Calorão com torneira seca, a fórmula do desconforto
Conjugadas com altas temperaturas, interrupções no abastecimento de água atormentam moradores de BH e região metropolitana. Copasa credita paradas a manutenções
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Siga noMinas Gerais enfrenta o calorão , e, em meio às altas temperaturas, moradores de Belo Horizonte e região metropolitana lidam com interrupções no abastecimento de água, que já se prolongam por dias em algumas regiões. Somente nesta semana, a capital teve três das 10 maiores temperaturas de 2025, e agora a falta de água se torna mais um desafio. Ontem (21/2), pelo menos 200 bairros da capital e Grande BH amanheceram sob a ameaça de passar o dia sem água devido a uma manutenção emergencial na rede da Copasa. A mesma sombra iria recair sobre seis bairros de BH no domingo, mas a interrupção foi cancelada.
No Aglomerado da Serra, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, onde a água tornou-se artigo de luxo nos últimos 15 dias, Marcelo Mattos, morador da Vila Marçola, sente na pele os efeitos da crise. Em meio ao calorão, segundo o DJ, o abastecimento agora segue um esquema de revezamento entre as oito vilas do complexo e tem dificultado a rotina dos moradores. Enquanto algumas têm água por dois ou três dias, outras encaram torneiras secas e caixas vazias. Marcelo, que divide a casa com a tia e a avó, já se habituou à rotina de buscar água na casa de vizinhos ou em uma bica próxima para garantir atividades básicas, como cozinhar e tomar banho.
Ele já tentou contato com a Copasa, mas a resposta não o convence. “Eles falam que está tendo problema de abastecimento no local, mas lá no Mangueira eu não estou vendo ninguém reclamar. Só está faltando nas comunidades. A mesma caixa que abastece eles, abastece o Aglomerado, e eu não estou entendendo por que só aqui está faltando”, questiona. Diante da incerteza, ele já planeja alternativas. “Vou arrumar alguns baldes e começar a estocar, porque está difícil confiar na Copasa”, desabafa.
Os moradores de Confins, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, também enfrentam a falta d’água justamente quando mais precisam se refrescar. Uma manutenção emergencial da Copasa deixou o município sem água em meio à onda de calor, quando os termômetros registraram temperaturas superiores a 30°C. As áreas mais altas foram as primeiras a sentir o impacto e já estão sem água há dois dias. Na manhã de ontem (21/2), caminhões-pipa foram vistos pela reportagem na MG-010 transportando água potável para abastecer a cidade.
Ao ver os caminhões-pipa chegando, uma moradora perguntou a um funcionário da Copasa se estavam cadastrando a população para receber água. A resposta foi desanimadora: “O abastecimento só deve ser normalizado na segunda-feira.” Sem água desde o dia anterior, a caixa d’água de sua casa já estava vazia. “Como a gente faz se ficar sem até lá?", lamentou. Os cinco caminhões que chegaram à cidade foram direcionados para hospitais, postos de saúde e escolas, mas a quantidade ainda seria insuficiente para atender os mais de 7 mil habitantes.
Sentada à sombra, uma senhora esperava o filho voltar da escola. Quando chegasse em casa, ainda não teria água para se refrescar. “Ontem fiquei o dia todo sem. À noite, chegou um pouco, só deu para encher parte da caixa”, contou ao Estado de Minas. Sem saber que o fornecimento continuava interrompido, usou o que restava para lavar roupa. Agora, a máquina está parada, a caixa vazia e falta água até para as tarefas básicas. “Difícil, porque aqui em casa somos cinco. Como se faz nesse calor? Não dá nem para matar a sede direito”, desabafou, sem querer se identificar.
O sol castigava a cidade quando Jario Pereira de Sousa percebeu que a água de Confins havia acabado. Aos 56 anos, o despachante aduaneiro já previa o problema. Assim que os primeiros rumores sobre o desabastecimento começaram a circular, ele e a família – a esposa e dois filhos – passaram a economizar. Banhos mais rápidos, torneiras fechadas o máximo possível. Ainda assim, o fim da reserva é inevitável.
“Ainda tem água, não consigo ver o tanto que tem lá, mas acho que já está acabando”, disse ele, preparando-se para os próximos dias sem abastecimento. Sem alternativa, impôs novas regras à família: “Já falei: 'hoje, amanhã, a gente toma banho, raciona um pouco. A gente já toma banho com receio, de entrar e acabar e o próximo já não conseguir tomar banho”, relatou à reportagem.
A única carta na manga é a loja da mãe, atualmente fechada, mas com uma caixa d’água que pode servir como recurso emergencial. “Aí a gente tenta resolver com o pouco que tem lá”, explica. Com o calor batendo os 31°C na tarde de ontem, ele precisou avisar ao filho que, ao chegar da escola e antes de ir para o trabalho, não poderia tomar banho naquele dia. “Se já está ruim agora, se tiver que ficar até segunda vai ser complicado. A gente não tem nada planejado. Não tem muito o que fazer”, desabafa.
RECORRÊNCIA
Ele conta que nos últimos tempos a falta da água tem sido recorrente, mas nada que chegasse a se prolongar por dias. O que mais o incomoda, porém, é a falta de comunicação oficial. A única informação que recebeu foi uma mensagem de WhatsApp, sem logotipo ou qualquer identificação oficial, compartilhada em um grupo da família. O texto prometia o retorno do abastecimento até as 18h de ontem, mas, sem garantias, a espera veio acompanhada de preocupação. Em nota à imprensa, a Copasa informou que a previsão era que a distribuição de água fosse normalizada gradativamente no decorrer da manhã de hoje (22/2).
Ao EM, o superintendente de Operações da Região Metropolitana da Copasa, Ronaldo de Melo Serpa Júnior, explicou que as interrupções no abastecimento têm acontecido devido a diferentes manutenções emergenciais. De acordo com ele, a companhia não identificou nenhum fator em comum que tenha causado os transtornos e muitas vezes há vazamentos de cano, reparos em equipamentos de bombeamento. Além disso, o especialista explica que não houve um aumento das interrupções programadas e emergenciais e que as manutenções estão “dentro do padrão normal da companhia”.
“Operamos hoje cerca de 19 mil quilômetros de rede para poder distribuir a água para toda a região metropolitana. A grande questão que agrava um pouco é porque realmente estamos no meio de uma onda de calor nas últimas duas semanas, e nesta época o consumo aumenta muito (…). Diferentemente da energia elétrica que quando é restabelecida volta de imediato, a água, quando liga, vai chegando aos poucos. E quando estamos em uma onda de calor, a recuperação tende a ser mais lenta porque a população está gastando mais do que o normal”, explicou o superintendente.
Fale com a empresa
A Copasa orienta os clientes que identificarem alguma intercorrência no abastecimento de água a entrarem em contato com a empresa. Os canais são: Agência Virtual no site www.copasa.com.br; Aplicativo Copasa Digital; Webchat disponível no site ou pelo WhatsApp (31) 99770 7000, os dois últimos com funcionamento de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, e sábado, domingo e feriados (exceto nacionais) das 8h às 12h ou ainda pela Central de Atendimento 0800 0300 115 ou 115, que funciona 24 horas.