Pela primeira vez na história dos Jogos Olímpicos, haverá tantas mulheres como homens em Paris. Uma paridade alcançada entre os atletas, mas que ainda está muito longe de se tornar realidade entre os treinadores.

"Ainda existe uma verdadeira disparidade de gênero no entorno dos atletas", reconhece o Comitê Olímpico Internacional (COI), que registrou 13% de treinadoras nos Jogos de Tóquio-2020 e 10% nas Olimpíadas de Inverno de Pequim-2022. No Rio-2016, este número foi de 11% e em Pyeongchang-2018, 9%. 

Os número de Paris-2024 ainda não foram divulgados, visto que as classificatórias olímpicas ainda estão em andamento em diversas modalidades. 

Ver uma mulher treinando um homem ainda é incomum. Um dos poucos exemplos foi a aliança entre a ex-tenista número um francesa Amelie Mauresmo e Andy Murray, entre 2014 e 2016.

"Antes eu era sempre o problema, as críticas se dirigiam a mim em caso de derrota. Com Amelie, as perguntas que me faziam o tempo todo se eu perdesse eram sobre o nosso relacionamento", afirmou o escocês ao jornal suíço Le Temps em 2020 sobre o sexismo em seu esporte.

Antes de se tornar técnica da seleção francesa de futebol feminino, Corinne Diacre ganhou as manchetes por se tornar a primeira treinadora de um time profissional masculino, o Clermont, enquanto a americana Becky Hammon abriu portas na NBA no mesmo ano, sendo assistente no San Antonio Spurs.

- "Dar protagonismo" às mulheres -

A modalidade feminina ainda tem a maioria dos cargos de treinadores ocupados por homens, embora haja algumas exceções, como a estrela da ginástica Simone Biles, treinada primeiro por Aimee Boorman e depois pela dupla francesa formada por Cecile e Laurent Landi. Ou a atleta do esqui Mikaela Shiffrin, que escolheu a norueguesa-americana Karin Harjo em 2023. 

"Trata-se de dar um papel de liderança às treinadoras. Conquistei muitas coisas, mas talvez neste momento da minha carreira eu possa ajudar outras treinadoras de esqui a lhes mostrar o que podem alcançar", explicou Shiffrin.

Apostar nas mulheres é a estratégia da agência britânica UK Sport, que propôs em 2021 passar de 10 para 25% de técnicas em Paris-2024: incluindo Mel Marshall, que treina o bicampeão olímpico dos 100 m peito Adam Peaty, e Jane Figueiredo, que levou Tom Daley e Matt Lee ao ouro nos saltos ornamentais em Tóquio-2020. 

Segundo Elizabeth Pike, socióloga da Universidade Inglesa de Hertfordshire e chefe do programa 'Wish' para treinadoras, o caminho destas profissionais está cheio de obstáculos, ressaltando um "contexto social mais amplo".

Os técnicos são muitas vezes recrutados através de "canais informais" favoráveis aos homens. Para ela, as mulheres por vezes são limitadas por "estereótipos" sobre suas competências, "uma rede de apoio limitada", bem como "falta de flexibilidade" para conciliar as tarefas familiares.

A ideia das iniciativas no Reino Unido, Canadá ou Nova Zelândia é chegar aos "países mais tradicionais", afirma Sheila Stephens Desbans, liderança de desenvolvimento esportivo do COI.

Desde 2019, esta organização olímpica propôs para 123 treinadoras — de 22 modalidades e 60 países — um programa que mistura oficinas online, mentorias e reuniões. Pelo menos seis delas estarão em Paris, como a tunisiana Marwa Amri, medalhista de bronze na luta livre (58 kg) nos Jogos do Rio-2016, que começou a treinar crianças durante sua carreira e estará com duas lutadoras em Paris. 

"Aprendi muito para ganhar confiança, assumir responsabilidades de liderança, encontrar treinadores de todo o mundo em vários esportes e compartilhar nossas experiências", diz ela à AFP. 

O programa continuará após os Jogos porque desenvolver treinadoras de elite é um trabalho de longo prazo, ressalta Yasin Yusfi, do COI. 

"A nível amador há muitas mulheres que estão nos clubes, mas quando você sobe de nível a seleção fica mais difícil", declarou.

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