BOGOTÁ, COLÔMBIA (FOLHAPRESS) - O maior e um dos únicos observadores independentes da eleição presidencial na Venezuela, o Carter Center diz que verificou os dados das atas eleitorais coletadas pela sociedade civil e por representantes de partidos opositores e que eles são consistentes.

 

Assim, a organização afirma que o opositor Edmundo González venceu de maneira clara e "por uma margem intransponível".

 

O centro diz ainda que esses resultados coincidem com uma pequena amostra de dados dos resultados coletados por seus observadores em campo no dia da votação e que não há dúvidas da vitória real da oposição. É uma das manifestações mais contundentes até aqui.

 

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Falando à reportagem, a organização afirma que o Poder Eleitoral no país é enviesado e que não agiu de maneira independente no pleito que oficialmente elegeu Nicolás Maduro para mais seis anos no poder.

 

"O chavismo está impregnado no Estado venezuelano de tal forma que está presente nas instituições que deveriam ser independentes de uma maneira frugal", diz Ian Batista, analista eleitoral na missão de observação que, a convite de Caracas, o Carter Center enviou.

 



 

"Quem nomeia os reitores principais do Conselho Nacional Eleitoral é a Assembleia Nacional, que está 100% fechada com o chavismo. Não há instituições que poderiam balancear os poderes. A Constituição prega algum nível de independência, mas como o chavismo está impregnado em todos os lugares, eles controlam todos os altos cargos."

 

 

Batista esteve por um mês na Venezuela para acompanhar o período pré-eleitoral e o pleito de 28 de julho. Com ele, outros 16 analistas do Carter Center que se dividiram entre Caracas e estados interioranos.

 

Mas, de supetão, a equipe deixou o país nos dois dias que sucederam a eleição e, quando o último de seus membros saiu do território venezuelano, publicou um comunicado oficial taxativo no qual dizia que o pleito não fora democrático.

 

 

"A gente não recebeu nenhum tipo de intimidação por parte do governo ou da autoridade eleitoral. Mais do que isso, todas as condições do memorando de entendimento que assinamos em abril com Caracas, para termos liberdade de movimento, de expressão e de acesso ao processo, foram cumpridas", relata Batista.

 

"Mas os fatos da noite do domingo de votação, especialmente o de que o CNE não apresentou um resultado transparente e granular dos votos, e a oposição clamar ter esses números, nos fizeram esperar protestos populares, possivelmente com repressão por parte do governo e muito isolamento internacional. Entendemos que por razão de segurança dos nossos membros, a gente precisava sair do país."

 

 

O Carter Center foi convidado pelo próprio Estado venezuelano. O nome da organização baseada em Atlanta, nos Estados Unidos, aparece no famoso Acordo de Barbados, que, cada vez mais enfraquecido, foi assinado entre regime e oposição em outubro passado.

 

O texto celebrado internacionalmente previa convites a missões de observação eleitoral para o Carter Center, a União Europeia (UE), a ONU e a União Africana. Mas a organização virou peça central quando repentinamente e sem debater entre todas as autoridades eleitorais o CNE desconvidou o bloco europeu, e a ONU enviou meramente um painel de especialistas que, pelo regramento das Nações Unidas, não emite declarações públicas avaliativas sobre a condução do processo.

 

Os pesquisadores do Carter Center hoje se permitem fazer um adendo aos elogios que seu fundador, o ex-presidente americano Jimmy Carter, teceu ao sistema eleitoral na Venezuela há mais de uma década. Em 2012, ele afirmou que o sistema venezuelano era o melhor do mundo. "De fato é um excelente sistema eleitoral, mas se fosse implementado na sua essência e como está previsto em lei", diz Ian Batista.

 

"É boa prática internacional que sistemas eletrônicos de votação tenham um sistema paralelo de conferência do voto, geralmente em papel. O papel e a conferência ao final da votação dos números da máquina e dos comprovantes gera confiança na população. Existe uma robusta série de auditorias realizada no sistema da Venezuela. São independentes, nós as acompanhamos. Agora: eles têm a capacidade de divulgar os resultados granulados e até agora não o fizeram."

 

"Os militares nesse momento possuem a custódia de todas as atas. Essa demora para divulgá-las não é plausível. O fato de que não fizeram isso até agora levanta sérias suspeitas sobre o resultado geral que foi anunciado pela autoridade eleitoral."

 

A equipe do Carter Center afirma ter encontrado o que chamam de graves desequilíbrios em diversas partes do processo eleitoral ao compará-las com aqueles que são consideradas boas práticas internacionais para um pleito democrático.

 

"O próprio processo de registro de eleitores não atendeu ao padrão internacional", relata Batista.

 

"Os imigrantes não tiveram oportunidade de se registrar. E existe uma estimativa de que 3 milhões de venezuelanos dentro do país tampouco conseguiram atualizar seu registro eleitoral porque migraram internamente e o período proposto pela autoridade eleitoral para atualização do registro foi insuficiente para atender a essa demanda."

 

Ele também menciona a atuação do CNE, que descreve como não independente. "O CNE não foi aberto para os atores políticos como foi aberto para o governo. Esse tipo de não abertura foi até físico: temos relatos de representantes partidários que chegavam ao CNE e eram impedidos de entrar para levar qualquer tipo de comunicado formal à autoridade eleitoral. Isso é realmente bastante grave."

 

Batista também descreve um abuso de recursos estatais para Nicolás Maduro. Menciona por exemplo publicações nas redes sociais da Receita Federal venezuelana em campanha pelo líder do regime e também a observação de que, em uma simulação de eleição realizada um mês antes do pleito real, ônibus e carros com adesivos de propaganda do regime levavam eleitores para simular a votação. "Foi uma verdadeira simulação de mobilização da base do governo."

 

"É importante lembrar que, em eleições passadas, o PSUV [partido de Maduro], que sempre teve maior capacidade de mobilização de testemunhas eleitorais, sempre se prendeu à existência dessas atas para confirmar o resultado das eleições. O que muda nesse pleito é essa capacidade considerável que a oposição teve de também mobilizar suas testemunhas e estar presente nos centros de votação."

 

A equipe do Carter Center ainda levará alguns meses para divulgar seu informe final sobre o pleito venezuelano. Mas até aqui já vem sendo atacada pelo regime de Maduro. O ditador afirmou que a organização já estava com o informe pronto antes mesmo de acompanhar o pleito.

 

Depois, seu chanceler, Yván Gil, disse que o grupo baseado nos EUA "mente descaradamente" "Uma vergonha colocar essa instituição em um plano de golpe de Estado" disse ele.

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