O tribunal marítimo da ONU decidiu nesta terça-feira (21) em favor de nove pequenos Estados insulares que apresentaram uma ação para pedir uma proteção maior dos oceanos frente às mudanças climáticas.

Ao emitir o parecer, segundo o qual as emissões de carbono podem ser consideradas um contaminante marinho, o tribunal afirmou que os países têm a obrigação de tomar medidas para mitigar seus efeitos nos oceanos.

"As emissões antropogênicas de gases de efeito estufa constituem contaminação do meio marinho", considerou o Tribunal Internacional do Direito do Mar, em virtude da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar.

Portanto, os países contaminantes têm "a obrigação específica de tomar as medidas necessárias para garantir que as emissões sob a sua jurisdição ou o seu controle não causem danos por contaminação a outros Estados e ao seu meio ambiente", declarou o tribunal.

A Convenção, da qual participaram 169 Estados, criou esse tribunal, com sede em Hamburgo, Alemanha, com a finalidade de "alcançar o objetivo dos Acordos de Paris de limitar o aquecimento a 1,5ºC", segundo os juízes.

O caso foi apresentado em setembro, por nove pequenos países afetados desproporcionalmente pelas mudanças climáticas: Antígua e Barbuda, Vanuatu e Tuvalu, Bahamas, Niue, Palau, São Cristóvão e Neves, Santa Luzia e São Vicente e Granadinas.

Eles pediram ao tribunal que se pronunciasse sobre se as emissões de dióxido de carbono absorvidas pelos oceanos podem ser consideradas contaminação e, em caso afirmativo, quais obrigações os países teriam para enfrentar o problema.

A sentença do tribunal, que é consultiva e não vinculativa, influenciará na forma como os tribunais nacionais dos países signatários, assim como a justiça internacional, vão interpretar o tratado.

A Convenção da ONU sobre o Direito do Mar obriga os países signatários a evitar a contaminação dos oceanos, a qual define como a introdução de "substâncias" que prejudicam a vida marinha. No entanto, não inclui as emissões de carbono entre os contaminantes específicos, e os demandantes argumentaram que essas emissões devem ser incluídas.

O caso é considerado a primeira grande divergência internacional de justiça climática sobre os oceanos do mundo, e especialistas afirmam que pode ter implicações de amplo alcance para as futuras obrigações dos países no campo das mudanças climáticas.

- 'Vitória histórica' -

"É uma vitória histórica para as pequenas nações insulares, que provam sua liderança neste desafio crucial para o futuro da humanidade", comemorou em nota a Comis, aliança que reúne os demandantes.

"Sem uma ação rápida e ambiciosa, as mudanças climáticas poderiam impedir meus filhos e netos de viver na ilha de seus ancestrais, nossa casa", disse o ministro de Antígua e Barbuda, Alfonso Browne.

Segundo o tratado, os Estados também devem "proteger e preservar o meio ambiente marinho dos impactos das mudanças climáticas e da acidificação dos oceanos" e "restaurar" os ecossistemas já destruídos.

As medidas devem se basear nos "melhores conhecimentos científicos" e ser aplicadas com certa rapidez, devido aos "riscos agudos de prejuízo grave e irreversível ao meio marinho sobre o qual pesam essas emissões".

Essas demandas são totalmente independentes das promessas que os países expressaram nas Conferências das Partes da Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas (COP), uma vez que o direito internacional marítimo tem exigências específicas, acrescentou o tribunal.

- Contaminação marinha -

A decisão inédita analisa por um novo ângulo a noção de "contaminação marinha" citada na Convenção, e inclui os gases de efeito estufa.

Assinado em 1982, o tratado impõe aos Estados signatários "tomar medidas para prevenir, reduzir e controlar a contaminação do ambiente marinho, assim como proteger e preservar esse meio ambiente".

É considerada "contaminação marinha" qualquer "introdução pelo homem, direta ou indiretamente, de substâncias ou energia no meio marinho que cause ou possa causar efeitos destrutivos", diz o texto.

De acordo com essa definição, "as emissões de gás com efeito estufa são contaminação marinha", determinou o tribunal nesta terça. Essas emissões contribuem para o aquecimento e a acidificação dos oceanos, fenômenos que destroem nossos ecossistemas.

"Pela primeira vez, uma Corte Internacional reconhece que o destino de dois bens comuns, os oceanos e a atmosfera, estão relacionados e em perigo pela crise climática", destacou Nikki Reisch, encarregado do Centro para o Desenvolvimento do Direito Internacional do Meio Ambiente (Ciel).

Algumas potências, como os Estados Unidos e a Turquia, não pertencem à Convenção da ONU sobre direitos marítimos.

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) examina atualmente uma ação de Vanuatu para esclarecer as "obrigações" dos países envolvendo as mudanças climáticas.

Em janeiro de 2023, Colômbia e Chile pediram a opinião da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre as obrigações dos países em matéria de luta contra a urgência climática, segundo o direito internacional sobre direitos humanos.

As temperaturas mundiais da superfície dos oceanos alcançaram um recorde mensal em abril por 13 meses consecutivos, segundo o Serviço Copernicus sobre as mudanças climáticas da União Europeia.

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