A prefeitura do Rio de Janeiro fez mudanças no trânsito da principal via expressa da cidade, a avenida Brasil, a fim de desestimular o uso de veículos individuais. As alterações começaram no último sábado (30).
A avenida Brasil é considerada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a maior via expressa do país, com 58 km de extensão, e tem agora em sua pista central uma faixa segregada para ônibus, táxis e veículos de serviço, como ambulâncias e viaturas policiais. Uma outra faixa é exclusiva para a circulação do BRT Transbrasil, serviço inaugurado também esta semana. Motoristas de carro, inclusive os que fazem serviço por aplicativo, e motociclistas ficaram restritos a duas faixas.
A prefeitura chegou a anunciar a restrição de horário para circulação de caminhões na via, a fim de dar ainda mais fluidez ao trânsito, mas voltou atrás após pressão das empresas do setor de logística.
O funcionamento dos corredores exclusivos é tratado pela administração municipal e por especialistas como uma saída para uma cidade mais sustentável, desestimulando o uso do carro e acelerando o tempo de viagem dos usuários do transporte público.
"A população vai ver que, com a qualidade do BRT, vai valer a pena migrar, sair do carro e pegar o BRT com conforto e segurança, ônibus novos, e chegar cedo ao trabalho", afirmou o prefeito Eduardo Paes (PSD) durante inauguração do modal, no dia 30 de março. Na primeira semana, o BRT circulou entre 10h e 15h. A operação será ampliada a partir da segunda semana.
Neste sábado (6), o prefeito postou no X (antigo Twitter) um vídeo dizendo que a prefeitura está avaliando medidas para reduzir os impactos no trânsito. "Você tem uma diminuição de faixa, isso ampliou o engarrafamento, que era algo que acontecia muito na avenida Brasil. Estamos estudando medidas, a gente deve anunciar algumas alterações."
Os primeiros dias úteis foram marcados por críticas de motoristas. Eles afirmam que o engarrafamento na cidade aumentou especialmente nos horários de pico e que o congestionamento na avenida Brasil refletiu em outras vias importantes da cidade.
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Quem utiliza ônibus paradores - linhas que fazem paradas em pontos ao longo da via e que, portanto, não acessam a faixa exclusiva - também reclama. "Pegar ônibus parador depois das 5h na avenida Brasil está infernal", escreveu uma seguidora no perfil oficial da Prefeitura.
Na manhã de segunda-feira (1°) houve um crescimento de 83% do engarrafamento às 6h, em comparação com as três semanas anteriores. Na quarta-feira (3), o engarrafamento na cidade chegou a 169 km, 186% acima da média. A prefeitura defende que o aumento de quarta foi causado por uma manifestação de caminhoneiros e não associa diretamente às mudanças na avenida Brasil.
"As faixas exclusivas poderiam incorporar o motorista de aplicativo. Mas eles não nos incluíram. Com três faixas já era ruim, imagina com duas. Na segunda-feira, levei de Rocha Miranda ao centro da cidade 2h45, um trajeto de 23 km, feito em cerca de 40 minutos em dias sem engarrafamento. Tive vontade de largar o carro no meio da pista", afirma o motorista de aplicativo Sebastian de Jesus, 61, presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo do Estado do Rio de Janeiro.
O corretor de seguros Tiago Azeredo, 34, morador de Irajá, na zona norte do Rio, também perdeu horas no congestionamento na última semana. Ele usa a via expressa para levar a filha na escola.
"Durante as obras, mesmo com três faixas era possível visualizar pontos de lentidão e engarrafamento. A população cresce a cada dia e as faixas não suportam a demanda", diz.
O BRT Transbrasil, iniciado no segundo mandato de Paes (2012 a 2016), era previsto para ser entregue antes da Olimpíada do Rio, em 2016, mas a obra foi finalizada com sete anos de atraso. A entrega do corredor é considerada pela terceira gestão de Paes uma vitória, e a lentidão é atribuída, em grande parte, ao governo anterior do ex-prefeito Marcelo Crivella, à frente da prefeitura entre 2017 e 2020.
O modal tem previsão de transporte até 250 mil pessoas por dia. O BRT Transbrasil tem 26 km de extensão, 17 estações e atravessa 18 bairros, ligando Deodoro, na zona oeste, ao terminal intermodal Gentileza, recém-inaugurado no centro, ao lado da rodoviária do Rio. Uma das linhas de BRT liga o centro ao aeroporto do Galeão.
Clarisse Cunha Linke, diretora-executiva do ITDP (Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento), avalia positivamente as mudanças implementadas pela prefeitura a fim de desestimular o uso do carro.
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"Esse redesenho da avenida Brasil é um caminho fundamental. Isso passa por redistribuir o espaço que há décadas vem sendo usado prioritariamente pelos automóveis particulares", afirma Linke.
"O carro é uma ferramenta de trabalho para muita gente, mas é uma ferramenta de trabalho porque o transporte público é precarizado, ruim e caro. Se tivermos um sistema em que as pessoas têm confiança, não fiquem no congestionamento, a tendência é que elas migrem para o transporte público. Um sistema de qualidade diminui a quantidade de carro na rua."