Rebeca Andrade teve que saltar muito alto para alcançar a elite e, uma vez no topo, não para de derrubar portas. Depois de fazer história em Tóquio, a brasileira se consolidou em Paris como a grande adversária de Simone Biles, que a considera sua rival mais temida.

Com ouro no salto e prata no individual geral, Rebeca se tornou em Tóquio-2020 a primeira brasileira a subir ao pódio olímpico na ginástica feminina e uma das protagonistas daqueles Jogos atípicos.

A jovem paulista deu naquela ocasião um passo à frente diante de Biles, que estava fragilizada pelos 'twisties', fenômeno que faz com que as ginastas percam o senso de direção no ar, e que a obrigou a desistir da maioria das provas.

E em Paris, com a volta da americana, não diminuiu seu voo.

Depois de liderar o Brasil ao bronze histórico na final por equipes de terça-feira, Rebeca, de 25 anos, mais uma vez se tornou a perseguidora mais próxima de Biles nesta quinta-feira. Embora tenha terminado com a prata sob aplausos intensos, ela chegou até a ultrapassar a americana num determinado momento da final.

"Eu não me canso de competir contra ela porque ela é a melhor e traz o que você tem de melhor. Espero que seja recíproco. Estou muito feliz por ela estar aqui. Sei o que ela sofreu em Tóquio", disse Rebeca após a final.

- Inspiração -

Seguida por 4,3 milhões de pessoas no Instagram e inspiração para uma nova geração de ginastas brasileiras, Rebeca também sabe o que é ter um país que a admira.

"Rebeca Andrade, parabéns pela segunda medalha na prova individual mais completa da ginástica artística. Orgulho do nosso país", escreveu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta quinta-feira na rede social X.

Os holofotes não assustam esta jovem que sabe bem que o caminho para o sucesso é cheio de obstáculos.

"Sei que é uma responsabilidade, mas não me sinto pressionada e não sinto isso como um fardo, porque sei que não sou obrigada a voltar ao meu país com medalhas", disse ela em entrevista à AFP em maio.

Rebeca Andrade nasceu em Guarulhos, periferia de São Paulo, em uma casa humilde mantida sozinha pela mãe, Rosa Santos, empregada doméstica e mãe de oito filhos.

Um projeto social em sua cidade a levou aos quatro anos para uma academia, onde chamou a atenção rapidamente.

"Ela não tinha paciência para ficar parada. Não dava para colocar música porque ela logo começava a dançar e imitava uma coreografia feita pelas meninas mais velhas", lembra sua primeira treinadora, Mônica Barroso dos Anjos.

Sua participação nos treinos chegou a ficar em risco por falta de dinheiro para o transporte. Mas vendo a sua capacidade, seus irmãos mais velhos se ofereceram para acompanhá-la numa caminhada de duas horas. 

Não demorou muito para que ela fosse apelidada de "Daianinha de Guarulhos", em referência a Daiane dos Santos, primeira ginasta brasileira a ser campeã mundial (2003) e sua grande inspiração. Ainda criança, foi treinar por uma temporada em Curitiba, antes de se transferir para o Flamengo.

- Perseverança -

Sua promissora carreira quase foi interrompida em diversas ocasiões devido a complicadas lesões no joelho que a obrigaram a se submeter a três cirurgias entre 2015 e 2019.

Mas na parte mais difícil de um processo cheio de incertezas, uma certa Simone Biles, então já rainha da ginástica, lhe disse durante os Mundiais de 2018 para não desistir, porque ela tinha talento.

"Eu estava sentada, ela estava passando e, do nada, se sentou do meu lado e me falou isso. Fiquei super feliz e disse para mim mesma: 'Meu Deus, a melhor pessoa do mundo pediu para que eu não desista. Agora tenho certeza de que não vou desistir'", contou ela à TV Globo.

Após a primeira cirurgia, Rebeca conseguiu chegar à Rio-2016, onde terminou em décimo primeiro lugar na classificação geral. A sorte esteve do seu lado para Tóquio, já que o adiamento devido à pandemia aumentou a sua margem para se recuperar de uma nova cirurgia e se consagrar no Japão.

Agora mais madura, ela voltou a encantar, desta vez em Paris. E isso não surpreendeu ninguém. Todo mundo já sabe quem é Rebeca Andrade.

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