A ideia maluca de organizar a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos no rio Sena quase não viu a luz do dia. Foi preciso superar obstáculos técnicos, políticos e de segurança para que a cortina de Paris-2024 pudesse subir na sexta-feira (26). 

Em maio de 2020, o chefe da polícia de Paris, Didier Lallement, quase deu o golpe final. 

"Ele explicou claramente que não queria esta cerimônia no Sena, que em termos de segurança não era possível", disse um dos participantes daquela reunião, na Ile de la Cité. "Hesitamos entre a possibilidade de organizá-la e a do chefe da polícia convencer as autoridades a não fazê-lo", acrescentou.

Sem precedentes, o projeto inicial fez as forças da ordem suarem frio: centenas de milhares de pessoas espalhadas por seis quilômetros ao longo do Sena, passando pelo centro de Paris, em um contexto de alerta terrorista.

- "Criminoso" -

Especialista em questões de segurança, o criminologista Alain Bauer falou na televisão sobre uma "cerimônia criminosa". Mas a ideia do Sena como teatro de espetáculo nasceu em 1998, na Copa do Mundo, observou Michel Platini, que chefiou a comissão organizadora, em entrevista recente ao jornal Le Figaro. 

"Tínhamos um plano para o Sena. O Estado o rejeitou por razões de segurança. Quando a França foi candidata aos Jogos de 2012, por fim atribuídos a Londres, o ex-presidente Jacques Chirac também imaginou uma cerimônia fora do estádio", explicou a lenda do futebol francês.

De qualquer forma, a ideia estava em mente desde o momento da candidatura aos Jogos de 2024, afirmaram diversas fontes próximas à organização.

Em uma noite de outubro de 2016, por ocasião da Noite Branca parisiense, o festival cultural noturno organizado todos os anos na capital, a prefeita, Anne Hidalgo, e o presidente do COI, Thomas Bach, observaram os barcos com as cores olímpicas navegarem pelo rio parisiense, em frente à Notre-Dame. "Não sei se teve influência, mas ela se lembra", disse um responsável político parisiense.

Outro acontecimento serviu para convencer Bach a dar esse passo e descartar o estádio: a cerimônia dos Jogos Olímpicos da Juventude em Buenos Aires, em 6 de outubro de 2018. As imagens de felicidade da população argentina emocionaram o alemão, que dois meses depois mostrou a sua convicção perante os comitês nacionais. 

"Quando cheguei ao COJO [Comitê Organizador dos Jogos], a ideia de fazer [a cerimônia] fora do estádio já pairava no ar e o contexto era favorável", recordou à AFP Thierry Reboul, diretor de cerimônias da comissão organizadora, contratado em maio de 2018. 

O ex-presidente da agência Ubi Bene conseguiu instalar uma pista de atletismo no Sena por ocasião do dia olímpico, realizado em junho de 2017. 

Será que Reboul, que mais tarde se juntaria à equipe de Estanguet no COJO, já tinha essa ideia? "Sinceramente, de jeito nenhum, na história da pista de atletismo eu queria a imagem, mas não pensei nisso", afirmou.

- Champs-Élysées -

"Me falaram muito rápido sobre o Champs-Élysées, só que não achei muito original", disse Reboul sobre a sua chegada ao comitê organizador. "Certo dia, andando por Paris, disse a mim mesmo: 'obviamente é no Sena que devemos fazer isso'".

Uma versão que não foi aceita por todos. "Não sei quem teve a ideia primeiro, mas o que tenho certeza é que a ideia do Sena já estava presente quando Reboul chegou ao COJO", afirmou um membro do entorno da prefeita de Paris. 

O COJO trabalha no projeto desde 2019 e foi necessário o envolvimento do poder público. O seu presidente Estanguet falou em novembro de 2020 com Emmanuel Macron, que afirmou em uma entrevista ao L'Equipe que era uma ideia "maluca" que ele apoiava. 

O presidente francês oficializou o projeto nos Jogos de Tóquio, há três anos. Começou, então, uma corrida contra o tempo para alcançar algo nunca visto antes, que culminará na sexta-feira.

cto/ng/pm/ma/aa/cb