Ministro para assuntos religiosos e islâmicos da Autoridade Palestina, Mahmoud Al-Habbash garantiu, em conversa com o Correio, que o compromisso da AP é de que a guerra travada entre Israel e o grupo terrorista Hamas não ultrapasse as fronteiras e não atinja as nações consideradas amigas. A observação se refere à recente descoberta, pela Polícia Federal (PF), de integrantes ligados a uma suposta célula do Hezbollah, grupo fundamentalista islâmico baseado no Líbano, que estaria se preparando para cometer atentados contra instituições da comunidade judaica brasileira.

"Temos uma posição, por princípio, de que o conflito não atinja países amigos e que não ultrapasse as fronteiras atuais da guerra. Lamentavelmente, a continuidade dos ataques e agressões de Israel contra nosso território nos faz temer que se ultrapasse as fronteiras e se converta em uma guerra religiosa, algo que não apoiamos, que não desejamos", salientou.



 

Al-Habbash, que ocupa cargo equivalente ao de ministro-presidente da Suprema Corte na lei islâmica (Sharia), está no Brasil para participar do 36º Congresso de Muçulmanos da América Latina e do Caribe, que se realiza em São Paulo, durante este final de semana. O evento, todo em árabe — cujo slogan "Os desafios contemporâneos enfrentados pela família muçulmana à luz dos valores islâmicos" —, teve na abertura as execuções dos hinos da Arábia Saudita e do Brasil.

Al-Habbash se reuniu, na última sexta-feira, com o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, em um almoço na capital paulista. A assessoria da pasta não esclareceu sobre o que eles conversaram.

Responsabilidade

Na conversa com o Correio, Al-Habbash fez questão de apontar a responsabilidade de Israel no conflito que vem devastando a Faixa de Gaza. Segundo ele, o governo israelense apoiou o Hamas quando o grupo fundamentalista assumiu o controle da região.

"Houve a política de (Benjamin) Netanyahu (premiê israelense) de fortalecer o Hamas e debilitar a Autoridade Palestina. Essas são as principais causas para o 7 de outubro. Se tivermos que culpar alguém, devemos culpar a ocupação israelense e culpar Netanyahu por esses nefastos resultados. Se tivéssemos tranquilidade e uma vida digna isso não aconteceria", criticou.

Segundo Al-Habbash, os países que vêm acompanhando a campanha militar israelense contra Gaza passaram a olhar com mais atenção para a crise humanitária dos palestinos. "Observamos um respaldo ilimitado à questão palestina, a nível mundial. Esse apoio chegando de todas as partes", frisou.

Como são as relações Brasil-Palestina?

Historicamente, são muito boas. O povo brasileiro é um povo amigo do palestino. Ao longo de todas as décadas do desenvolvimento da questão palestina, as relações sempre têm sido solidárias e compreensivas. O que observamos, a nível oficial e ao nível da rua, da interação do povo brasileiro, é um reflexo que, realmente, existe uma solidariedade genuína e verdadeira.

E como o Brasil tem apoiado a Palestina?

Quando começou essa nova onda de violência israelense, o presidente Lula falou, imediatamente, com nosso presidente Mahmoud Abbas e transmitiu a solidariedade do governo e do povo brasileiro ao povo palestino. Historicamente, todas as resoluções que passaram na ONU tiveram o voto favorável do Brasil, que sempre trabalhou e apoia o reconhecimento do Estado da Palestina como membro pleno da ONU.

De quem é a culpa pela demora na saída dos brasileiros de Gaza?

Quem tem impedido a saída é Israel, que controla por terra, ar e mar. Qualquer movimento é Israel. Os palestinos não têm nenhum controle sobre essa fronteira. Em Gaza, nem o Hamas controla a passagem. Depois de 30 anos dos acordos de Oslo, Israel não deu nenhum passo concreto pela paz e pela solução pacífica do conflito. Isso foi debilitando a posição e a popularidade da própria OLP (Organização pela Libertação da Palestina, grupo à frente do governo da Autoridade Palestina). Isso possibilitou o crescimento das vozes que clamam pela solução da violência e pela via militar.



No Brasil, várias religiões convivem em paz. Essas tensões podem chegar aqui?

Não esperamos que o conflito se espalhe para o exterior. Esperamos que permaneça confinado à região, mas a agressão continuada pode levar a uma expansão, transformando em um conflito não apenas entre os palestinos e israelenses, mas entre israelenses e todos os muçulmanos. Receio que Israel possa, com sua política, transformar [a guerra atual contra o Hamas] em um conflito religioso que inclua o mundo inteiro.

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