O presidente eleito do Panamá, José Raúl Mulino, terá de tomar decisões econômicas urgentes para evitar o colapso do sistema de pensões e garantir o abastecimento de água no Canal do Panamá, alertaram analistas nesta segunda-feira (6).
“Os desafios que enfrentará são muito significativos, sendo o principal deles a passagem da polarização e da tensão política para a reconciliação nacional”, disse à AFP Francisco Rojas, reitor da Universidade das Nações Unidas para a Paz, com sede na Costa Rica.
Os dois partidos aliados de Mulino serão minoria no novo Congresso, depois de terem conquistado apenas 15 dos 71 assentos nas eleições gerais de domingo. Mulino "terá que enfrentar um pacote de questões muito relevantes", disse à AFP Marcela Ríos, diretora para a América Latina da International IDEA, uma organização intergovernamental para a promoção da democracia e aconselhamento eleitoral.
"O investimento estrangeiro, o crescimento econômico, as pensões, a crise hídrica são claramente desafios importantes, mas [há] também desafios políticos e um conjunto de desafios sociais pendentes", acrescentou o antigo Ministro da Justiça e Direitos Humanos do Chile.
- Ajuste fiscal? -
Uma questão relevante que deve ser abordada é a seca que obrigou à redução em 2023 do trânsito de navios no Canal do Panamá, motor econômico do país, fator que ameaça reduzir as contribuições para o Tesouro.
O canal funciona com a água doce obtida de lagos artificiais e para cada navio que atravessa são despejados no mar 200 bilhões de litros.
Mas o fenômeno El Niño e as mudanças climáticas reduziram a quantidade de chuva, e o leito do rio necessita de uma fonte adicional de água doce.
O governo estuda a construção de uma barragem e de um gasoduto subterrâneo de oito quilômetros, obras que exigem investimentos milionários.
Mulino também deve atender a diversas demandas sociais de comunidades que carecem de água potável, eletricidade, serviços de saúde e coleta de lixo. "Um grande desafio é a reconciliação socioeconômica do país. O Panamá é altamente desigual", disse Rojas.
Dada a magnitude dos desafios econômicos, os especialistas estimam que o Panamá necessita de um “ajuste fiscal” e precisará eventualmente aumentar os impostos, o que não é fácil em um país com um sistema político clientelista, razão pela qual o economista panamenho Horacio Estribí afirmou que são "urgentemente necessárias medidas que garantam a paz e o consenso social".
"Na medida em que conseguirmos estes aspectos, poderemos recuperar o grau de investimento, reformar o Fundo da Seguridade Social, abastecer o canal com água e melhorar a saúde pública", afirmou.
- Déficit na Previdência Social -
Em março, a agência financeira Fitch baixou o rating do Panamá devido ao aumento da dívida por conta do "grande déficit fiscal" (7,4% em 2023), que ameaça encarecer o crédito ao país.
A redução também foi influenciada pelo "contexto social tenso" devido aos protestos que levaram, no final de 2023, ao fechamento de uma mina de capital canadense acusada de causar danos ambientais.
"A boa notícia é que o Panamá não está à beira de um colapso econômico, a má notícia é que estamos numa situação complexa com poucos precedentes na nossa história", disse Estribí à AFP.
A mina contribuía com 75% das exportações do Panamá e representava 5% do PIB do país. Seu fechamento priva o Tesouro de pelo menos 375 milhões de dólares (R$ 1,9 bilhão) por ano e gera dúvidas sobre a segurança dos investimentos estrangeiros no país.
A economia panamenha cresceu 7,3% em 2023 (uma das taxas mais elevadas da América Latina), mas este ano irá desacelerar para 2,5% segundo o FMI, afetada pelo encerramento da mina e pela seca que afeta o canal.
Além disso, o Panamá enfrenta uma arbitragem com a mineradora canadense, que exige 20 bilhões de dólares (R$ 100 bilhões) em indenização.
Outro desafio complexo é o déficit no caixa da Previdência Social, que ficará sem recursos em 2025 para pagar pensões a mais de 310 mil panamenhos, segundo especialistas.
Uma reforma do sistema poderia contemplar o adiamento da idade de aposentadoria e uma maior contribuição dos trabalhadores, mas estas opções enfrentam resistência dos sindicatos.
"Somos contra o aumento da idade de aposentadoria, o aumento das contribuições e tudo o que realmente represente uma política de retrocesso para a classe trabalhadora", disse à AFP Saúl Méndez, líder do sindicato nacional da construção.
No Panamá, os homens se aposentam aos 62 anos e as mulheres aos 57.
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