SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos nesta quarta-feira (6/11) leva o mercado financeiro global a precificar juros mais altos por mais tempo, além de uma valorização do dólar em relação às demais divisas globais.
Com a promessa de elevar tarifas de importações e dificultar a imigração, a expectativa é que o segundo governo do republicano aumente a inflação americana, o que faria com que os juros dos EUA também permanecessem em um patamar alto. Tais fatores, combinados à expectativa de fortalecimento da economia americana e incerteza quanto ao cenário geopolítico global, tendem a fortalecer o dólar.
"O efeito imediato é o dólar e os juros mais fortes, mas nas próximas semanas o fiscal brasileiro deve voltar ao foco", afirma Marcelo Mello, CEO da SulAmérica Investimentos.
A moeda americana, que disparou para R$ 5,861 logo após o início das negociações, virou para queda de 1,11% às 15h10 cotada a R$ 5,682 na venda, com a expectativa pelo corte de gastos que está para ser anunciado pelo governo Lula.
Nas últimas semanas, o câmbio ficou estressado com a possibilidade de vitória de Trump, o que levou o dólar a se aproximar de R$ 5,87. Dada a antecipação na precificação do resultado das eleições, analistas não esperam uma nova disparada do dólar ante o real.
"Com maior clareza em relação ao pacote fiscal do Brasil e sobre as políticas que Trump vai adotar, podemos ver uma redução da volatilidade e um menor estresse sobre a taxa de câmbio até o final do ano", afirma Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
No momento, o mercado financeiro já aposta em um ciclo de queda de juros menor nos EUA, com a taxa indo dos atuais 5% para 4%, ante expectativa de 3,75% há uma semana.
"Juros mais altos nos EUA são ruins porque pressionam o câmbio brasileiro e, por sua vez, também os juros futuros brasileiros. Aliado a isso, a inflação segue pressionada aqui, com o mercado de trabalho aquecido e salários mais altos no Brasil", afirma Rafael Haddad, planejador financeiro do C6 Bank.
Com o cenário mais favorável para investimentos nos EUA, dado a moeda forte, juros maiores e isenção a empresas locais, o aporte em emergentes tende a ser preterido. Dessa forma, para capturar recursos estrangeiros, o governo brasileiro deve reduzir a percepção de risco quanto ao país, reduzindo a trajetória de endividamento do Brasil.
"Principalmente agora, com a definição das eleições nos EUA, é preciso um pacote de medidas que vá desindexar alguns benefícios sociais e que comece a tratar de uma nova reforma na Previdência", diz Mello.
Hoje, a dívida pública beira os 80% do PIB (Produto Interno Bruto) e a expectativa é que vá a 88% do PIB ao fim de 2026. Se essa previsão for revisada para baixo, o Brasil poderia ver uma entrada de capital estrangeiro, e consequentemente, de dólares, no país.
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"Se o governo soltar medidas mais imediatistas, que resolvem 2024, o mercado não reagirá bem", afirma Mello.
Porém, com juros maiores nos EUA, o Brasil pode ter que subir a Selic (taxa básica de juros da economia) para financiar a dívida pública, tornando-a mais rentável que os títulos americanos. Atualmente, a taxa básica brasileira está em 10,75% ao ano e a expectativa é que vá para 11,25% nesta quarta.
"O trabalho do Banco Central brasileiro fica bem mais difícil. O mercado precifica a Selic acima de 13% no ano que vem", afirma Gustavo Pi Okuyama, gestor de renda fixa da Porto Asset.
Renda fixa
Juros mais altos no Brasil beneficiam a renda fixa, especialmente a pós-fixada, que acompanha a trajetória da Selic.
Ian Lima, diretor de renda fixa ativa da Inter Asset, recomenda o Tesouro Selic para investimentos com objetivo de curto prazo e o Teosuro IPCA+ (NTN-B) em prazos mais longos.
"Apesar do juro real de quase 7% nos prazos mais curtos da NTN-B, o BC deixa a entender que irá perseguir um juro real acima de 7%, o que deixa os investimentos ligados ao CDI preferíveis no curto prazo", diz Lima.
Segundo o gestor, os títulos IPCA+ com vencimento para 2045, que tem juros anuais de 6,65%, praticamente dobram o valor investido, em termos reais, a cada dez anos. Ou seja, o montante original estará mais de quatro vezes maior no vencimento, já considerando a inflação.
Nesta quarta, o Tesouro IPCA+ com vencimento em 2029 oferece um retorno de IPCA + 6,83%, enquanto o de 2035 rende IPCA + 6,63%.
Para Mauro Orefice, gestor da B.Side Wealth Management, o pacote de corte de gastos do governo brasileiro deve mexer mais com os investimentos de renda fixa do que a vitória de Trump.
"Se vier um bom pacote crível e o mercado comprar, temos muito espaço para a nossa curva prefixada de juros diminuir os patamares de prêmio", diz Orefice.
Caso os juros futuros caiam, ativos de renda fixa contratados após essa queda tendem a remunerar menos o investidor.
Após o pico da última sexta (1º), os juros futuros brasileiros já arrefeceram. O IPCA+ para 2029, que chegou a 7% na data, agora paga 6,83% ao ano para contratações feitas nesta quarta.