É seguro voar de avião durante mau tempo?
Voar com mau tempo pode ser uma experiência assustadora, marcada pela turbulência, tempestades e solavancos na aterrissagem, mas o avião é considerado o meio de transporte mais seguro que existe
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Siga noVoar com mau tempo pode ser uma experiência assustadora, marcada pela turbulência, tempestades e solavancos na aterrissagem. Você provavelmente já observou vídeos de aviões de passageiros descendo e aterrissando quase de lado, como caranguejos, devido aos fortes ventos.
Eu sempre quis saber como os pilotos são treinados para lidar com o mau tempo. Até que, recentemente, consegui ter uma ideia de como é a vida na cabine de comando de um avião enfrentando fortes ventos laterais.
Felizmente, era apenas um simulador de voo.
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O avião é considerado o meio de transporte mais seguro que existe. Dados de 2024 do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos (MIT, na sigla em inglês), indicam que o risco de morte durante o voo é de um a cada 13,7 milhões de passageiros. E este índice cai cerca de 7% todos os anos, devido ao aumento das medidas de segurança.
Mas, depois dos recentes incidentes aéreos ocorridos em várias partes do mundo — incluindo no Brasil — e dos casos amplamente noticiados de fortes turbulências em voos de passageiros, algumas pessoas podem estar preocupadas no momento.
Sou ex-oficial da Força Aérea Real britânica e me considero um passageiro tranquilo, mesmo tendo enfrentado algumas situações extremas a serviço. Mas a turbulência em um jato comercial pode me deixar um pouco ansioso.
Para gravar um novo programa de TV da BBC, intitulado Flying in a Storm ("Voando em uma tempestade"), conversei com especialistas no setor de aviação e pilotei o voo de um simulador da aeronave Boeing 737 Max. Com isso, pude ter uma ideia do grau de segurança que podemos esperar nestes casos.
O pouso-caranguejo
Sentado na cadeira do piloto em um simulador de voo de última geração, eu estava a 3 mil pés (914 metros) de altitude. Olhando pelo estuário do rio Forth, eu podia ver à minha frente o aeroporto de Edimburgo, na Escócia.
Com um vento de 15,6 metros por segundo atravessando a pista de aterrissagem, recebi do capitão Nick Heard, treinador de pilotos da Academia Aérea Skyborne, a missão de pousar o avião — uma tarefa atribuída apenas aos pilotos mais experientes.
Manter uma linha reta e me concentrar nos auxílios visuais para ajudar a me manter no curso, ao mesmo tempo em que olhava pela janela frontal, foi uma tarefa difícil. Eu conseguia sentir o vento empurrando a aeronave para fora do curso.
O joystick era sensível a cada movimento. Enquanto eu descia, a imagem da pista preenchia a tela com muita rapidez. Ficou impossível corrigir erros para manter o curso.
O capitão Heard assumiu o controle e deu mais uma volta com o avião. Ele fez a aeronave voar mais alto e fazer um grande círculo, para tentar aterrissar novamente. Foi muito mais difícil do que eu pensava.
O CEO da academia, Lee Woodward, explicou que "a partir do início do treinamento de voo, com exposição a ventos laterais fracos, serão necessários cerca de seis anos até que você passe a ser um capitão plenamente exposto aos limites máximos de ventos laterais enfrentados por uma aeronave dos dias atuais".
Nos arredores do aeroporto de Heathrow, em Londres, Jerry Dyer, do canal Big Jet TV no YouTube, passou a transmitir ao vivo a aterrissagem dos aviões, durante a tempestade Éowyn, em janeiro.
Milhares de pessoas entraram no canal para assistir aos pilotos movendo os aviões como "caranguejos", enfrentando a tempestade e seus fortes ventos laterais.
Dyer explica que o pouso-caranguejo ocorre quando "em vez de vir reto [pela pista], a aeronave fica de frente para o vento e parece que está aterrissando de lado".
Este método de aterrissagem exige muita técnica e experiência do piloto. Ele aponta intencionalmente o nariz da aeronave em direção ao vento, precisamente no ângulo certo e com a potência necessária para fazer com que ela não se afaste da linha central da pista.
O piloto mantém a posição do "caranguejo" até o último momento, quando as rodas tocarem o solo, endireitando a aeronave para aterrissar suavemente.

A importância da previsão do tempo
Qualquer piloto poderá confirmar que um dos primeiros pontos examinados no planejamento de um voo é a previsão do tempo. Ela inclui desde as condições meteorológicas locais nos aeroportos e as condições climáticas severas ao longo do caminho até os ventos e áreas de turbulência em grandes altitudes.
As correntes de jato são corredores de ventos mais fortes, de até 400 km/h, que serpenteiam pelo planeta a uma altura de 30 mil pés (9.144 metros), exatamente onde as aeronaves costumam voar em rotas de longa distância.
Como existe um fluxo de jato sobrevoando o Atlântico, os pilotos costumam pegar carona nele dos Estados Unidos para a Europa, economizando tempo e combustível. Por isso, um voo de Nova York, nos Estados Unidos, para Londres leva uma hora a menos que no sentido contrário.
"O efeito de estilingue do fluxo de jato e sua vantagem de economizar combustível não seriam aceitáveis se a turbulência fosse muito desconfortável", segundo o capitão Heard. "Fizemos todo o treinamento, conhecemos os fluxos de jato e sabemos onde fica a turbulência à sua volta".
A turbulência e as mudanças climáticas
Existem três tipos de turbulência que podem ser encontradas em um voo.
1. Turbulência convectiva: correntes de ar para cima e para baixo e em volta de nuvens de tempestade (cúmulos-nimbos).
2. Ondas de montanha (turbulência orográfica): o ar que flui sobre uma montanha se desestabiliza e pode saltar para cima e para baixo no outro lado.
3. Turbulência de céu claro: mudanças de temperatura criam o vento cortante — diferentes direções e velocidades do vento em grande proximidade, frequentemente em volta do fluxo de jato.
As tempestades podem criar sérias turbulências, mas elas costumam ser corretamente previstas, e os pilotos conseguem "vê-las e evitá-las", voando ao redor delas para minimizar a turbulência. As previsões da aviação podem identificar as áreas mais prováveis de turbulência de céu claro, mas evitá-las é mais difícil porque, como o seu nome indica, elas não podem ser vistas.
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E, com as mudanças climáticas, os fluxos de jato onde ocorre a turbulência de céu claro estão ficando mais rápidos, gerando aumento dos casos de turbulência severa. Cientistas da Universidade de Reading, no Reino Unido, concluíram que a turbulência severa no Atlântico Norte já aumentou em 55%, entre 1979 e 2020.
Mas é preciso lembrar que os pilotos se comunicam quando encontram áreas inesperadas de turbulência e farão todo o possível para que o voo seja o mais suave possível.
Para os passageiros, a turbulência severa pode ser assustadora, mas os pilotos e a tripulação de bordo são treinados para lidar com ela e nos manter em segurança.
A treinadora de tripulação de bordo Charlotte Crocker orienta que "quando o sinal de cinto de segurança se acender e você for instruído a colocá-lo, você realmente precisa obedecer". Seja devido à expectativa de turbulência ou por outro motivo qualquer, o cinto pode impedir que você seja atirado pela cabine, evitando lesões.
"Sem querer ser dramática, usar o cinto de segurança pode salvar vidas."
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