Após acabar com a violência dos grupos criminosos, o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, assumiu um novo desafio envolto em polêmicas: resgatar a mineração, proibida desde 2017, para transformar uma economia de lento crescimento.
O presidente afirmou que é "absurdo" que a mineração seja proibida no país que tem os depósitos de ouro "com a maior densidade por quilômetro quadrado do mundo", por isso, pedirá ao Congresso, controlado por seu partido, que revogue a lei.
"Estudos realizados em apenas 4% da área potencial identificaram 50 milhões de onças de ouro, avaliadas hoje em 131,565 bilhões de dólares (797 bilhões de reais na cotação atual). Isto equivale a 380% do PIB", publicou Bukele na rede social X em 27 de novembro, sem revelar a autoria dessas pesquisas.
"Se explorarmos nossos recursos naturais de forma responsável, poderemos mudar a economia de El Salvador da noite para o dia", declarou dias depois.
- "Risco tremendo" -
Os anúncios soaram o alarme para os ambientalistas, e cerca de quinze ONGs convocaram protestos perto do Congresso nesta terça-feira (10).
"Uma coisa é colocar uma mina no deserto do Atacama [no Chile] e outra é abrir uma mina a céu aberto em Chalatenango [norte de El Salvador], onde temos uma alta densidade populacional e onde estão localizadas as poucas reservas florestais do país", disse o ativista Pedro Cabezas à AFP.
Antonio Pacheco, líder da ONG ADES, afirmou que a mineração na bacia do rio Lempa, que fornece água à capital, "implica um risco tremendo".
No sopé do cerro de San Sebastián, na antiga área de mineração de Santa Rosa de Lima (nordeste), onde a empresa de mineração americana Commerce Group teve sua licença revogada em 2006 devido à poluição do rio, há discordância sobre o plano de Bukele.
"Acho que, com isso, o cantão (área rural de um município) poderia prosperar (...), geraria emprego" e "beneficiaria a todos", disse à AFP o pedreiro Rubén Delgado, de 55 anos.
Mas José Torres, que extrai pepitas de ouro de poços que abre manualmente, se opõe ao projeto por medo de perder sua fonte de renda.
"Os rios ficam poluídos, os animais morrem e não podemos ter nada aqui", afirmou o trabalhador de 72 anos.
Desde que El Salvador dolarizou sua economia em 2001, o país registrou um crescimento médio do PIB de 2,1%. Atualmente, 27% dos salvadorenhos vivem na pobreza, de acordo com a Cepal, e quase 70% dos trabalhadores são informais.
Estes fatores, juntamente com a violência das gangues, estimularam a emigração.
- "Negociar de outra forma" -
Para o economista Carlos Acevedo, ex-presidente do Banco Central de Reserva, os números "espetaculares" apresentados por Bukele sugerem que El Salvador "está sobre uma mina de ouro".
Segundo ele, os 50 milhões de onças de ouro poderiam ser usados para pagar quatro vezes a dívida externa de 31 bilhões de dólares [equivalente a 85% do PIB e a 188 bilhões de reais], mas o principal desafio é "como extrair esse ouro de forma social e ambientalmente responsável".
Acevedo destacou que a experiência com o ouro "não tem sido muito agradável" em alguns países, porque as empresas de mineração pagam apenas 2 ou 3% em royalties. Por esse motivo, segundo ele, o desafio de Bukele é "negociar de outra forma" com as transnacionais de mineração.
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