SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Quem se assustou que tome um chá de camomila", disse o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, nesta terça-feira (23), um dia depois que o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou estar "assustado" com declarações do venezuelano de que haveria um "banho de sangue" no país caso ele perdesse as eleições, marcadas para o próximo domingo (28).
"Eu não disse mentiras. Apenas fiz uma reflexão. Quem se assustou que tome um chá de camomila", declarou Maduro, sem mencionar Lula. "Na Venezuela vai triunfar a paz, o poder popular, a união cívico-militar-policial perfeita".
Em entrevista à imprensa estrangeira, Lula expressou preocupação com as falas de Maduro. "Fiquei assustado com as declarações [...]. Quem perde as eleições toma um banho de votos, não de sangue. Maduro tem de aprender: quando você ganha, você fica. Quando você perde, você vai embora e se prepara para disputar outra eleição", disse o petista.
O ditador venezuelano fez referência ao "Caracazo", um levante em fevereiro de 1989 que deixou milhares de mortos, segundo denúncias, embora o balanço oficial tenha sido de cerca de 300 óbitos. O antecessor de Maduro, Hugo Chávez (1999-2013), justificou com isso a insurreição fracassada que liderou em 4 de fevereiro de 1992 e que marcaria a ascensão de sua popularidade.
"Eu disse que se a direita extremista chegasse ao poder político na Venezuela haveria um banho de sangue. E não é que eu esteja inventando, é que já vivemos um banho de sangue, em 27 e 28 de fevereiro", manifestou Maduro.
"Eu prevejo para aqueles que se assustaram que na Venezuela vamos ter a maior vitória eleitoral da história", insistiu o ditador venezuelano, que aspira a um terceiro mandato que o projetaria a 18 anos no poder.
O diplomata Edmundo González é o candidato da principal aliança opositora, que o respaldou devido à impossibilidade de apresentar a ex-deputada María Corina Machado, favorita nas pesquisas, mas impedida de exercer cargos públicos pela Justiça.
González agradeceu a Lula em publicação na plataforma X. "Agradecemos as palavras do presidente em apoio a um processo eleitoral pacífico e amplamente respeitado na Venezuela. Valorizamos agradecidamente a presença do ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, para observar o processo do próximo domingo. O mundo nos observa e acompanha", disse o candidato.
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela convidou organizações sociais brasileiras simpáticas ao chavismo para acompanhar as eleições.
A entidade eleitoral, controlada por aliados de Maduro, ainda fez um convite ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para organizar uma missão de observação, porém limitada a dois técnicos --o tribunal num primeiro momento recusou, sob o argumento de que está focado no pleito municipal que ocorrerá em outubro no Brasil. Semanas depois, voltou atrás e decidiu enviar os dois técnicos para acompanhar o pleito.
A relação entre o governo Lula e a ditadura Maduro tem sofrido solavancos neste ano e mudou em meio às obstruções do regime venezuelano no processo eleitoral do país.
Em março, o governo brasileiro mudou o tom em relação a Caracas, antiga aliada petista, e criticou pela primeira vez o bloqueio à candidatura de Corina Yoris, então escolhida pela oposição para substituição de María Corina.
Em nota, o Itamaraty disse na ocasião que acompanhava "com expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral" no país, marcando uma inflexão na postura até então adotada por Lula em relação ao regime do ditador Nicolás Maduro, isto é, de preservar o aliado sul-americano.
Naquele momento, ao menos outros sete países da América Latina já haviam expressado "grave preocupação" com o impedimento da candidatura de Yoris, em uma nota conjunta de Argentina, Uruguai, Peru, Paraguai, Costa Rica, Equador e Guatemala. O Brasil decidiu aguardar o fim do prazo eleitoral de registro de candidaturas para se pronunciar.