(Com Mariana Saraiva - Correio Braziliense)
Depois de fechar 2023 com com o maior número de feminicídios da história — 34 casos, sendo 30 confirmados e quatro em investigação —, o Distrito Federal registrou o primeiro assassinato de uma mulher motivada pelo gênero de 2024.
Taynara Kellen, 26 anos, foi morta com ao menos nove tiros em frente ao salão onde trabalhava, na cidade-satélite do Gama, no Distrito Federal, na tarde dessa quarta-feira (10/1). O suspeito da autoria é o ex-marido dela, o motorista de transporte por aplicativo Wesly Denny da Silva Melo, 29, filho de um ex-policial militar e registrado como colecionador, atirador desportivo e caçador (CAC). Ele não havia sido preso.
Há pelo menos cinco anos, Taynara entrou para o ramo da beleza e se dedicou à especialidade de alongamento de cílios. Há dois, deixou de atender em casa e começou a trabalhar em um salão de beleza do Gama. Os resultados da lash designer eram sempre divulgados no perfil do Instagram, que contava com mais de 1 mil seguidores.
Em mais um dia de serviço, Taynara recebeu uma mensagem de uma suposta cliente interessada no alongamento. Pelo WhatsApp, ela marcou o horário das 14h de ontem. No entanto, era Wesly se passando por outra pessoa, revelaram as investigações. No horário agendado, Wesly enviou uma mensagem para Taynara dizendo estar perdido na região e sem conseguir encontrar o endereço do salão. "Ela saiu uma vez, não encontrou. Saiu a segunda vez e nada. Na terceira, ele fez ela dar a volta no quarteirão. Em todas essas vezes, ela saiu ao lado da filha dela", contou ao Correio Braziliense uma das clientes que estavam no estabelecimento e pediu para não ser identificada.
A mulher e também amiga pessoal de Taynara relata que ela parecia sentir que havia algo de errado. "Na quarta vez que ela saiu para procurar essa tal cliente, ela trancou o salão. Parecia sentir algo." Em questão de segundos, as funcionárias, clientes e a filha de Taynara, de 5 anos, ouviram um rojão de tiros. A cliente descreve o ocorrido como pavoroso. "Foram muitos, mais de 10, sem pausa. A única coisa que fiz foi correr com a criança (filha da vítima) para o banheiro e me trancar", desabafou.
O assassinato de Taynara foi presenciado pela filha do casal. Mesmo trancada no banheiro, a criança disse: "Tia, eu vi meu pai. Ele deu 'pou pou' na minha mãe". Taynara recebeu ao menos nove disparos de arma de fogo. De acordo com as informações preliminares, Wesly chegou no local em um carro branco.
Relacionamento
Taynara e Wesley mantiveram um casamento de mais de 10 anos, mas estavam separados havia uma semana, após os inúmeros episódios de violência sofridos pela jovem. Segundo a amiga da vítima, Taynara era vítima de agressão física constantemente. "Hoje (quarta) mesmo, eu pedi para que ela registrasse um boletim de ocorrência contra ele, mas ela disse que não valeria a pena, pois o sogro era policial militar aposentado", disse.
As funcionárias do salão também contaram que o agressor esteve no estabelecimento no sábado em busca do paradeiro de Taynara, mas a mulher não havia trabalhado no dia. "Parece difícil acreditar. Hoje (quarta) mesmo nós fomos almoçar. Estávamos tão felizes, porque ela ia fazer meus cílios para tirar fotos e divulgar o trabalho", detalhou a cliente.
Delegado à frente do caso, William Ricardo, da 14ª Delegacia de Polícia (Gama), divulgou a foto de Wesly oficialmente e pede a ajuda da população. "Ele responderá por feminicídio", confirmou. A PCDF pede para que, caso alguém tenha informações sobre o paradeiro do acusado, ligue para o número 197, da Polícia Civil.
O suspeito
Wesley Denny tem o registro de Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC) e é filho de um policial militar aposentado. Na Justiça, acumula processos por ameaça, desacato, porte ilegal de arma, vias de fato e, inclusive, de violência doméstica praticada com outras mulheres. O homem trabalha como motorista de transporte por aplicativo e era de conhecimento de pessoas próximas que ele guardava armas em casa. “Meu filho chegou a ver as armas dele e ficava fascinado. Dizia que era o ‘pou pou’, disse uma colega de Taynara.
Casos de feminicídio do DF de 2015 a 2023
183 casos no total
2015: 7
2016: 20
2017: 11
2018: 25
2019: 28
2020: 16
2021: 25
2022: 17
2023: 34*
*Quatro ocorrências ainda aguardam o termino das investigações para caracterizar feminicídio.