O Festival de Cannes recebeu, com grande aclamação, nesta sexta-feira (24), o cineasta iraniano Mohammad Rasoulof, que fugiu de seu país após ter sido condenado à prisão, para apresentar pessoalmente o seu filme "The seed of the sacred fig", candidato à Palma de Ouro.

O diretor fugiu do Irã após ter sido condenado a cinco anos de prisão e a receber chibatadas pelo seu filme anterior que, como toda a sua obra, é uma visão do país dos aiatolás que entra em choque com o regime.

Na semana passada, ele anunciou que havia deixado o Irã clandestinamente, a pé, uma viagem que qualificou como "exaustiva" e "perigosa".

"Quando estava atravessando a fronteira, me virei, estava no topo de uma montanha e dei uma última olhada em minha terra natal. Disse a mim mesmo: 'Voltarei'", declarou Rasoulof na noite de quinta-feira (23), em entrevista ao programa C Ce soir, em Cannes.

"Todos os iranianos que tiveram que partir devido a este regime totalitário têm sempre uma mala perto de si na esperança de que as coisas melhorem e possam retornar", acrescentou, ao lado da atriz iraniana Golshifteh Farahani.

Esta atriz, assim como outras das arriscadas filmagens de "The seed of the sacred fig" acompanharam o diretor no tapete vermelho. Mas os dois protagonistas do filme ficaram no Irã.  

A todo momento, Rasoulof mostrou suas fotos, as do ator Missagh Zareh, que interpreta um juiz, e Soheila Golestani, sua esposa no filme.

A aclamação foi estrondosa na sala Lumière, reservada aos filmes na competição.

Esta estreia foi um dos destaques desta edição de Cannes, festival que se orgulha de defender a liberdade de expressão.

- Um juiz paranoico -

O diretor de 51 anos volta à Croisette pela primeira vez desde 2017, quando venceu a mostra 'Un Certain Regard' por "Lerd", um filme sobre corrupção. Em 2020, ele não foi autorizado a deixar o Irã para receber o Urso de Ouro em Berlim por "Não Há Mal Algum", sobre a pena de morte, uma sentença aplicada maciçamente em seu país.

Sua nova produção conta a história de um juiz iraniano que se torna paranoico e passa a desconfiar de sua própria esposa e filhas durante os protestos em Teerã, de acordo com um comunicado distribuído pelo festival de cinema.

As gravações de "The Seed of the Sacred Fig" aconteceram em segredo, preservando na medida do possível a identidade dos atores.

Alguns conseguiram sair do país após a conclusão do filme e outros estão sob pressão dos serviços de inteligência.

O cineasta é autor de uma cinematografia independente e filmada de forma artesanal, sempre às escondidas da vigilância do regime dos aiatolás.

Ele já apresentou três filmes em Cannes: "Adeus" em 2011, "Manuscritos não Queimam" em 2013 e "Lerd" em 2017.

- Escolha pelo "exílio" -

"Tive que escolher entre a prisão ou deixar o Irã. Com muito pesar, escolhi o exílio", disse o cineasta.

Rasoulof já havia sido preso entre julho de 2022 e fevereiro de 2023, e só foi libertado da prisão graças a uma anistia geral concedida a milhares de pessoas após grandes manifestações pró-democracia que sacudiram o país.

Uma série de personalidades do cinema manifestaram o seu apoio a Rasoulof em uma carta aberta, entre elas a atriz iraniana refugiada na França Zar Amir Ebrahimi, e a atriz de "Anatomia de uma queda, a alemã Sandra Hüller, bem como duas concorrentes do cineasta nesta edição de 2024, a indiana Payal Kapadia e o americano Sean Baker. 

Além de "The seed of the sacred fig", também haverá a exibição do último filme em competição, "La plus précieuse des marchandises", filme de animação do francês Michel Hazanavicius (vencedor do Oscar com "O Artista").

O júri, presidido pela atriz e diretora Greta Gerwig, anunciará a Palma de Ouro no sábado (25).

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