Com várias estradas bloqueadas, a Bolívia está parcialmente paralisada por protestos de agricultores que há nove dias pedem "o fim da perseguição judicial" contra seu líder, Evo Morales, investigado pelo suposto abuso de uma menor quando era presidente.

A maioria dos protestos ocorrem em Cochabamba, no centro do país, onde o ex-presidente de 64 anos tem sua base política. 

Com pedras, terra e fogueiras, os agricultores bloquearam várias estradas que ligam este departamento a La Paz (oeste), Santa Cruz (leste), Sucre (sul) e Potosí (sul). 

Nesta quarta-feira, os motoristas do transporte público de La Paz anunciaram que também tomarão a cidade por 24 horas devido à escassez de combustível. 

A falta de diálogo entre os manifestantes e o governo, além do silêncio do Ministério Público sobre a "prisão" que anunciou contra Morales, investigado por "estupro, tráfico de pessoas e contrabando", alimentam a paralisação. 

Morales acusa o presidente Luis Arce, seu ex-ministro, de tentar "vetá-lo" da corrida presidencial através da abertura de múltiplas investigações criminais. 

Embora os protestos tenham começado com a intenção de evitar a possível prisão do líder aimará, agora exigem que Arce encontre uma saída para a crise derivada da falta de dólares e de combustível.

- Diálogo em ponto morto -

"A cultura política da Bolívia em geral é muito caudilhista (...). Tudo isso faz deste um cenário onde compreender, dialogar, concordar, é quase impossível", observa Daniel Valverde, professor de Ciências Políticas da Universidade René Moreno. 

Os grupos próximos ao líder cocaleiro enviaram uma carta a Arce exigindo, além do "fim da perseguição judicial" ao líder aimará, seu reconhecimento como candidato do governo e a revogação de um pacote de normas. 

"Não vamos ceder àqueles que querem incendiar o país para se proteger de acusações pessoais contra as quais devem mostrar a cara", respondeu Arce. 

Os bloqueios passaram de quatro pontos para 20 desde o início dos protestos. 

Até o momento, foram relatados confrontos nos pontos de Parotani, Pojo, Epizana e Caracollo, em Cochabamba. Em Puente Ichilo, em Santa Cruz, cerca de 700 policiais desbloquearam a estrada com gás lacrimogêneo, mas foram depois afastados pelos manifestantes. 

"Esperava-se que este fosse um governo de reconciliação para solucionar as divisões da crise de 2019", acrescenta Valverde.

- Pauta sem novidades -

O estopim dos bloqueios foi o anúncio da promotora Sandra Gutiérrez de que preparava um mandado de prisão contra Morales pelo suposto abuso de uma menor com quem teria tido uma filha quando era presidente. 

O ex-presidente garante que se trata de "mais uma mentira", já que o mesmo caso foi investigado e arquivado em 2020. 

Seus apoiadores exigem que Arce interrompa a investigação , embora esteja nas mãos de uma instituição autônoma de justiça. 

Enquanto os agricultores também protestam contra a difícil situação que o país atravessa, os bloqueios levam a crise econômica ao limite. 

As perdas econômicas devido aos bloqueios, iniciados em 14 de outubro, somam pelo menos 81 milhões de dólares (461 milhões de reais na cotação atual), segundo o Ministério da Economia. 

Os dois principais centros econômicos da Bolívia, La Paz e Santa Cruz, estão separados por Cochabamba, a terceira região em produção que serve como área de trânsito. 

O contexto econômico não é dos mais favoráveis: o país registrou uma inflação interanual de 6,2% em setembro, a mais alta desde julho de 2014.

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