Danielle Waldman dançou a última dança de sua breve vida pouco antes do amanhecer de 7 de outubro. Logo depois, ela e seus amigos tiveram que fugir para tentar se salvar, mas nunca conseguiram voltar para casa.
Há um registro de seus momentos finais – um breve vídeo, gravado em um telefone. Dá apenas pistas dos horrores que estão por vir.
A jovem de 24 anos está sentada no banco de trás de um carro com dois amigos – mechas de seu longo cabelo encaracolado escapam de seu moletom cinza. Os três estão vestidos de forma casual.
Há sorrisos fugazes e vozes sobrepostas, e um vislumbre de pulseiras azuis do festival de música trance Supernova Universo Paralello ao qual acabavam de comparecer.
Eles estão tentando manter a calma, mas estão sendo caçados.
O namorado de Danielle, Noam Shai, está na frente, ao volante.
"Quer que eu dirija muito, muito rápido?", ele pergunta. "Eu sei como fazer isso."
"Correto", responde uma passageira. Um jovem barbudo sentado ao lado de Danielle tenta tranquilizá-la. "Vamos ficar bem", diz ele. "Está tudo bem, certo?"
A seguir, da frente, uma demanda urgente – "esquerda ou direita?"
Então o vídeo termina.
Minutos depois, homens armados do Hamas crivaram o carro de balas.
Noam, Danielle e seus amigos no banco de trás foram mortos – assim como quase 360 outros israelenses que foram dançar no festival no deserto de Negev, perto da fronteira de Gaza.
O passageiro do banco da frente foi feito refém.
Quando o sol se pôs naquele dia, 1.200 israelenses foram massacrados – seja no festival ou em suas casas em kibutzim perto da fronteira. Foi a pior perda de vidas judaicas num único dia desde o Holocausto. A grande maioria eram civis.
Desde então, Israel entrou em guerra em Gaza "para erradicar o Hamas", e os palestinos, por sua vez, têm sido massacrados.
Quase 18 mil pessoas já foram mortas na última contagem, 7.300 delas crianças, de acordo com o Ministério da Saúde administrado pelo Hamas em Gaza.
Em Gaza agora, tal como em Israel depois de 7 de outubro, pais estão enterrando seus filhos. E para cada pai, palestino ou israelense, a perda é irreparável.
Encontramos o pai de Danielle, Eyal, em seu escritório repleto de arte, num andar alto em Tel Aviv.
Ele é um gigante da tecnologia – fundou a fabricante israelense de chips Mellanox Technologies e vendeu a empresa por US$ 6,8 bilhões (R$ 33,4 bilhões) em 2019.
Mas agora, é simplesmente um pai, devastado pela dor, sentindo a ausência de sua filha mais nova.
"Ela era uma garota incrível", diz ele com uma voz carregada de amor e tristeza.
"Adorava dançar. Amava os animais. Amava as pessoas. Tinha muitos, muitos amigos. Adorava praticar snowboard, mergulhar, andar de moto com Noam."
Quando soube que Danielle estava desaparecida, ele voltou correndo de uma viagem à Indonésia – obtendo permissão para pousar em Israel, mesmo com o espaço aéreo fechado. Três horas depois, foi procurá-la, rastreando o relógio digital dela. Foi uma jornada por um campo de batalha.
"Estávamos perto de um confronto com sete terroristas, criaturas, chame-os como quiser", diz ele.
"Eles mataram três ou quatro soldados. Depois disso, pegamos três oficiais num jipe e descemos para o sul."
Ele encontrou o carro crivado de balas, mas não havia sinal de Danielle.
"Havia muito sangue dentro do carro", diz ele. "Eu tinha esperança de que ela não estivesse no carro, ou que estivesse ferida, mas tivesse conseguido escapar, ou que tivesse sido feita refém."
Dois dias depois, o corpo dela foi encontrado.
"Tudo o que ela tocava era com um sorriso. Ela nunca fazia nada de errado com ninguém", diz ele, sufocando as lágrimas. "Ela adorava fazer coisas boas. E eles [o Hamas] simplesmente a assassinaram sem motivo."
Apesar do assassinato brutal da sua filha mais nova, Eyal Waldman ainda acredita que os palestinos deveriam ter um Estado – e logo.
"Precisamos mudar a liderança de ambos os lados. E então espero que dentro de dois a quatro anos seremos capazes de fazer a paz e construir dois Estados para os dois povos e seremos capazes de viver juntos uns ao lado dos outros", diz ele.
Mas antes disso, ele quer outra coisa.
"Qualquer responsável, qualquer pessoa associada ao que aconteceu em 7 de outubro de 2023, será eliminada. E nós cuidaremos disso", afirma com firmeza.
"Sabemos exatamente quem veio, quem estuprou, quem matou. Temos vídeos, temos seus números de celular. Sabemos quem são. Podemos eliminá-los. E acho que podemos eliminar o Hamas."
O ex-oficial do exército israelense sabe como travar a guerra. Ele serviu em uma unidade de elite – a Brigada Golani.
Ele também sabe como construir pontes. No passado, abriu um centro de design em Gaza, doou US$ 360 mil (R$ 1,8 milhão) a um hospital na região e criou empregos para palestinos tanto na Faixa de Gaza, como na Cisjordânia.
Ele se arrepende disso agora?
"Não, não me arrependo", ele responde sem hesitação. "Acho que precisamos fazer tudo o que pudermos para tornar este lugar o melhor lugar para se viver."
"E precisamos parar de nos matar e encontrar uma maneira de viver juntos. Tenho trabalhado há duas décadas e meia tentando construir a paz."
Apenas 10 dias antes de Danielle ser morta, ela estava conversando com o pai sobre o futuro.
"Ela disse 'sabe, pai, decidi que vou me casar com Noam'", lembra ele. "Eles estavam juntos há seis anos, e era uma amizade e parceria incrível. Eles iriam morar no campo, criando os filhos. Ela queria muitos filhos e muitos cachorros e cavalos."
O jovem casal apaixonado – que nunca teve a oportunidade de se casar – foi enterrado junto.