O "conflito interno" declarado há cinco dias no Equador impulsionou ações internacionais: suas fronteiras com países vizinhos vivem momentos de tensão, os Estados Unidos anunciaram o envio de altos comandantes militares e a Colômbia rechaçou uma expulsão em massa de presos.

Mais de vinte gangues de traficantes de drogas, formadas por 20 mil membros, semearam o terror no país desde domingo em resposta às rígidas políticas do governo do presidente Daniel Noboa.

Desde então, os motins nas prisões não cessam, 178 funcionários de penitenciárias viraram reféns e, nas ruas, veículos queimam, alarmes disparam e bombas explodem. 

A onda de violência interna deixou 16 mortos e provocou a solidariedade da comunidade internacional, mas também atritos com alguns países. 

Os Estados Unidos enviarão ao Equador a chefe do Comando Sul, a general Laura Richardson, e autoridades de luta contra o tráfico de drogas e diplomatas para assessorar o presidente Noboa, no poder desde novembro.

"Aceitamos o apoio da Argentina, aceitamos o apoio dos Estados Unidos (...) não é momento de agir por ego ou vaidade, dizer não", disse o presidente de 36 anos.

"Necessitamos apoio militar em termos de pessoas, de soldados, assim como em inteligência, artilharia e equipamento", afirmou.

Brasil, Colômbia, Chile, Venezuela, República Dominicana, Espanha, União Europeia, a ONU, entre outros, repudiaram a escalada narcotraficante. França e Rússia advertiram seus cidadãos a não viajarem ao Equador.

Seus vizinhos Peru e Colômbia, os maiores produtores de cocaína do mundo, tomaram medidas para restringir a passagem em suas fronteiras. 

- Prisões sem controle -

Equador foi por muitos anos um país livre do tráfico, mas se transformou em novo reduto da droga que vai para os Estados Unidos e Europa com gangues em disputa pelo controle do território e unidas em sua guerra contra o Estado. 

Nos últimos cinco anos, a taxa de homicídios a cada 100.000 habitantes passou de 6 para 46 em 2023 e a guerra interna se desenvolve, como ocorreu na Colômbia no século passado, com um ingrediente adicional: o terror nas prisões. 

Os traficantes as usam como escritórios do crime, de onde gerem o tráfico de drogas, ordenam assassinatos, administram os lucros e lutam até a morte com rivais pelo poder. 

No meio da crise atual, Noboa anunciou a "repatriação" de 1.500 colombianos presos para reduzir a superlotação nas prisões onde há cerca de 3.000 pessoas extras. 

Mas a medida não foi bem aceita pelo governo de esquerda de Gustavo Petro que a considera uma "expulsão em massa" e problemática pois os presos ficariam em liberdade do outro lado da fronteira. A zona limítrofe foi militarizada na quarta-feira para evitar a passagem de criminosos.

A atual onda de violência também começou em uma prisão, quando um dos chefões mais temidos fugiu de uma penitenciária em Guayaquil (sudoeste): Adolfo Macías, apelidado "Fito". O líder da principal gangue do país, conhecida como Los Choneros, é apontado por ter ameaçado o presidenciável Fernando Villavicencio dias antes de seu assassinato.

O governo reagiu com pressão militar e policial, mas o tráfico respondeu sem piedade. 

- Medo e desinformação -

"Sabíamos que esta era uma bomba-relógio, uma panela de pressão prestes a explodir", disse à AFP Ramón Salazar, um trabalhador de 38 anos em Quito.

Após vários dias de confinamento pelo medo, as atividades nas principais cidades foi retomada. A maioria dos comércios abriram, o transporte público voltou a circular e apenas algumas empresas mantém o teletrabalho. 

Na terça-feira, a ofensiva do tráfico mostrou sua pior face com um ataque armado à imprensa registrado ao vivo que deu a volta ao mundo.

Ao longo da semana, vídeos nas redes sociais mostraram assassinatos de membros da força pública, supostos roubos e ataques.

A desinformação e o pânico provocam confusão da população, apesar da negativa das autoridades.

"Sinto uma frustração porque estamos sozinhos, porque lamentavelmente a função pública está ocupada com a corrupção", afirmou Salazar a caminho do trabalho no centro da capital. 

Centenas de soldados e policiais buscam Fito, enquanto rege um estado de exceção e um toque de recolher de seis horas, a partir das 23h locais (1h em Brasília). 

Na quinta-feira, o presidente propôs ao Congresso uma alta de 12% a 15% do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) para financiar o "conflito armado interno".

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