A África do Sul celebra nesta quarta-feira (29) as eleições legislativas mais disputadas desde o fim do apartheid, há três décadas, nas quais o Congresso Nacional Africano (ANC), partido do falecido Nelson Mandela, pode perder a maioria absoluta pela primeira vez.

Quase 27,6 milhões de pessoas estão registradas para comparecer às urnas e escolher, de forma proporcional, os 400 deputados do Parlamento que, uma vez formado, definirá o próximo presidente em junho.

Pela primeira vez desde a chegada da democracia em 1994, o partido que acabou com o apartheid sob a liderança de Mandela e que retirou milhões de pessoas da pobreza pode ser obrigado a negociar uma coalizão para permanecer no poder.

Os desafios são múltiplos para o ANC, que almeja um segundo mandato para o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa: oposição à esquerda e à direita, a taxa de desemprego e a criminalidade próxima de níveis recorde, além de uma nova geração que não tem recordações da luta contra o domínio branco.

Em Soweto, uma localidade na região de Johannesburgo que virou o epicentro da luta pela liberdade da população negra, os eleitores leais ao ANC compareceram cedo às urnas.

Mas também estavam presentes os eleitores desencantados, como Kqomotso Mtumba, que depois de votar no ANC em outras eleições, decidiu mudar de opção.

"O último partido em que votei, suas promessas não funcionaram, então agora vou testar outro", disse a funcionária de banco de 44 anos.

O sentimento era parecido em Alexandria, bairro de classe operária de Johannesburgo. "Eu realmente preciso de uma mudança", disse uma eleitora de 34 anos, que revelou apenas o primeiro nome, Keletso.

"Precisamos de gente nova, de sangue novo. O desemprego é ruim. Para colocar pão na mesa, alguns recorrem ao crime, outros se prostituem", disse.

Os locais de votação permanecerão abertos até 21H00 (16H00 de Brasília) e, a princípio, os resultados definitivos serão divulgados no fim de semana.

- A votação mais imprevisível -

Durante 30 anos de democracia, os eleitores foram leais ao partido que libertou o país do jugo do apartheid e que, nos primeiros anos de governo, prometia educação, água, moradia e direito a voto para todos.

Mas o partido enfrenta uma perda de popularidade. Nas eleições de 2019, recebeu 57% dos votos e as pesquisas mais recentes apontam para 40% das intenções de voto agora.

Entre a população de 62 milhões de habitantes aumenta a frustração com o desemprego (que afeta um terço da população economicamente ativa), a criminalidade, os escândalos de corrupção e os cortes frequentes de água e energia elétrica.

Em um discurso à nação no domingo, Ramaphosa defendeu a sua gestão e destacou os progressos na luta contra a corrupção e no trabalho para acabar com as lacunas na produção de energia elétrica.

Depois de votar em Soweto, o presidente garantiu que "não há dúvidas de que o povo continuará confiando no ANC mais uma vez".

A votação representa "uma mudança na história política do país", disse Aleix Montana, da empresa de análise de riscos Verisk Maplecroft.

"É, sem dúvida, a mais imprevisível desde 1994", disse o analista político Daniel Silke. 

Se conquistar menos de 201 cadeiras no Parlamento, Ramaphosa terá que negociar com os partidos da oposição e deputados independentes para garantir a maioria.

À direita do atual governo está a Aliança Democrática, um movimento liberal que propõe privatizações e a desregulamentação e que carrega a imagem de partido da minoria branca. As pesquisas apontam que tem 25% das intenções de voto.

À esquerda, com 10% das intenções de votos cada, segundo as pesquisas, estão o partido 'uMkhonto we Sizwe' (MK) do ex-presidente Jacob Zuma e a legenda Combatentes pela Liberdade Econômiac (EFF), que promete reformas radicais como a redistribuição de terras e estatizações.

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