Uma contagem regressivaque deu início a uma arrecadação de fundos que promete "a queda" do governo do presidente Nicolás Maduro na Venezuela, o pedido de um ex-Navy SEAL para "votar com dólares", notícias falsas e um apelo do presidente esquerdista para "polir os fuzis". Parece um filme, mas é real.

Acompanhado de uma agressiva campanha nas redes sociais, “Ya Casi Venezuela” é um site lançado há algumas semanas em meio às denúncias de fraude da oposição pela reeleição de Maduro em 28 de julho. A procuradoria venezuelana anunciou nesta terça-feira (24) que abriu uma investigação criminal.

A contagem regressiva marcava dias, horas, minutos e segundos até 16 de setembro, data que promovia como um marco para "um movimento" que faria "cumprir a vontade do povo venezuelano". Quando a contagem chegou a zero, após especulações de todo tipo, iniciou-se uma arrecadação de fundos com uma face pública: Erik Prince.

Trata-se de um ex-membro da força americana de operações especiais Navy SEALs, que fundou a controversa empresa militar privada Blackwater, rebatizada como Academi após o envolvimento no massacre de 17 civis em Bagdá, em 2007, por seus mercenários, e absorvida pela atual Constellis em uma fusão com uma firma rival.

Prince afirmou em um vídeo que  mais de um milhão de dólares, de uma meta de 10 milhões, já havia sido arrecadado nas primeiras 72 horas: "Venezuela, vocês votaram pela liberdade em 28 de julho. Agora, chegou a hora de votar com dólares."

Nenhum líder da oposição fez referência à página. A AFP tentou entrar em contato com dirigentes políticos, mas até o momento não obteve resposta.

O procurador-geral venezuelano, Tarek William Saab, declarou nesta terça-feira que os envolvidos com esse site "estão cometendo crimes" e que "quem doou, seja 1 ou 20 dólares, é cúmplice".

- "Hora de polir os fuzis" -

"Diante dos relógios de contagem regressiva, é hora de polir os fuzis, e nós temos os polido", disse Maduro em um ato público.

Na última sexta, “Ya Casi Venezuela” foi um dos temas da conversa entre Maduro e o secretário-geral da ONU, António Guterres, que expressou "preocupação" com as violações de direitos humanos denunciadas na Venezuela durante os protestos pós-eleitorais, que deixaram 27 mortos - dois deles militares - e mais de 2.000 detidos.

Segundo uma nota oficial, o presidente advertiu sobre "agressões externas", como a "contratação de mercenários para invadir o país".

Nos dias anteriores, quatro americanos - um deles militar ativo -, dois espanhóis e um tcheco foram presos, enquanto as autoridades denunciavam um plano para assassinar Maduro e outros funcionários do alto escalão.

O site, pelo qual nenhuma organização assumiu responsabilidade, não forneceu informações sobre quais iniciativas pretende financiar. A AFP solicitou uma entrevista com um porta-voz por meio do site, sem sucesso.

Maduro alertou Guterres sobre "ameaças" nas redes sociais, onde "promovem, inclusive, a arrecadação de fundos para realizar atentados contra as instituições".

"Esse senhor Erik Prince, ameaçando (...) Não estamos desarmados", reagiu o ministro da Defesa, general Vladimir Padrino. "Vão receber uma resposta contundente, em primeira linha, das Forças Armadas."

O chavismo frequentemente denuncia conspirações. "Eles gostariam de copiar a Operação Gedeão", disse Saab, em referência a um plano para invadir a Venezuela que, em 2020, resultou na morte de oito mercenários, segundo as autoridades, e na prisão de dois americanos.

Na conta do “Ya Casi Venezuela” na rede social X, alguns se mostravam esperançosos, enquanto outros eram céticos. "Estou dentro, quem não arrisca não ganha", escreveu um usuário. "Era só o que faltava", reclamou outro.

O ministro do Interior, Diosdado Cabello, classificou a arrecadação de fundos como uma "fraude".

Prince "viu um potencial criminoso para levantar dinheiro de forma ágil e rápida", afirmou Cabello. "Daí nasceu a ideia de usar como fachada a 'liberdade', entre aspas, da Venezuela”, acrescentou o ministro, que pediu aos Estados Unidos uma "investigação aberta e séria".

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