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EDUCAÇÃO

Veto ao celular fortalece interações, avaliam alunos

Estudantes e educadores veem ambiente mais participativo desde a proibição ao uso do aparelho em sala de aula

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Quase três meses depois da proibição do uso de celular por alunos em escolas do Brasil, estudantes ainda tentam se adaptar à nova realidade. Após anos de embates e debates, o uso do aparelho móvel foi banido das salas de aula – ao menos da forma como era até então – por lei sancionada em 13 de janeiro pelo governo federal. Em escolas de Belo Horizonte, alunos listam pontos positivos e negativos da norma, que entrou em vigor no início do ano letivo de 2025. Pelo menos sobre um ponto há consenso: a interação com os colegas melhorou em sala de aula.

Na Escola Estadual Governador Milton Campos, o celular fica dentro da mochila do próprio aluno que, quando pego usando o aparelho na sala de aula, leva uma advertência oral. Na terceira advertência, o celular é guardado e entregue para o pai ou responsável do adolescente. “Fizemos um acolhimento no início do ano com os alunos, explicamos as regras e a questão educacional, como a medida repercute em sala de aula. Tem sido um desafio, mas achei que seria pior. São poucas reclamações de professores. Como aqui é integral, estamos liberando o uso do celular no horário do almoço”, explicou a coordenadora pedagógica da escola, Cynthia Cavalcanti.

As estudantes do ensino médio Camily Anita, de 16 anos, e Giovana Baracho, também de 16, afirmaram que a proibição do celular em sala de aula possibilitou a maior interação entre os alunos durante as aulas, mas afirmaram que ainda é cedo para ver melhorias no aprendizado com a medida. “Sinto que estou mais produtiva. Consigo participar e interagir mais com os meus colegas dentro de sala, mas sinto muita falta de ouvir música. No aprendizado, não vejo muita diferença. Eu já não mexia no celular durante a aula antes da lei”, disse Giovana. Ela conta que um colega já foi pego usando o celular durante a aula. “Não foi legal. Deu uma pesada de clima na sala. Mas pegaram o celular e resolveram”.

Apesar de o uso do celular ser liberado durante o intervalo do almoço, Camily e Giovana evitam mexer no aparelho no interior da escola. Porém, elas afirmaram que sentiram a diferença ao chegar em casa, quando precisam resolver outras questões e passam mais tempo no celular no período noturno do que antes da lei ser sancionada. “Evito usar durante todo o período da escola. Mas acaba que em casa uso mais do que estava acostumada a usar no ano passado. Acabo compensando o tempo longe do aparelho em casa”, disse Giovana.

Camily concordou com a amiga. “Acho isso ruim (usar mais o celular em casa), porque chegamos muito tarde em casa, já que estudamos (em período) integral. Às vezes, comemos metade da noite mexendo no celular. Tem gente que mora longe e não consegue conversar com os pais durante o dia. O que tem que fluir em casa, não flui direito, porque o que dava para resolver pelo celular na hora do recreio, por exemplo, não dá para resolver”. Apesar disso, Camily acredita que as relações com os colegas dentro de sala, durante as aulas, melhoraram. “Quando saímos de sala, cada um vai para o seu grupo e não mudou muita coisa. Mas dentro de sala estamos interagindo mais”, avalia.

Aluna da Escola Estadual Desembargador Rodrigues Campos, na Região do Barreiro de Belo Horizonte, Giovana Alves da Silva, de 17, também avalia que é cedo para identificar melhorias nas notas, já que os primeiros resultados do ano não saíram, mas percebeu maior interação entre os colegas. “Sempre fui muito comunicativa, então, para mim, continuou da mesma forma. Mas a participação geral dos alunos melhorou, sim”.

Para Giovana, a maior dificuldade até agora é a organização dos estudos, já que, antes da lei, ela usava o celular para anotar as matérias. “Agora fica mais complicado organizar cadernos e outras coisas do gênero, porque eu usava mais o celular para isso. A questão de não poder registrar momentos está sendo bem complicada também”.

A estudante é aluna do terceiro ano do ensino médio e lamentou não poder tirar fotos e fazer vídeos de dinâmicas e celebrações do último ano da escola. Segundo ela, quando há algum evento de formatura, a escola libera um aluno para fazer fotos compartilhar os registros.


ENTRE OS MAIS NOVOS

Os efeitos positivos da restrição do uso de celular em salas de aula são mais sentidos por alunos mais novos e pais das crianças. A estudante de direito Livia Maria Jaime Casais, de 42, é mãe de Pedro, de 11, estudante do 6º ano de uma escola particular da capital. Para ela, a lei foi muito positiva já que, agora, a criança sem celular deixou de ser exceção e virou regra. “Antes, eu tinha a pressão de dar e liberar um celular para o meu filho e, agora, não. Pedro está ótimo, brincando com os amigos e interagindo mais”, disse ela.

De acordo com Livia, no ano passado, quando a lei não estava em vigor, as crianças passavam o recreio no celular. Desde o início do ano letivo de 2025, a hora do recreio virou momento de jogos, brincadeiras e trocas entre os alunos. “Até a saída mudou, porque eles gostam de ficar mais tempo no colégio, brincando com os amigos”. Para Pedro, a mudança foi além da hora do recreio. Segundo o menino, a interação entre os amigos em sala de aula também melhorou.

A dona de casa Juliana Araujo, de 44, mãe de Bruna Araujo, de 10, também gostou da medida. “As crianças mudaram a forma de interação na escola e estão voltando ‘às antigas’ com brincadeiras”. A medida, porém, foi criticada pela dona de casa para a filha mais velha, que faz o ensino médio em uma escola técnica de Belo Horizonte. “Pediram a compra de um tablet para usar durante a aula e para fins acadêmicos, mas no primeiro dia a mandaram voltar com o caderno. Só pode usar o tablet na aula de informática. Achei isso um retrocesso”.

Reflexão

Para a psicóloga e psicoterapeuta infantil Lívia Américo, de 43, a lei é válida, principalmente no contexto atual de excesso de telas, mas precisa ser refletida e trabalhada com as crianças e adolescentes para ter o verdadeiro impacto. “A questão da regra pela regra não vale muita coisa. Precisa de ter reflexão sobre o assunto com os alunos. Não há mudança de comportamento sem reflexão. As escolas precisam trazer a reflexão sobre isso e mediar com o aluno o que vale e o que não vale”, defendeu Lívia.

A psicóloga ainda aponta que a lei é sentida mais fortemente por alunos mais novos, principalmente, pelo nível de desenvolvimento da criança. “Especialistas já afirmam que o celular só deve ser liberado para adolescentes de 15 anos. Quando se tira o aparelho da criança de 10, ela volta a ter a oportunidade de brincar e socializar”.

Com alunos mais velhos, a psicóloga acredita que é necessário maior nível de conversa e diálogo. “Os adolescentes têm maior capacidade de reflexão e de julgamento. Eles conseguem se autogovernar e entender que o celular no ambiente de sala de aula não funciona. Mas pensar sobre isso é importante, explicar a lei, o motivo de ela existir e o impacto que o excesso de tela provoca”, defende. A psicóloga reitera a importância da lei, mas acredita que o uso da internet nos meios acadêmicos deve ser repensado. “As telas estão aí, a busca por informação está aí e é diferente da busca por informação de anos atrás”.

ACOMPANHAMENTO

A Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) informa que, desde a sanção da Lei Federal 15.100/2025, tem acompanhado de perto e fornecido suporte integral às escolas da rede estadual para que se adequem à nova realidade. Antes do início do ano letivo, o órgão enviou orientações detalhadas sobre o uso de celulares em salas de aula, durante intervalos e recreios.

“Os primeiros impactos observados na rede estadual de ensino são positivos, com um aumento significativo nas interações entre estudantes e professores. As escolas também estão sendo incentivadas a oferecer atividades complementares que promovam essa interação, substituindo o uso de aparelhos durante os intervalos”, explicou a SEE.

A secretaria ainda destacou que o uso da tecnologia para fins pedagógicos continua permitido e incentivado. “A SEE/MG disponibiliza diversas ferramentas online que enriquecem os estudos em sala de aula, como o aplicativo Enem MG e a plataforma de leitura Elefante Letrado”.

Na avaliação da Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Belo Horizonte, os resultados da lei na sua rede, até o momento, são positivos, com perspectivas de melhoria na concentração dos alunos em sala de aula, tornando o ambiente escolar mais participativo. “As gerências regionais têm observado que a medida tem contribuído para uma maior interação dos alunos nas atividades escolares e fortalecido o ambiente escolar, com relatos de mudanças positivas no comportamento dos estudantes”, avaliou a Smed.

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O órgão informou ainda que planeja junto às escolas encontros regionalizados com os profissionais do programa PAS (psicólogos e assistentes sociais) que atuam nas unidades da rede municipal de educação, abordando de forma pedagógica a implementação da lei. O objetivo é sensibilizar as comunidades escolares sobre a importância da adaptação às novas normas, sempre com uma abordagem pedagógica, respeitosa e gradual. “A Smed segue atenta aos desdobramentos da medida, reforçando o compromisso em garantir um ambiente educacional mais produtivo para todos”.

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