As remarcações de preços foram tantas nos últimos dias que Romina Luque, 36, que trabalha como caixa em uma rede de supermercados em Buenos Aires, desistiu de trocar as etiquetas.
"Na semana passada foram 2.000 etiquetas, não conseguimos, as prateleiras tiveram que ficar sem os valores por alguns dias", conta ela enquanto repõe uma estante com produtos de higiene.
Os papeizinhos azuis e redondos com o escrito "Preços Justos", que costumavam ficar pregados junto a algumas mercadorias, já não existem mais. "Tiraram na quarta passada [6]", diz Romina.
Tratava-se do programa de acordo de preços que a gestão do ex-presidente Alberto Fernández fazia com fornecedores, armazéns, supermercados e outros setores para mitigar os efeitos da inflação crescente na Argentina.
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O último pacto negociado pelo ex-ministro da Economia Sergio Massa previa uma subida de até 12% em novembro e mais 8% em dezembro em uma lista de milhares de produtos, sob uma inflação mensal que deve ultrapassar essas cifras.
Com a chegada do ultraliberal Javier Milei à Presidência e sua posse no último domingo (10), porém, esses acordos foram deixados de lado e novas listas de preços passaram a ser enviadas, com a lógica de compensar os atrasos dos últimos meses.
Milei já chamou a regulação de preços de "aberração", indicando às empresas e à população que ela seria eliminada. Muitos, então, correram aos supermercados aos receberem seus salários na semana passada, início de mês.
"As pessoas pensam em se garantir, comprar as coisas que sabem que não vão conseguir comprar na semana que vem. Essa é a mentalidade nossa, já aconteceu outras vezes", diz Aida Garcia, 83, observando uma vitrine de carnes.
Foram registradas filas em supermercados atacadistas e varejistas na região metropolitana de Buenos Aires e no interior do país.
"Aqui não houve filas, mas encheu mais, porque as pessoas receberam o salário na quinta [7], e ninguém sabia o que ia acontecer quando o Milei assumisse. E ainda tem as festas de fim de ano, quando tudo fica mais caro", diz a caixa Romina.
As expectativas pelas primeiras medidas econômicas do novo governo, anunciadas na noite desta terça (12), adicionaram mais incerteza e especulação aos preços nos últimos dias.
Sem referências, relataram-se aumentos muito díspares dependendo do produto ou do local. Segundo o jornal Clarín, a estimativa era de um incremento médio de 20% a 25% nos itens que não estão mais no programa Preços Justos.
Os acréscimos, porém, poderiam chegar a 100% em mercadorias beneficiadas por outros subsídios indiretos, como azeite, massa, farinha e itens de padaria, afirma o jornal.
Agora que o ministro da Economia, Luis Caputo, informou uma maxidesvalorização da moeda local, com dólar oficial passando de 366 a 800 pesos, porém, o encarecimento das gôndolas deve ser ainda maior.
Os cartões de crédito foram outro problema para os argentinos nos últimos dias, já que a cotação do dólar cobrada em compras internacionais também ficou sem referência.
Muitos bancos adiaram o vencimento das faturas ou aumentaram o valor da moeda, já prevendo a desvalorização pela nova gestão.