do colégio Professor Morais, vê sua imagem retratada na exposição que integra a iniciativa

Julia Lanari/NITRO/DIVULGAÇÃO


A historiadora Gabriella Mansur, que se formou na escola há 19 anos, foi uma das participantes. Vizinha da instituição, ela explica que já conhecia o projeto Moradores e ficou sabendo da versão que aconteceria em sua antiga escola por meio de um jornal local. Então, decidiu participar motivada por sua relação transgeracional com a instituição.


“Tenho uma relação muito afetiva com a escola, de cuidar mesmo. No documentário, eu inclusive falei que já até evitei um assalto na escola. Vi que tinha ladrão entrando e gritei ‘pega ladrão’. O ladrão saiu correndo”, lembra, em tom descontraído. Para Gabriella, poder participar do Moradores Educação foi uma oportunidade de voltar para dentro dos muros da escola e reviver as lembranças que carrega.


APRENDIZADO VALIOSO


O Moradores Educação narra o passado e o presente da escola e sua comunidade. No entanto, não se limita a isso. Para João Victor Pereira, de 16 anos e aluno do segundo ano do ensino médio do 'Morais', como ele carinhosamente chama a escola, o projeto foi um verdadeiro início de capítulo. O estudante foi um dos escolhidos para compor a equipe que registrou e transformou as narrativas em produtos audiovisuais. Ele conta que ficou sabendo da iniciativa no quadro de avisos do colégio e se inscreveu. João Victor assume que não imaginava que o projeto teria tanta profundidade. O jovem destaca ainda o aprendizado conquistado com a equipe do Moradores.


“Eu tomei um choque porque não imaginava que o projeto fosse ser o que ele é. Isso inclusive me despertou, virou uma chavinha na minha cabeça sobre o audiovisual. Percebi que é uma coisa que talvez eu realmente vá levar profissionalmente, isso mudou a minha perspectiva de futuro mesmo”, declara. Em fase escolar de avaliar as opções de graduação, ele diz que já gostava da área audiovisual, mas que, ao participar do Moradores Educação e ter a oportunidade de estar por trás das câmeras ouvindo as histórias, se apaixonou completamente.


“A proposta dele [o projeto] é muito bonita. Uma arte legal de detalhar, de contar histórias, de preservar um patrimônio, de preservar uma cultura. Ele também tem esse lado bonito”, completa João Victor sobre o que o encantou.


Além de ouvir as histórias, o aluno participou do documentário narrando um pouco de sua relação com o projeto e o colégio. Ele revela que o Moradores Educação entrou em sua vida em um momento delicado, de enfrentamento de questões psicológicas. “O projeto abriu os meus olhos e me fez perceber que a vida pode ser bonita. Percebi que a vida pode ser muito mais do que ela é”, diz.

 

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Sobre a escola Professor Morais, João Victor destaca o apoio dos profissionais e a importância da instituição. “Tem um valor muito grande porque, sem dúvida, o ensino médio marca a nossa vida”, afirma.


*Estagiária sob supervisão da editora Crislaine Neves


Cidades em foco


O Moradores – A Humanidade do Patrimônio, intitulado movimento de ocupação urbana, já passou por cinco estados brasileiros e 30 territórios desde 2012. O projeto é uma realização da Nitro Histórias Visuais, coletivo de produção de conteúdo da capital mineira. Por meio das fotografias em preto e branco e dos documentários, a iniciativa captura e eterniza narrativas.