Caso Clara Maria: manifestação em BH pede justiça e cobra segurança
Jovem de 21 anos foi vítima de feminicídio na capital mineira no início desta semana
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Siga noMovimentos, entidades e sindicatos realizam, na manhã deste sábado (15/03), na Praça Sete, em BH, um ato por justiça a Clara Maria Venancio Rodrigues, de 21 anos, vítima de feminicídio no domingo (09). A jovem foi morta enforcada e teve o corpo concretado no quintal da casa de um dos suspeitos, que confessou o crime. A polícia investiga se ela foi vítima de necrofilia.
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A manifestação foi organizado pelo 8M Unificado e o movimento estudantil Faísca UFMG, além de outras entidades e sindicatos. A militante do Pão e Rosas e do Faísca UFMG, Maria Fernanda Macedo, conhecida como Mafê, conta que é um ato "bem emocionante", uma vez que foi organizado junto dos amigos de Clara, e que pode ajudar a externalizar o luto sentido por eles.
"O ato foi construído com os amigos da Clara, que sentiram a necessidade de estar nas ruas gritando por ela, colocando as músicas preferidas dela e fazendo barulho por ela", diz Mafê, que também é mestranda em psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
De acordo com a militante, o ato é de extrema importância para cobrar justiça por Clara e por outras mulheres vítimas de feminicídio. Mafê cita os índices do crime em Minas Gerais e acredita que é fundamental mostrar às pessoas que passam pelo Centro de BH que esse tipo de crime é inaceitável.
"A ideia de arrancar justiça nas ruas, entendendo que o caso da Clara não é um caso isolado, pelo contrário. É um caso de feminicídio movido por um ódio neonazista, porque ela respondeu comentários desse caráter, mas não é isolado", defende.
Ainda de acordo com a mestranda, o ato surge também para mostrar a força dos movimentos de mulheres, aliados à classe trabalhadora. Isso porque, segundo Mafê, Clara era uma trabalhadora do modelo de escala 6x1 e foi morta em uma emboscada ao aceitar buscar o dinheiro que deviam a ela.
"Em todos os casos de feminicídio, o nome da vítima passa a significar mais do que ela, pois passa a significar cada uma dessas mulheres mortas por feminicídio, pela violência do Estado", conclui.
Em Uberlândia, na Região do Triângulo Mineiro, cidade natal da jovem assassinada, também está prevista uma manifestação em frente ao Teatro Municipal, na Avenida Rondon Pacheco, no bairro Tibery. O horário de início para o ato não foi divulgado, mas amigos da vítima querem homenageá-la e cobrar por justiça.

Crítica a Musk e Zema
Manifestantes criticaram falas machistas do governador Romeu Zema (Novo) sobre "instinto natural dos homens" e sobre discursos neonazistas do empresário Elon Musk. Além de entoarem gritos de "Clara, presente", para marcar a presença da vítima do crime brutal, dezenas de pessoas repudiaram o governador mineiro ao som de "Ô, Romeu Zema, seu animal, feminicídio não é instinto natural".
O neonazismo também foi fortemente criticado. De acordo com o manifestante Yuri da Cunha Santos, o fascismo avança e, por isso, é necessário enfrentar as raízes desse sistema e do que mata mulheres. "O nazismo está presente nas ruas, está matando. Hoje viemos às ruas em prantos, porque uma mulher enfrentou o nazismo e pagou com a vida", disse Yuri.
"Eu não sei como uma ideologia tão nojenta se mantém em um país latino-americano. Temos que fazer essas pessoas terem medo de se expor. Não vamos aceitar o nazismo, racismo, feminicídio e xenofobia. Nós não deixaremos de falar e não nos aquietaremos. Nossa amiga foi embora logo depois do Dia das Mulheres. Mataram e abusaram de nossa amiga e estaremos nas ruas para que nenhuma outra mulher passe pelo menos", concluiu.
Luto
O namorado e amigos de Clara marcaram presença na manifestação. Segundo o estudante de arquitetura e companheiro da jovem, Leonardo Alves, os movimentos entraram em contato com eles para unificar o ato. Abalados e ainda sem poder viver o luto devido às buscas por conta própria por Clara e os depoimentos posteriores ao início das investigações, os amigos lamentam a morte da jovem e cobram justiça.
"É pela Clara, é para ela não ser esquecida e é para o caso dela ter o maior impacto possível, para fazer todos esses vermes nazistas terem medo de novo. O ato é para mostrar que a gente está aqui e que a gente não vai aceitar esse tipo de coisa mais. É para proteger não só mais a memória dela, mas a vida de todas as outras pessoas que passam, e que podem passar por uma situação como a dela", diz Leonardo.
De acordo com estudante, entre os integrantes do grupo mais próximo de amigos da Clara, apenas uma pessoa foi chamada para dar novo depoimento a polícia, agendado para segunda-feira (17). Porém, ele afirma estar à disposição para quaisquer novos interrogatórios.
Segundo o grupo de amigos, nenhum conseguiu viajar para Uberlândia, no Triângulo Mineiro, cidade natal da jovem, onde será enterrado o corpo neste sábado. A melhor amiga de Clara, Júlia Rangel, havia comprado uma passagem de avião para o município, que foi cancelada. A amiga, que a conhece desde a infância, agora sofre também com a impossibilidade de se despedir.
"Ela era, literalmente, meu contato de emergência. Agora, eu não tenho mais o meu chão. Eu sinto como se um pedaço de mim tivesse ido embora. Isso foi muito e eu nunca passei por uma situação assim. Eu estou sem chão, porque um cara matou ela", lamentou.
O crime
O corpo da jovem, de 21 anos, foi encontrado na quarta-feira (12/3) encontrado coberto por uma camada de concreto nos fundos de uma casa. A jovem desapareceu quando voltava para casa. A família de Clara Maria é de Uberlândia, na região do Triângulo, e uma irmã veio para a capital para ajudar nas buscas da moça.
Delegados da Polícia Civil disseram na quinta que as investigações focam em determinar a motivação para o crime. A polícia também avalia se o corpo de Clara foi vítima de necrofilia.
Os policiais destacaram a frieza dos suspeitos ao confessarem o crime. O jovem de 27 anos, que foi colega de trabalho de Clara e que devia R$ 400 a ela deu versões contraditórias para a motivação, segundo os delegados. Primeiro ele disse que queria tirar dinheiro da conta da jovem, mas teria ficado com ciúmes quando a encontrou em uma cervejaria, acompanhada do namorado, dias antes do crime.
O outro suspeito, de 29 anos, é amigo do primeiro e trabalhava em estabelecimentos na mesma avenida da padaria em que Clara trabalhava. Ele foi preso em casa, na Grande BH e disse que nutria ódio da jovem depois de ter sido repreendido por ela em público por ter feito apologia ao nazismo. Desde então, segundo os delegados, teria dito a amigos que queria ver a jovem morta. A prisão em flagrante dos suspeitos foi convertida para preventiva nessa sexta (14).
O delegado Alexandre Oliveira disse que conversou com um amigo em comum dos suspeitos que teria relatado que o homem de 29 anos teria confessado a vontade de praticar necrofilia. Um terceiro homem, de 34 anos, chegou a ser preso por envolvimento no crime. Ele esteve na casa do jovem de 27 anos, onde o corpo de Clara foi encontrado, na segunda-feira (10). Segundo os delegados, após os interrogatórios, a participação dele no crime foi descartada, mas as investigações continuam.
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Os delegados informaram ainda que o suspeito de 27 anos planejava fugir. Ele já teria feito contato com um amigo que mora em outro estado pedindo ajuda para arrumar um emprego.