Longe da burocracia das finanças internacionais, uma solução a priori muito simples ganha terreno para proteger as populações vulneráveis dos eventos climáticos: transferir dinheiro para elas rapidamente, mesmo antes da catástrofe acontecer. 

Perante uma inundação, um furacão ou um grande incêndio, "quanto mais rápido receberem o dinheiro, melhor", resume Ranil Dissanayake, pesquisador do Centro para o Desenvolvimento Global. 

Melhor ainda seria entregá-lo antes do desastre: "Os beneficiários podem então preparar as suas casas, armazenar alimentos ou deslocar-se para áreas seguras", explica à AFP. 

"Imaginem a diferença que isso pode fazer para os trabalhadores do norte da Índia que, se obtiverem ajuda antes de uma onda de calor de 50ºC, não teriam necessariamente que trabalhar" nessas condições.

- No momento crítico -

Este tipo de intervenção "preventiva", implementada nos últimos anos por organizações humanitárias em outros contextos, é recomendada por especialistas como a economista francesa Esther Duflo, mas ainda é pouco comum para fenômenos climáticos, que deverão tornar-se cada vez mais intensos e frequentes. 

No entanto, transferências diretas via celular ou saques com cartões já foram testados. 

A ONU realizou uma dúzia de projetos-piloto na Etiópia e na Somália, países afetados pela seca, e em Bangladesh, onde em 2020 mais de 23.000 famílias conseguiram receber 53 dólares (275 reais na cotação da época) por semana antes do pico de uma grande inundação. 

"Há um consenso de que isso funciona, e que dar dinheiro mais cedo tem um maior benefício social ao fornecer ajuda em um momento crítico", destaca Ashley Pople, pesquisadora do Centro para o Estudo de Economias Africanas da Universidade de Oxford, que estudou o caso de Bangladesh.

De acordo com este estudo, os beneficiários conseguiram se abastecer e também proteger os seus animais e, portanto, o seu sustento. Para as famílias que não se beneficiaram, o risco de passar um dia sem comer aumentou em 52%. 

Quando ocorre uma catástrofe, "muitos bancos multilaterais de desenvolvimento pensam em como ajudar rapidamente os governos. Mas não há muito sobre como levar fundos rapidamente às pessoas mais afetadas", diz Pople.

- 100 dólares para evitar o pior -

Desde 2020, o programa americano GiveDirectly interveio em Bangladesh, na República Democrática do Congo e no Malawi, transferindo, por meio de dispositivos móveis, dinheiro para populações que enfrentam crises, como conflitos ou deslocamentos. 

A Nigéria teme enchentes novamente neste outono, por isso 20.000 famílias foram pré-registradas, das quais as mais expostas receberão 320 dólares (cerca de 1.760 reais) pelo menos três dias antes do pico das cheias. 

Para identificá-las, a ONG, em parceria com o Google, usa uma combinação de imagens de satélite, mapas de enchentes gerados por inteligência artificial, dados administrativos e pesquisas de campo. 

Em Moçambique, mais de 7.500 famílias receberam 225 dólares (cerca de 1.170 reais) três dias antes das enchentes de 2022. Em Bangladesh, 15.000 pessoas receberam 100 dólares (551 reais) em 2024, antes das cheias do rio Jamuna. 

Porém, esse tipo de atuação tem seus limites e desafios.

"São necessárias previsões suficientemente precisas e detalhadas, de preferência a nível de uma cidade ou comunidade", explica Pople, mencionando o trabalho do Google neste sentido sobre as enchentes. 

Alguns fenômenos, como os furacões, também são mais difíceis de prever devido à mudança de trajetória. 

"Conseguimos prever certos desastres em alguns lugares. Mas para outros são necessários mais investimentos, especialmente em estações meteorológicas", diz Dissanayake, que também menciona a necessidade de eliminar "barreiras políticas". 

"Devemos reconhecer explicitamente que isso faz parte das ferramentas para responder à mudança climática e financiá-lo de forma eficaz", sublinha o pesquisador.

Embora isso não descarte o financiamento de "infraestruturas, transporte, diques... A ajuda individual antecipada pode ser uma boa parte da solução, mas raramente consegue fazer tudo".

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