Cartaz preparado pelo grupo foi afixado nas redondezas da torre eiffel, área que atrai muitos visitantes -  (crédito:  Camila Miranda/Divulgação)

Cartaz preparado pelo grupo foi afixado nas redondezas da torre eiffel, área que atrai muitos visitantes

crédito: Camila Miranda/Divulgação

As buscas por Flávio de Castro Sousa, fotógrafo mineiro de 36 anos desaparecido em Paris desde 26 de novembro, estão a todo vapor. Há cerca de 20 dias, um grupo de brasileiros une forças para mobilizar a população parisiense nas buscas pelo mineiro, com o uso de cartazes, panfletos, divulgação sobre o caso nas redes sociais e buscas ativas em hospitais e associações.

 

Segundo Camila Miranda, engenheira de segurança do trabalho, de 32, e uma das administradoras, amigos do fotógrafo se uniram ainda nos primeiros dias do desaparecimento e o grupo foi ganhando maiores proporções ao longo dos dias, até atingir o número atual de 180 membros.

 

Ela conta que os membros do grupo, composto por uma variedade de imigrantes brasileiros na França, vêm dividindo as funções de acordo com as competências individuais de cada um. “Uma voluntária com mais experiência na criação de materiais gráficos e conteúdo para redes sociais ficou responsável por essa área, enquanto quem fala melhor o francês e tem mais facilidade com questões administrativas assumiu o contato com as associações”, exemplificou a engenheira.

 

A distribuição de cartazes é estratégica. Como conta Camila, as ações estão sendo realizadas em locais onde Flávio foi visto e em outros de bastante movimentação. “Temos formado grupos em pontos estratégicos, como estações centrais de trem e metrô, além de grandes praças, como a Place de la Nation. Também realizamos ações específicas nos últimos locais em que Flávio foi visto ou por onde possivelmente passou, incluindo a Île des Cygnes (ilha fluvial onde o homem teria caído no rio), o Pont de Grenelle e o 13ème Arrondissement, próximo ao Airbnb onde ele estava hospedado”, detalhou.

 

 

De acordo ela, a variedade de pessoas e locais de moradia dos voluntários do grupo, espalhados tanto por diferentes bairros de Paris quanto na região metropolitana da cidade, permite uma busca e mobilização mais descentralizada.

 

Segundo ela, a população da cidade está se comovendo com o caso. “Quando falamos logo de cara que um amigo desapareceu em Paris, as pessoas prestam atenção, pois percebem que não estamos fazendo publicidade com os panfletos, mas sim pedindo ajuda. No geral, parecem realmente tocadas pela situação. Nas ruas, quando conversamos com elas, demonstram interesse, fazem perguntas e se mostram genuinamente preocupadas”, relatou.

 

Juntamente com o grupo, ela também criou uma página no Link Tree na qual pessoas e entidades interessadas podem encontrar os panfletos necessários para a divulgação, além do mapa com as localizações recentes de Flávio conhecidas.

 


COBERTURA NA FRANÇA

 

Camila Miranda, que também trabalha com as redes sociais no suporte para a candidatura de estudantes brasileiros em Paris, vê a atuação nas mídias on-line como primordial no alcance do maior número possível de pessoas e ampliação da divulgação do caso. O grupo, a partir de três perfis diferentes, utiliza as plataformas digitais para publicar imagens, vídeos no formato de reels no Instagram, além de marcar políticos e veículos de comunicação nos conteúdos publicados sobre o caso. “É para chamar a atenção da mídia francesa”, disse a administradora.

 

Na percepção dela, a data do desaparecimento de Flávio caiu em um momento desfavorável para um “fait divers” (fatos diversos), como são classificadas notícias como desaparecimentos na França, que já não recebem grande destaque nas mídias tradicionais. Isto porque o primeiro-ministro francês, Michel Barnier, renunciou ao cargo em 5 de dezembro e a Catedral de Notre-Dame, igreja gótica parisiense que pegou fogo em 2019, foi reaberta no dia 7.

 

 

“Era muito difícil conseguir espaço nas mídias francesas para abordar a questão. Casos pontuais, como o desaparecimento de uma criança ou de alguém com exposição pública, ganham mais espaço na TV, mas, fora isso, a cobertura costuma ser limitada”, contou a engenheira.

 

A cobertura, porém, ganhou um caráter diplomático após manifestações de preocupação e pedidos de esclarecimentos do Senado Brasileiro e do governo de Minas. O espaço midiático também aumentou depois de os grandes eventos franceses terem saído dos holofotes. “As mídias começaram a dar mais atenção ao caso. Já foi destaque na capa de jornais aqui, além de ter ganhado espaço nas redes sociais e até na televisão. Foi conquistado o lugar na mídia”, afirmou Camila.

 

Para ela, o fato de Flávio ser brasileiro não influenciou no tamanho da cobertura logo depois do sumiço. “Não percebo nenhuma diferença no tratamento do caso pelo fato de ele ser estrangeiro. A questão parece ser mais ligada à natureza do tema e à competição por atenção midiática em momentos de grande relevância nacional”, afirmou a engenheira.

 

Já a publicitária Marcela Xavier, de 35, também moradora de Paris se diz “impressionada” com a forma que a comunidade brasileira conseguiu dar visibilidade ao caso agora. “Não me lembro de ver uma cobertura tão ampla sobre uma pessoa desaparecida assim antes, o que, para mim, mostra que a comunidade brasileira é muito forte e unida”, disse.

 


SEGURANÇA EM JOGO?

 

Diferentemente da legislação brasileira, o acesso a câmeras de segurança para elucidação de casos como esse leva mais tempo e análise em território francês. Isso porque as leis do país colocam em primeiro plano a privacidade dos moradores. “Não adianta vir achando que é conto de fadas e tudo perfeito. Não é assim. Acima de tudo, temos que entender que muita coisa funciona diferente do Brasil”, comentou Camila.

 

Nem a engenheira nem a publicitária acreditam que o desaparecimento de Flávio tenha causado insegurança aos brasileiros imigrantes na França. “Paris é uma grande metrópole e enfrenta problemas de violência, mas nada que a torne particularmente perigosa para os brasileiros. Tendo vindo do Rio de Janeiro, eu sinto que Paris ainda oferece mais segurança que a Cidade Maravilhosa”, avaliou Camila.

 

Já Marcela acredita que, apesar de ser uma capital populosa com os desafios das metrópoles, Paris ainda é uma cidade segura. “O desaparecimento do Flávio não me faz me sentir menos segura”, disse a publicitária, que completou: “Espero que ele seja encontrado logo. Não imagino o quão difícil isso deve ser para a família e para os amigos dele”.


INVESTIGAÇÃO

 

Na última quinta-feira (12/12), a polícia francesa coletou objetos de Flávio do quarto onde ele estava hospedado. Segundo Joyce Barbosa, prima do fotógrafo, o computador, o celular e a escova de dentes dele foram recolhidos pelas autoridades. “A investigação parece estar andando, apesar de não termos nenhuma novidade, por enquanto. Mas pediram que fossem entregues esses pertences para auxiliar nas apurações”, disse Joyce ao Estado de Minas.

 

Em 3 de dezembro, as malas do fotógrafo foram abertas na Embaixada do Brasil na capital francesa. Amigos do desaparecido e um adido da Polícia Federal (PF) brasileira acompanharam o procedimento, mas nenhuma pista sobre o paradeiro do jovem foi encontrada junto aos objetos.

 

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, por meio do Consulado-Geral do Brasil em Paris, o órgão “permanece em contato com as autoridades locais e continua prestando assistência consular aos familiares do nacional”. Porém, em razão da observância na Lei de Acesso à Informação e do Decreto 7.724/2012, não pode fornecer “informações detalhadas sobre casos individuais de assistência a cidadãos brasileiros”.,

 

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O CASO

Flávio desapareceu em 26 de novembro, dia em que deveria retornar ao Brasil após um mês na França. Fotógrafo profissional especializado em registrar eventos, ele viajou a Paris para cobrir um casamento e aproveitou a estadia para explorar a cidade que tanto admirava. O último contato com a mãe foi um dia antes do desaparecimento.

 

A sequência dos acontecimentos ainda é um mistério. Na véspera do voo de retorno, Flávio caiu no Rio Sena e foi hospitalizado por hipotermia. Segundo amigos, ele deixou o hospital Georges Pompidou por volta do meio-dia, visitou a imobiliária que havia alugado o apartamento para estender sua estadia por mais um dia e avisou que descansaria antes de jantar. Às 19h30, enviou sua última mensagem. Depois disso, não houve mais notícias.

 

Dias depois, seu celular foi encontrado dentro de um vaso de flores, do lado de fora do bistrô Les Ondes, próximo ao Sena e a apenas 1,5km do hospital onde esteve internado. A localização alimentou ainda mais as especulações sobre o que poderia ter acontecido.