O primeiro-ministro francês, Michel Barnier, fez um chamado à responsabilidade, nesta terça-feira (3), na véspera da votação pelos deputados de duas moções apresentadas pela esquerda e pela extrema direita, que ameaçam derrubar o governo.

"Acredito ser possível que exista este reflexo de responsabilidade em que, para além das diferenças políticas, das divergências, das contradições que são normais em uma democracia, digamos a nós mesmos que há um interesse superior", afirmou o chefe de governo em entrevista à TV.

"Acredito que tanto o interesse superior do país, o bem comum e o interesse nacional significam alguma coisa", acrescentou o político conservador, nomeado à frente do Executivo há apenas três meses.

Suas declarações ocorrem na véspera da votação, na Assembleia Nacional, de duas moções de censura. Exceto alguma mudança de última hora, a apresentada pela coalizão de esquerda da Nova Frente Popular (NFP) será aprovada com o apoio da extrema direita do Reagrupamento Nacional (RN).

As duas moções foram apresentadas depois que Barnier, de 73 anos, recorreu na segunda-feira a uma polêmica manobra parlamentar para aprovar parte do orçamento sem submetê-lo à votação na Câmara, onde não tem maioria.

Nos últimos dias, o primeiro-ministro multiplicou em vão as concessões ao partido de extrema direita RN, que é o grupo com mais deputados no Parlamento, para evitar que apoiasse uma possível moção da esquerda.

Mas Marine Le Pen, líder da extrema direita, informou, nesta segunda, que seus deputados vão votar a favor de todas as moções, "venham de onde vierem".

A segunda maior economia da União Europeia está mergulhada em uma crise política desde que o presidente francês, Emmanuel Macron, decidiu, em junho, antecipar as eleições legislativas previstas para 2027, após a vitória da extrema direita nas eleições do Parlamento Europeu. 

A aliança NFP, formada pela França Insubmissa (LFI, esquerda radical), socialistas, comunistas e ecologistas, venceu as eleições legislativas antecipadas entre 30 de junho e 7 de julho, mas ficou longe da maioria absoluta. 

A queda do Executivo aprofundaria a crise política e ocorreria em um momento em que o prêmio de risco da dívida da França se equipara com o da Grécia.

- "A censura (...) tornará tudo mais difícil" -

Macron, reeleito em 2022, assegurou que não pode "acreditar" que uma moção de censura vá ser votada. "O interesse do país é mais importante que o interesse dos partidos", disse em Riade, na Arábia Saudita, onde está em visita oficial.

O chefe de Estado acusou o RN, do qual depende a sobrevivência do governo, de praticar um "cinismo insustentável" por se propor a votar a moção da esquerda.

Ele também rejeitou os apelos para que renuncie antes do fim de seu mandato, em 2027, e os chamou de "ficção política". 

"A razão pela qual estou diante vocês é que fui eleito duas vezes pelo povo francês. Sinto-me muito orgulhoso disso e vou honrar essa confiança com toda a energia que me corresponde até o último segundo para ser útil ao país", ressaltou.

O debate sobre a moção vai começar às 16h locais (12h de Brasília) e o primeiro resultado é aguardado para as 20h locais (16h de Brasília). Para que uma das iniciativas seja aprovada, são necessários os votos de pelo menos 288 dos 577 deputados da Câmara baixa.

Barnier alertou os deputados, nesta terça, que "a censura (...) tornará tudo mais difícil e mais grave".

"A situação é difícil no âmbito orçamentário" e "muito difícil no âmbito econômico e social", lembrou o ex-comissário europeu e ex-negociador do Brexit.

O déficit público da França corre o risco de se agravar até alcançar 6,1% do PIB, e não se espera que volte a cumprir a norma europeia de 3% até 2029.

Se o governo cair, esta será a primeira moção de censura a prosperar desde a derrota do Executivo de Georges Pompidou, em 1962, quando Charles de Gaulle era o presidente. 

O governo de Barnier seria também o mais curto da V República francesa, iniciada em 1958.

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